O rompante que Rodrigo Vaz de Lima, 30 anos, teve para arrombar a porta do apartamento de uma desconhecida se transformou em cautela assim que ele avistou as primeiras manchas de sangue. À medida que entrava na casa, os respingos se transformavam em manchas e em poças cada vez maiores. Deitada no banheiro, uma jovem de 23 anos pedia ajuda e dizia que ia morrer.

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Foi com pesar na manhã de segunda-feira que o comerciante lembrou como salvou Rafaela Elis Schulz, esfaqueada pelo ex-namorado dentro do próprio apartamento na noite de domingo em Balneário Camboriú. Três colegas de trabalho o acompanharam na tarefa, assim que uma mulher correu até eles desesperada pedindo por ajuda.

Era perto das 21h e o box onde Rodrigo trabalha no camelódromo da Rua 1.500, no Centro, ainda estava aberto. Foi quando uma mulher apareceu pedindo socorro. Rodrigo e mais três funcionários do box foram até o apartamento. Outros trabalhadores ficaram do lado de fora do prédio. Como a porta estava trancada, Rodrigo a arrombou.

Ele foi caminhando com cautela para onde o rastro de sangue o levava. Chegou ao quarto da jovem e viu Douglas Waltrick, 34 anos, deitado na cama inconsciente. A porta do banheiro da suíte estava aberta e lá Rafaela se encolhia de dor. Esfaqueada 40 vezes, a jovem estava lúcida quando Rodrigo, os outros três rapazes e a mulher que chamou ajuda entraram na área.

– Ela estava com um ferimento saindo muito sangue. Só ajeitei ela numa posição que saísse menos sangue e esperamos o Samu chegar. Ela dizia que estava morrendo e pedia ajuda – conta.

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Minutos depois a Polícia Militar chegou ao apartamento na Rua 1.400. Chegaram também os socorristas que levaram Rafaela às pressas para o hospital, assim como Douglas.

– Quando entrei achei que ele estivesse morto – diz Rodrigo.

Ao contrário do que pensava o salvador de Rafaela, o suspeito de ter esfaqueado a jovem e ter tentado se matar em seguida ainda respirava. Douglas Waltrick chegou a cortar os pulsos, mas sobreviveu. No Hospital Ruth Cardoso, Rafaela passou por cirurgia e permanecia bem até segunda-feira, segundo um parente que não quis se identificar.

Douglas foi para a mesma unidade de saúde e permanecia sob escolta, pois recebeu voz de prisão em flagrante por tentativa de homicídio qualificado. Mesmo sem um desfecho trágico, na manhã de segunda-feira, perto do prédio onde a jovem advogada morava sozinha, não se falava em outra coisa. A brutalidade com que Douglas golpeou Rafaela pelo menos 40 vezes com um canivete chocou comerciantes e vizinhos.

Casal estava separado há dias

O delegado Alan Coelho, responsável pelo inquérito, explica que o casal tinha rompido o namoro há poucos dias. Inconformado, Douglas teria invadido o apartamento da jovem e tentado matá-la para depois se matar. Quando a polícia chegou encontrou no local um forte cheiro de gás, o que indica que o suspeito possa ter tentado asfixiar os dois.

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Além disso, as marcas de sangue indicam que a jovem tentou se desvencilhar do ex-namorado. A polícia ainda não sabe como ele entrou no local, mas acredita que ele tivesse a chave. Segundo um parente da advogada, ele estava na residência esperando por Rafaela. Não há informações se o casal discutiu.

Nenhum vizinho ouviu barulho, segundo a polícia. Rafaela só foi salva porque conseguiu atender o próprio celular enquanto estava ferida e pediu ajuda a familiares. Com família em Apiúna, no Alto Vale do Itajaí, Rafaela morava sozinha no apartamento.

O relacionamento com Douglas teria durado alguns anos de acordo com um familiar. O delegado deve tentar ouvir o casal a partir desta terça-feira. Assim que tiver condições de deixar o hospital, Douglas será encaminhado ao presídio.

Crime passional é mais difícil de prevenir

O delegado Alan Coelho afirma que alguns crimes passionais são mais difíceis de prever. O caso da advogada Rafaela, por exemplo, foi completamente inusitado. O ex-namorado da vítima não tinha ficha criminal, tampouco histórico de violência.

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Psicóloga e professora da Univali, Sueli Bobato diz que essa previsibilidade é possível quando se conhece o padrão comportamental da pessoa envolvida. Os especialistas têm estudos nesse sentido, mas para um leigo isso realmente é mais complicado.

– Nossa personalidade é composta por um conjunto de complexos. Em casos como esse, a pessoa acabou dominada por um desses complexos. Ela perde a razão e não consegue racionalizar – analisa.

Sueli explica que os crimes passionais estão muito relacionados a complexos no âmbito da sexualidade. O outro acaba se tornando um objeto e a perda desse objeto é o que ocasiona as situações de violência. Mesmo assim, segundo a psicóloga, esses casos são tratáveis com terapia. Especialmente com a psicoterapia analítica, que tem uma abordagem mais profunda no mapeamento dos complexos.