Várias centenas de vítimas da epidemia de cólera no Haiti fizeram uma manifestação nesta quinta-feira em Porto Príncipe para pedir justiça às Nações Unidas, pelo caso dos soldados nepaleses acusados de terem levado a bactéria ao país há cinco anos.

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Os manifestantes, reunidos na base principal da Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti (Minustah), demonstraram sua indignação diante do silêncio da ONU sobre a responsabilidade no surgimento da epidemia.

“Se as Nações Unidas nos tratasse como seres humanos, já teriam nos pedido perdão”, afirmou Jean Emmanuel Larose, funcionário da área de saúde da cidade de Mirebalais, onde operavam na época os batalhões nepaleses.

Em outubro de 2010, Jean Emmanuel Larose viveu a eclosão dos casos de cólera. “Estávamos pouco informados sobre a doença, e por isso muitos morreram. Descobrimos que foi a Minustah que nos contaminou. Os capacetes azuis nepaleses despejaram seu esgoto infectado no rio quando sabiam que era a água que nós usamos diariamente”, contou.

Em comunicado publicado na última terça-feira, a Anistia Internacional lembra que “vários estudos científicos mostraram que funcionários da ONU provenientes do Nepal foram os vetores da doença no Haiti”.

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Mais de 8.850 haitianos, em sua maioria as famílias mais pobres, morreram em decorrência do cólera desde o início da epidemia. Segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA), mais de 746.000 pessoas ficaram contaminadas desde outubro de 2010.

“Trata-se de uma violação aos direitos humanos”, afirmou Rachèle Fondchaine, militante feminista. “Muitos pais de família morreram e seus filhos agora estão a cargo de seus tios e tias. Estes casos devem ser assumidos e as famílias indenizadas, já que não somente houve mortes, mas famílias inteiras foram jogadas na miséria”.

A ONU reafirma periodicamente seu empenho em erradicar a cólera no Haiti, financiando por exemplo programas de saneamento em zonas rurais, mas sempre negou sua responsabilidade na introdução da doença no país, que então encontrava-se em estado de extrema fragilidade após ter sido afetado em janeiro do mesmo ano por um terremoto que causou a morte de mais de 200.000 pessoas.

“A ONU não deveria lavar suas mãos pelo sofrimento e dor que causou”, declarou Erika Guevara Rosas, diretora do programa Américas da Anistia Internacional.

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“Implementar programas de saúde e saneamento é importante, mas não é suficiente”, afirmou.

A justiça norte-americana não levou adiante as múltiplas acusações feitas pelas famílias das vítimas nos tribunais de Nova York, onde a sede da ONU está localizada, considerando que a Carta das Nações Unidas concede imunidade aos funcionários da organização.

* AFP