Mais que o relógio, a maré é quem controla a vida das pescadoras artesanais em Santa Catarina. As oscilações — cheia, do mar para a terra; vazante, da terra para o mar — mexem com o cotidiano delas. A dança das águas também influencia o vocabulário: se a maré enche, o mar engorda; se a maré vaza, o mar emagrece.
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Também os diálogos ganham expressões — verbos, adjetivos — como se pessoas fossem: maré poderosa, vento traiçoeiro, mar bravo. Esse vaivém das águas movimenta os locais de embarque e de desembarque. Nos picos de abundância as baleeiras se afastam, deixando trapiches e ranchos sob os cuidados de garças e socós.
Unidas pela geografia e parentesco, estas trabalhadoras conhecem os hábitos umas das outras. Da terra, usam os pontos cardeais para apontar localização das parcerias. Para quem de longe observa, as embarcações parecem caixas de fósforos numa piscina olímpica esverdeada.
Foi isso que nossa reportagem presenciou em 17 de maio nas águas da Baía da Babitonga. Na manhã franjeada de sol surge um pequeno barco. É Rosalina de Souza Usa, a Rosa, e sua imersão da silhueta. Cobre-se com um avental de oleado amarado, protege o pescoço com um lencinho e a cabeça com boné jeans. Entre uma tarrafada e outra, Rosa explica estar pescado camarão branco.
— Camarão é assim: é de dia, é de hora. Somos pescadores de robalo, mas hoje o vento não está ajudando — conta.
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O marido, Pedro, está no leme e ouve a conversa. Rosa fala sobre a experiência de pescar em parceria.
— Tem dia que é bom e tem dia que não (risos), é como em casa: tem dia que não dá certo.
Quando isso acontece, será que dá peixe?
— Não, aí só dá briga (risos).
Rosa e o marido formam uma das duplas de pescadores mais experientes da região. Acostumada à rotina, ela se mostra ciente do nadar finito dos cardumes. Para ela, a mesma água onde muitas mulheres aprenderam a nadar e viram saltar a vida nas braçadas dos filhos, precisa de cuidados.
— O mar nos dá muita coisa boa.