O vôlei catarinense atualmente tem capital estabelecida no Alto Vale do Itajaí. Fica em Rio do Sul, uma cidade apaixonada pelo time que ergue o ânimo do torcedor local e de um esporte órfão de grandes conquistas no Estado.
Desde o tetracampeonato da Cimed, na Superliga Masculina, em 2010 — dois anos antes de a equipe de Florianópolis fechar as portas —, não se tinha tanta empolgação em torno de um representante local. Tudo porque as meninas treinadas pelo experiente técnico Spencer Lee são a sensação da edição feminina da competição nacional.
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Após quatro participações na Superliga Feminina em que se apresentou ao Brasil como uma carismática coadjuvante, Rio do Sul/Equibrasil atingiu a maturidade na temporada 2015/2016 para mostrar uma faceta mais casca grossa. E mostrar que, sim, Santa Catarina continua forte no vôlei. Apesar de ter apenas o 10º maior investimento entre 12 equipes, fechou o primeiro turno na quinta colocação — as oito melhores colocadas após os dois turnos avançam aos play-offs.
A equipe catarinense ainda venceu adversárias tradicionais, como Minas e Sesi, e tem 100% de aproveitamento em casa, no ginásio municipal Artenir Werner. Para muitos, a sensação do ano: um time que saiu da nona colocação da edição anterior, fora da zona de classificação, para brilhar. Mas quem é da casa sabe que não há surpresa. Tudo é fruto de trabalho e planejamento.
— Este time agora é mais agressivo no ataque. Acho que é muito trabalho diário também para a gente estar evoluindo na Superliga. Quando ganhamos os primeiros jogos em casa, a torcida acompanhou muito a gente, o que é muito bom. Dá uma motivação extra. O ginásio está sempre está lotado. Há um carinho pela gente — conta a central argentina Mimi Sosa, 28 anos, em sua segunda temporada em Rio do Sul.
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Torcida. Aí está mais um ponto fundamental para entender a força catarinense.
— Nos momentos em que estivemos mal, o torcedor foi solidário, jogou de mãos dadas com a nossa equipe. Em muitos momentos em que não estávamos bem, eles nos ergueram durante a partida. Nossos joelhos dobraram, e eles nos deram a mão para ficarmos em pé novamente e lutarmos pela vitória. É uma relação que transcende a questão de torcida, apenas. É uma relação de amizade, carinho, acolhimento _ define, emocionado, o técnico mineiro Spencer Lee, 46 anos, pela segunda temporada à frente do projeto.
Para Spencer, que tem no currículo trabalhos de destaque nacional no Praia Clube, de Uberlândia (MG), o importante é que neste momento o envolvimento em torno do projeto tem tido mais efeito do que o aporte financeiro. Mas avisa: é preciso investir mais para manter um representante catarinense forte na elite do vôlei brasileiro.
Na avaliação do técnico, o desempenho atual está acima do planejado. Por isso, pede cautela para a empolgação em torno da cidade do Alto Vale:
— Todo este envolvimento tornou Rio do Sul não coadjuvante da Superliga, mas protagonista. Parte da imprensa tem chamado nossa equipe de sensação deste ano. Espero que quando encaixarmos no nosso nível de competição, a grande sensação não se torne uma decepção. Não gostaria que as pessoas esperassem da nossa equipe a quarta ou quinta colocação. Se ao final da fase classificatória não estivermos entre os cinco, mas entre os oito primeiros e participarmos do playoff, que é nosso objetivo, espero que entendam que não caímos de rendimento.
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O segredo de como fazer mais com menos

O investimento na equipe feminina de Rio do Sul para a Superliga 2015/2016 é de cerca de R$ 1,5 milhão, entre iniciativa privada e poder público. Enquanto isso, adversários tradicionais como Nestlé e Rexona têm cerca de R$ 12 milhões à disposição. O jeito é improvisar e planejar bem para encurtar esta diferença.
Sem aporte financeiro polpudo, o melhor é ter cautela e pensar bem cada contratação. Por isso, há uma mescla na equipe catarinense. Algumas atletas de destaque de anos anteriores, como a argentina Mimi Sosa, foram mantidas. Outras foram trazidas, como as pontas Juliana Paz e Ju Nogueira.
— Seguramos seis jogadoras da Superliga anterior. Para dar corpo ao time e e ter mais competitividade, trouxemos jogadoras que estavam em queda no mercado, mas que viram aqui uma ponte para retornar ao cenário nacional. Elas acreditaram no projeto. A gente tem um trabalho humilde em que preza muito a coletividade em vez do individualismo. A estrela é o grupo _ define o técnico Spencer Lee.
Das 16 jogadoras do elenco principal, seis ainda são de Santa Catarina. Além de Rio do Sul, outras cidades do Vale do Itajaí, como Luís Alves, Pomerode e Brusque, estão representadas. Cada uma traz o orgulho de jogar pelo próprio Estado.
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— É legal poeque saí daqui nova. Joguei toda minha base aqui em Rio do Sul. Depois fui jogar em São Paulo, fiquei um tempo lá. E poder representar o Estado é o sonho de qualquer pessoa. Acho que poderiam ter mais times aqui, com mais investimento. E a gente está no único time do Sul do Brasil na Superliga Feminina. Fico superfeliz por estar perto de casa _ comenta a ponta Fernanda Kuchenbecker, 23 anos, natural Brusque.
O resultado do planejamento já deu certo em nível estadual. O time do Alto Vale é hexacampeão estadual e dos Jogos Abertos de Santa Catarina (Jasc). Agora é a hora de brilhar em nível nacional.
— A gente espera que haja continuidade. Esta é a quinta temporada de Rio do Sul na Superliga. Vivemos um momento de crise econômica. Isso reflete em nossos patrocinadores e na prefeitura, que ajuda o time. Antes tínhamos representatividade maior em SC no masculino, sobretudo pela Cimed. Mas nunca tivemos representatividade tão grande no feminino. Então, é importante usarmos tudo isso para motivar a continuidade do trabalho _ avalia Spencer Lee.
Torcida que vibra junto e emociona
Há uma forte ligação entre time e torcida em Rio do Sul. Mais do que manter a equipe local cada vez mais forte para assegurar os 100% de aproveitamento no ginásio Artenir Werner, o apoios empolga e emociona as atletas.
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— Lembro no ano passado, quando a gente jogou contra o Rexona aqui, o torcedor na arquibancada gritou “eu acredito” até o final do set. Não se escutava ninguém de tanto que gritavam. E isso me arrepia até agora por lembrar — conta a ponta argentina Mimi Sosa, um dos nomes mais celebrados pelo público local pela raça e entrega em quadra.
A sensação vivida pela argentina é proporcionada por rio-sulenses como Eliel Santos da Silva Junior, 20 anos. Apaixonado pelo vôlei, ele costumava acompanhar a seleção e jogar na escola. Atualmente, se divide entre três atividades: cursar Ciências Contábeis, trabalhar em uma óptica da cidade e torcer nos jogos da Superliga. Inclusive, mora em frente ao ginásio.
— Dá um orgulho muito grande, porque a gente viu o time crescer. A gente viu muita derrota, ia ao ginásio empolgado e acontecia de perder. Então, o time começou muito bem na Superliga deste ano. Ficamos surpresos. As meninas mostraram que não vieram só para disputar a competição. Vieram para ganhar mesmo — comemora o torcedor.
A proximidade de Eliel com o vôlei é tanta que ele ganhou uma bola de presente de aniversário, há duas semanas. O que ocorreu depois foi ainda mais especial.
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— Topei um desafio de pegar a bola e levar para as atletas assinarem. Pedi que uma atleta amiga minha fizesse o favor. Deixei a bola no ginásio e no final do treino fui buscar. Estava autografada por todo mundo, até pelo Spencer (técnico). Foi bem legal — conta, empolgado.
Acompanhado por amigos, ele diz que só perdeu um jogo desta edição. E espera que tenha sido a única vez. Daqui para a frente, quer o mesmo do que muitos dos seus conterrâneos: mais vitórias e orgulho para Rio do Sul.