Foi uma quando Marilda e Tião aceitaram ficar com os netos Pedro, de seis anos, e Helô, de cinco, para que a filha e o genro pudessem curtir o feriadão de Carnaval, nem de longe imaginaram o sufoco que seria. Os dois, já na faixa dos 60 e poucos anos, têm boa saúde, mas são de um tempo em que as crianças eram mais calmas, obedientes e menos inquisidoras. Eles não estavam preparados para as crianças do século 21…
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Sexta- feira de tarde, Marininha chegou à casa dos pais com duas mochilas e um saco cheio de brinquedos e disse:
– Pai e mãe, divirtam- se! Eles são seus. A gente volta na quarta de manhã para buscá- los.
Beijo nas crianças, algumas recomendações para o caso de precisarem ligar para o pediatra e pronto. A filha e o marido sumiram. Não tinham tempo a perder. Queriam curtir o primeiro feriadão a sós desde o nascimento das crianças. Eles mal desapareceram na estrada e o pequeno Pedro já pediu:
– Vô, arruma o videogame pra mim? Sabe jogar o Super Fifa? Sabia que eu ganhei um jogo novo do Wii da Lego, que é do Star Wars? É muito legal. Joga comigo?
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O avô, meio atordoado, disse:
– Eu pensei que a gente pudesse ver desenho na TV. Não é legal?
O guri fez cara de desapontado, e lá foi o avô pedir ajuda a um vizinho que sabia como instalar o videogame.
A avó convidou a pequena Helô para fazer um bolo. A menina vibrou:
– Já sei, vó!
Vamos comemorar o aniversário da Draculaura.
– De quem?
– Da Draculaura, não conhece?
Não, Marilda não tinha nem ideia de quem era essa. Aí, Helô explicou didaticamente:
– Vó, a Draculaura é a filha do Drácula. Ela faz parte da família Monster High. Cada monstro tem uma filha, e elas são todas lindas.
Filha de monstro? Eles não têm mais o que inventar, pensou a avó. Mas ficou quieta. Depois de entendido o assunto, as duas foram fazer cupcakes para a festa das monstrinhas.
– Tem que ter merengue vermelho vó, que é pra parecer sangue!
A avó preferiu nem comentar.
À noite, começou o Carnaval na TV. O guri chamou o avô, gritando:
– Vô, vem aquiiiiiiiiii. Olha issoooooooooo!
A cena era hilária. O menino estava parado vendo uma mulher rebolar, sem roupa, só de tapa- sexo e com o corpo pintado de tinta dourada.
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– Ela tá peladona, vô!!!
Pobre do Tião, ficou desconcertado. Teve a ideia de dizer que a moça estava fantasiada. Sim, era só uma fantasia de Eva. O guri, que de bobo não tinha nada, comentou:
– Eu sei o que é aquilo. É silicone. Ouvi a mãe dizer que tá juntando dinheiro pra comprar uns assim também ( e colocou as mãos dobradas em concha no peito, para mostrar que falava dos seios da moça).
Acabou o Carnaval. O avô desligou a televisão e não se falou mais no assunto. Foram jogar videogame. Pelo menos ali o guri ficava quieto.
Avó e neta estavam deitadas. Helô adorava histórias de fadas. Na hora do “viveram felizes para sempre”, surgiu a figura do príncipe e da princesa se beijando. A menininha olhou bem para a imagem, depois para a avó e perguntou:
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– Será que foi beijo de língua, vó?
Marilda queria enfiar- se debaixo do lençol. De onde Helô tirou essa pergunta, meu Deus? Tentou parecer tranquila e respondeu:
– Não, foi só uma bitoquinha. Deu um beijinho de boa noite na neta e saiu do quarto.
Isso foi só o primeiro dia. Marilda chamou o Tião para dormir e colocou o neto na cama. Afinal, todos precisavam descansar e se preparar para sábado, domingo, segunda terça. Definitivamente, este Carnaval entrou para a história da família.