Estar de luto exige dispêndio de energia, tempo, reconhecimento e rede social de apoio. Energia para lidar com a ausência de um vínculo significativo – por meio do resgaste de lembranças felizes e/ou dolorosas – e com o constante replanejamento do presente e do futuro, pois quem está de luto sabe, o mundo passa igualzinho, mas alguma coisa mudou no seu mundo particular.

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Tempo para se chegar a um acordo entre a vida que se tinha antes da perda e a vida que está sendo construída. Tempo para perceber que o ritmo da vida se impõe paulatinamente. Reconhecimento do que foi perdido, de modo que se possa falar da perda na primeira pessoa do singular, dimensionando o sofrimento vivido na singularidade da experiência individual. Isso significa saber que cada perda dói de modo diferente, pois é única.

Rede social de apoio para compartilhar vivências e respostas em torno das perguntas: por que eu? Por que desta forma? E assim encontrar o sentido da perda e da própria vida. Porém, estar de luto na contemporaneidade virou sinônimo de fracasso, culpa e vergonha, pois desmascara os mitos que dão sentido à vida cotidiana: o da imortalidade, o da felicidade plena e constante e o da juventude eterna. Logo, a energia, o tempo, o reconhecimento e a rede social de apoio tornaram-se produtos escassos para as pessoas em luto e, ademais, não se deve reivindicá-los, pois revelariam o quanto todos estão despreparados para lidar com a morte e as perdas.

Familiares e amigos retiram precocemente o apoio social a quem está de luto. Banaliza-se a perda vivida ao se preconizar a ideia de que um luto deve ser resolvido e superado; ou melhor, curado, seja por meio de medicamentos ou pela fé, como se o que se perdeu pudesse ser negociado no contexto de um tratamento específico. Eis as questões: na contemporaneidade as pessoas conseguem viver seus lutos? Ou estar de luto se tornou ameaçador? Afinal, todos querem ser imortais, felizes e jovens.

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