Dona Belinha e o marido Joaquim, o Quinzinho, todos os verões reforçam a renda familiar alugando a casa para turistas, lá na Barra da Lagoa. Começaram oferecendo um quartinho para mochileiros, quando a filha única casou e saiu de casa. Tiraram a cama de solteiro, o rosa das paredes e as fotos dos galãs da televisão coladas no armário e colocaram dois beliches. Fez sucesso em pouco tempo. Cobravam barato e o serviço era bom. Café farto e um atendimento simpático que cativava os hóspedes.

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Com o dinheiro ganho num verão, Belinha e Quinzinho ampliavam o espaço para a temporada seguinte. Construíram mais um quartinho, depois outro banheiro, uma cozinha maior… Cada ano, uma novidade. A pensão familiar tornou-se em pouco tempo uma pousadinha conhecida, com público fiel. A conta no banco também engordou. Foi-se o tempo em que a família sobrevivia apenas da pesca de Quinzinho e das costuras de dona Belinha.

Até que, um pouco antes de começar um verão, a dona da casa, durante o jantar, comentou:

– Ah, Quinzinho, já estou cansada de ficar aqui todas as temporadas, cuidando dos hóspedes, fazendo comida, lavando pratos e arrumando camas. Eu também mereço férias. Você ainda se distrai, levando os turistas para passear de barco, mas eu… De que adianta ganhar um pouco mais se a vida está passando e a gente nem aproveita o dinheiro que ganha?

Quinzinho ficou quieto. Mas naquela noite não conseguiu dormir. Sabia que a mulher tinha razão. Estavam ficando velhos e, se não aproveitassem um pouco a vida agora, poderia ser tarde depois. Em alguns dias os hóspedes começaram a chegar. Dona Belinha atendia a todos com um sorriso largo, de dentes branquinhos que contrastavam com o rosto moreno, queimado de sol.

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O verão seguiu sem sobressaltos e rendeu um bom dinheiro ao casal. Em março, quando a cidade e a Barra da Lagoa voltaram à calmaria e eles encerraram o trabalho na pousada, Quinzinho levou Belinha para jantar fora, num restaurante famoso da Avenida Beira-Mar Norte, no Centro de Floripa. Ela nunca havia estado em um lugar tão chique. Ficou até um pouco sem jeito no início.

– Mas por que você me trouxe aqui, bem?

Quinzinho fez suspense e entregou a ela um envelope.

– Ai meu Deus, não gosto disso. Fico nervosa.

Custou a acreditar: eram duas passagens para um cruzeiro, naqueles navios imensos que ela via nas revistas e na televisão, e que sonhava em um dia viajar.

– Homem do céu, você deve estar ficando louco. Isso custa uma fortuna!

– Você merece, meu amor. É o meu reconhecimento pelo teu trabalho na pousada, nestes anos todos, sem tirar uma folga sequer.

Uma semana depois, eles partiram. Conheceram Montevidéu, Punta del Leste, Buenos Aires e, óbvio, voltaram encantados.

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De volta à rotina, prepararam a pousada para este verão. A casa está cheia, como sempre. Quinzinho, Belinha e mais uma ajudante se esmeram para atender a todos. Mas depois que tudo está tranquilo, Belinha e Quinzinho se acomodam nas cadeiras da varanda, olham para o mar e ficam planejando qual será o destino da próxima viagem, quando março chegar. Não querem mais deixar nada para depois.