Flaviano Miranda, 36 anos, queria levar o filho Daniel, 10 anos, e o enteado André, 15, para lhe acompanhar na mata numa aventura com que sonhava desde a infância: chegar ao topo do Morro do Baú, em Ilhota.
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No sábado pela manhã, os três reuniram mantimentos e planejaram almoçar um churrasco no topo da montanha e retornar com segurança antes do anoitecer. Mas o trio se perdeu nas trilhas. O resgate do Corpo de Bombeiros começou somente no final da tarde. Flaviano só conseguiu chegar em casa às 6h de domingo.
Jornal de Santa Catarina – Por que vocês tentaram subir o morro?
Flaviano Miranda – Saímos sábado, perto das 8h. Às 11h30min, chegamos quase no topo. A gente queria sair, levar uma carne para assar lá em cima, passar uma tarde em família, dar risadas, ver o mar. Era um sonho meu desde pequeno, porque da minha casa dá para ver o Morro do Baú. Queria estar no topo perto do meio-dia, para no máximo às 16h já estar embaixo de volta. Para subir até lá foi rápido, umas duas horas e meia, mas para descer que o tempo foi mais longo.
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Santa – Como vocês se perderam?
Flaviano – Nos perdemos no local onde havia uma placa indicando para a cachoeira. Não sei se fui para a direita ou segui reto. Quando chegamos ao último paredão, faltando 50 metros para chegar ao topo, não íamos nem para um lado, nem para outro. A gente mal conseguia voltar, nem subir. Vínhamos contornando o morro em forma de círculos. Pensava que, se a gente fosse toda vida reto, uma hora a gente ia cair na trilha. Mas não foi isso que aconteceu. Chegou uma hora que o cansaço, a falta de preparo físico, a fome e a fraqueza bateram.
Santa – Quando perceberam que estavam perdidos fizeram o quê?
Flaviano – Do alto, avistamos uma estrada, um bananal e uma casa. Decidimos chegar até a casa, mas ela estava muito longe. Era 16h e vi que não dava para chegar antes de anoitecer. Preocupado com o Daniel (filho de 10 anos), procuramos um lugar que pegasse celular e chamamos os bombeiros. Eles nos orientaram a ficarmos parados e fazer alguma coisa para sinalizar onde estávamos, como uma fumaça ou fogueira. Cada um de nós ficou com uma camisa amarrada num pau comprido para poder acenar. Chegamos a queimar até o sapato e o casaco para fazer fumaça.
Santa – Como foi o resgate?
Flaviano – A hora que o helicóptero chegou era umas 17h. Levaram só o Daniel, por rapel e nos disseram que era para apagar a fogueira. O André ficou comigo. Apagamos com a água que a gente tinha. Só que aí ficamos sem água e permanecemos na mata até 22h, quando os Bombeiros Voluntários de Ilhota e um pessoal da comunidade nos encontrou. Quando faltavam uns 400 metros para chegar até a estrada, perto das 3h, achamos um pé de tangerina e comemos para matar a sede, junto com os bombeiros.
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Santa – Vocês levaram mantimentos?
Flaviano – Levamos 8 litros de água, refrigerante, carvão, grelha, carne, fogo e álcool. Mas nunca pensei que a gente pudesse se perder. Enquanto o Daniel estava lá, havia preocupação. Depois que ele foi resgatado, a gente ficou mais tranquilo. Fomos largando tudo para aliviar o peso, menos a água. Até porque nessa hora não dá fome.
Santa – Você já tinha experiência em trilhas?
Flaviano – Nunca tinha feito. Fui muito ali no parapente (Morro Pelado). Também já escalei lá no Retiro dos Padres, em Bombinhas, onde cruzava o meio do mato para ir pescar.
Santa – Apesar do susto, pretende fazer outras vezes?
Flaviano – Não. Não tenho mais ideia. É muito sofrimento desnecessário. Só volto lá se um dia ganhar na Mega Sena e chegar de helicóptero.
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