A apuração de um dos crimes mais bárbaros já registrados pela polícia catarinense, marcado pela frieza dos acusados e incapacidade de defesa das vítimas, teve desfecho na Justiça por meio de uma das sentenças mais rigorosas de que se tem notícia em SC: denunciados pelo assassinato de quatro pessoas em Otacílio Costa, Luiz Carlos da Silva e Ademir de Liz foram condenados a penas que, somadas, totalizam 550 anos de prisão.

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O crime ocorreu no último mês de janeiro, na comunidade de Fundo do Campo, e repercutiu em todo o Estado. A aposentada Laurita Muniz da Costa, 63 anos, e o companheiro dela, Sebastião Pereira, 57, foram mortos a facadas, dentro de casa. Estuarte Schneider, 51 anos, sobrinho de Laurita, e a filha dele, Evelin, de apenas 8 anos, foram mortos em sequência, também a facadas.

Pai e filha foram atacados quando surpreenderam os acusados na casa dos idosos. Somente Selma Schneider, 44, mulher de Estuarte, conseguiu escapar. Ela correu em busca de socorro e não teve condições de salvar a filha. A sentença, assinada pela juíza Monica Mendes na última semana, aponta os crimes de latrocínio (matar para roubar) mediante traição, por motivo fútil, de forma a assegurar a impunidade e com uso de tortura.

Ao longo de 79 páginas, a magistrada aponta que Ademir e Luiz Carlos se aproveitaram da confiança das vítimas. Isto porque Ademir era sobrinho da aposentada Laurita, enquanto Luiz Carlos era cunhado de Ademir. Conforme a denúncia do Ministério Público, ambos agiram porque buscavam o dinheiro da suposta venda da criação de gado mantida pelo casal. A investigação revelou que os idosos tinham planos de vender o gado porque pretendiam trocar de carro, estavam cansados do trabalho no campo e Laurita, inclusive, já encontrava dificuldades para subir escadas.

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Os dois acusados, segundo o MP, acreditavam que o dinheiro estivesse na residência do casal, o que ainda não havia ocorrido.

Laurita, aponta a sentença, chegou a ser “submetida durante grande período de tempo à verdadeira tortura e crueldade” para contar onde estava a suposta quantia. A menina Evelyn, reforça a sentença, foi puxada das mãos da mãe pelos agressores. Detalhes da ação, com base no relato da única sobrevivente da chacina e de laudos periciais, são descritos como forma de fundamentar as penas.

Ademir recebeu condenação de 268 anos, dez meses e 20 dias de prisão, enquanto Luiz Carlos teve pena de 281 anos, um mês e dez dias. Eles continuam presos e não poderão apelar em liberdade.

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“Índoles distorcidas”, aponta sentença

Ao negar que os réus tenham o direito de recorrer em liberdade, a juíza Monica Mendes aponta que ambos “possuem índoles distorcidas e distantes de qualquer princípio societário”. No documento, Ademir é descrito como dono de “personalidade distorcida, pessoa fria, interesseira, gananciosa”.

As referências a Luiz Carlos são ainda mais severas. “Sua serenidade aparente, no afã de se esquivar da incomensurável responsabilidade, causa espanto”, anotou a magistrada. A juíza aponta o réu como “pessoa fria, sem emoções, sociopata, gananciosa”.

Na sentença, é observado que durante depoimento Luiz Carlos coçava o nariz, gaguejava, coçava os olhos e repetia gestos que revelavam dúvida e confusão.

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“Além dos crimes terem sido repugnantes e cruéis, Ademir e Luiz Carlos, soltos, certamente voltarão a delinquir”, apontou a juíza.

Acusados negam envolvimento

Tanto na fase de investigação quanto em audiência judicial, Ademir de Liz reconhece que esteve no local do crime com Luiz Carlos, mas afirma que somente o cunhado cometeu os assassinatos, por motivos que alega desconhecer. Luiz Carlos também alega inocência e afirma que sequer esteve na casa dos idosos.

Em audiência, disse ter fugido na época porque sabia que haviam atribuído os assassinatos a ele. Além de trabalhar pela absolvição, os advogados de defesa de ambos tentaram desclassificar os crimes de latrocínio para homicídio (o que implicaria na realização de um júri e poderia acarretar em penas menores), o que foi rejeitado pela juíza.

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Vítimas e acusados

Conheça abaixo o perfil das vítimas e dos dois condenados por terem cometido a chacina:

Laurita Muniz da Costa, 63 anos

Moradora de Otacílio Costa desde que nasceu, era conhecida por ser uma pessoa boa com os vizinhos e familiares. Mãe de três filhos, estava no segundo casamento, com Sebastião, depois que o primeiro marido adoeceu e morreu. Ela tinha dificuldades de locomoção e vivia com dois salários mínimos da aposentadoria. Era tia de Estuarte por ser irmã da mãe dele. Tinha muitos cuidados de segurança e gostava de se prevenir. Ia sempre que podia à igreja da Assembleia de Deus do Fundo do Campo.

(Foto: Diorgenes Pandini / Agencia RBS)

Sebastião Pereira, 57 anos

Sebastião também era viúvo mas não tinha filhos. Da criação de gado, tirava o seu sustento do leite que vendia para uma cooperativa local. Tinha um parati vermelha e sempre seguia o ritual de fechar o carro e tirar a chave do veículo.

(Foto: Diorgenes Pandini / Agencia RBS)

Estuarte Schneider, 51 anos

Agente de saúde de Otacílio Costa, trabalhava no posto de saúde do Fundo do Campo. Em uma moto fazia atendimentos na comunidade e era bastante conhecido por isso. Era sobrinho de Laurita.

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(Foto: Diorgenes Pandini / Agencia RBS)

Selma Schneider, 44 anos

Esposa de Estuarte, era dona de casa e mãe de Évelin. Momentos antes do crime, estava dentro do carro tomando remédio para a pressão.

Évelin Schneider, 8 anos

A garota de oito anos era filha de Estuarte e Selma. Estudava na escola do Fundo do Campo.

Ademir de Liz, 35 anos

Sobrinho de Laurita, por ser filho do irmão do ex-marido da aposentada, morava em São Paulo até dias antes do crime. Foi preso poucas horas depois do crime, perto da casa onde mora quando voltava da missa, como contam familiares de Laurita.

Luiz Carlos da Silva, 48 anos

Também morador de Otacílio Costa, era conhecido da família de Laurita e dono de um lavação da cidade. Foi preso pela polícia dias após a chacina.

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Luiz Carlos da Silva, à esquerda, e Ademir de Liz
Luiz Carlos da Silva, à esquerda, e Ademir de Liz (Foto: Polícia Civil / Divulgação)