O diario.com.br adianta o editorial que os jornais do Grupo RBS publicarão no próximo domingo para que os leitores possam manifestar concordância ou discordância em relação aos argumentos apresentados.

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O DISCURSO DA INTOLERÂNCIA

Conhecido mais pelo rechaço a avanços elementares na área de direitos humanos, pela defesa das ditaduras e por uma indisfarçada homofobia do que pelos resultados de sua atuação parlamentar, o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) está diante da maior reação popular e de seus próprios pares na Câmara já provocada por uma de suas declarações. Ao ser questionado em recente programa de televisão pela atriz, cantora e apresentadora Preta Gil sobre como reagiria se seu filho se apaixonasse por uma negra, o deputado fez um comentário chocante, que desencadeou manifestações imediatas de pessoas ofendidas e até uma ação por quebra de decoro parlamentar que, em tese, poderia inclusive custar-lhe o mandato. No seu já conhecido estilo agressivo, o militar voltou a usar sua condição de parlamentar para difundir preconceitos e para reafirmar o desprezo pelos direitos humanos. Vivemos numa democracia, a Constituição brasileira garante a qualquer pessoa dizer o que quiser. Ninguém pode impedir o senhor Bolsonaro de falar. Só não é justo que, protegido pelo instituto da imunidade, não responda por seus atos como os demais brasileiros.

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A resposta destemperada do parlamentar acabou sendo multiplicada pela mídia e pelas redes sociais, tornando-se de imediato um dos temas campeões de comentários: “Preta, não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco e meus filhos foram muito bem educados. E não viveram em ambiente como lamentavelmente é o teu”. Diante da reação de colegas, que se apressaram em encaminhar o caso à corregedoria e ao Conselho de Ética da Casa, que insistem em levá-lo à Comissão de Constituição e Justiça e pretendem até mesmo pedir sua destituição da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, o acusado recorreu ao sarcasmo que o manteve impune reiteradas vezes: “Com que moral vão me cassar aqui?”. Mas, para o grande público, alega ter entendido que a pergunta se referia a gays, não a negros. Tenta, ainda que escorado em outro evidente preconceito, livrar-se de uma provável acusação de racismo, que é crime tipificado em lei.

Independentemente das versões e das tentativas, de um lado, de atenuar a gravidade das declarações e, de outro, de transformá-las em bandeira na luta por diferentes causas na área de direitos humanos, o fato é que o caso apenas chama a atenção para a banalização desse tipo de ocorrência. O deputado, que vem se reelegendo sucessivas vezes, representa uma parcela importante da sociedade, sempre disposta a boicotar qualquer avanço na área de direitos humanos. Ainda assim, são inaceitáveis agressões explícitas a minorias, mesmo quando envolvem questões ainda não tipificadas legalmente como crimes.

A mesma Constituição que assegura a livre manifestação define a prática de racismo como crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão. E a imunidade parlamentar não pode servir para acobertar esse tipo de abuso. Tão importante quanto punir, porém, como adverte o ex-deputado federal Fernando Gabeira, é apostar em ações de conscientização permanente, que ajudem pessoas como Jair Bolsonaro e outras com visão de mundo semelhante a encarar os seres humanos, não importa quais, sem prejulgamentos, sem preconceitos e sem radicalismos.