Eles ainda não se conheciam, mas a linguagem universal da música torna línguas e países meras fronteiras geográficas. O professor Eliomar Junior tocou os primeiros acordes no violão e Daana começou a cantar “Aleluia”, em um tom reconhecido por brasileiros, venezuelanos, haitianos, peruanos, norte-americanos, senegaleses, palestinos e quem mais estivesse naquela sala. Cantando, a pequena jovem de sorriso fácil se liberta da timidez e derruba qualquer barreira imposta pela condição de imigrante. Ali ela pertence.
Continua depois da publicidade
Daana Jean tem 18 anos e mora em Florianópolis há 10 meses. Nascida no Haiti, ela saiu de lá em 2017 após ver tantos outros moradores migrando do país tão castigado por desastres e crises. O primeiro destino foi o Chile, mas o clima seco e frio fazia mal a Daana, que sofre com asma.
Então o Brasil veio como opção, com o clima tropical de Florianópolis — onde uma tia já vivia. Hoje ela mora no Centro da Ilha com a tia e uma prima, enquanto a mãe está no Suriname e passam meses sem se ver.
Ela é de poucas palavras, mas conta que o português quase perfeito foi mais fácil de aprender quando chegou no Brasil pois já sabia bem o espanhol. Por isso em Florianópolis Daana recomeçou os estudos e está no Ensino Médio, feito junto de um curso técnico de enfermagem que vem carregado de sonhos para o futuro.
Meu sonho desde pequena é ser pediatra. Gosto de cuidar das pessoas, cuidar das crianças.
Além dos estudos regulares, Daana participa das atividades promovidas pela Pastoral do Migrante em Florianópolis. Frequenta as aulas de português e agora também as de música, todas as quartas-feiras, onde está aprendendo a tocar violão.
Continua depois da publicidade
— Quando estou em casa eu gosto de cantar no meu quarto, principalmente música gospel. Canto no coral da igreja também, é o que mais gosto de fazer — explica Daana.
Com a música, os estudos e as atividades Daana constrói aos poucos seus laços com a cidade que a acolheu. Hoje a haitiana diz que gosta muito de morar em Florianópolis e se sente bem aqui. Para imigrantes como ela, atividades feitas os grupos de estrangeiros são, muitas vezes, o maior convívio social possível nos primeiros meses em um país novo e tão diferente. Mais que aulas, as ações na Pastoral do Migrante se tornam encontros sociais em um ambiente amigável para quem busca recomeços.
— A música é a linguagem do coração, e em momentos de escalada da violência, da discriminação, precisamos de um processo educativo maior. A música se torna essa forma de se entregar emocionalmente, permite ficar junto — conta o professor Lucas Ferreira, idealizador do projeto Recomeçar em Sol Maior, que com 10 voluntários leva as aulas gratuitas de música para os imigrantes.
Leia outras histórias de imigrantes em SC
Vendendo bolos na rua, venezuelano reencontrou a esperança em SC
Continua depois da publicidade
Antes de ter food truck em Blumenau, iraniano vendeu baterias em SP e procurou emprego com bilhete
Família da Venezuela encontra apoio público em SC em busca de oportunidades
Fugindo da guerra, família síria montou restaurante em Florianópolis que reúne estrangeiros