Como se sabe, tudo nessa vida acaba: a fama do jogador de futebol passa, a alegria de ter conquistado uma garota que a gente desejava desde o colegial também, aquela calça preferida, de tão velha, precisa ser jogada fora, mesmo os casamentos felizes chegam ao fim, assim como a grana nos últimos dias do mês, e até o amor. Talvez o que de mais duradouro o homem tenha inventado, quase sempre acaba, conforme escreveu Paulo Mendes Campos em sua crônica inesquecível. Portanto, não seria esta coluninha que não chegaria ao fim, depois de quase três anos dando alegria aos corações mais vagabundos e tirando a paciência de todo o restante.

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Sim, vamos fechando o expediente por aqui, feito o dono de um boteco que às 5h da manhã serve a última cerveja quente e boceja sem culpa sobre o balcão, depois de chegar ao incrível número de umas 140 crônicas, 99 fios de cabelos perdidos, 32 confusões, 28 mensagens de apoio das minhas tias, 12 desafetos, 8 broncas do editor, 5 arrependimentos, 3 novos amigos e 2 presentes de leitores, sendo 1 de grego. O mais importante é que em nenhuma segunda-feira a coluna esteve vazia, embora já tenha me ocorrido a ideia inúmeras vezes.

Com o tempo, de fato, todo cronista passa a ter este orgulho meio idiota: em qualquer situação, sóbrio ou de ressaca, de bem com a vida ou depois de ter tomado um pé na bunda, com um tanto de ideias ruins ou mesmo sem absolutamente nada pra dizer, enfim, em qualquer situação somos capazes de castigar uns 3 mil caracteres no editor de texto mais próximo. Carregar o leitor até as últimas linhas de uma crônica passa a ser um vício.

Escrever semanalmente para o jornal, de qualquer modo, me fez descobrir algumas coisas. A principal delas é que no geral as pessoas acreditam em tudo que você diz. Se eu disser, por exemplo, que estou deixando a coluna porque fui convocado pela NASA para realizar pesquisas em Marte com o intuito de organizar por lá um concurso cultural, tem gente que acredita – e ainda escreve e-mail perguntando quando abrem as inscrições. Houve uma moça que me escreveu com a intenção de entrevistar a minha tia Rosette Rosa para um documentário sobre mulheres no futebol, coisa que só não aconteceu porque o cachê da minha tia é muito alto. Fica um conselho, portanto, e pela última vez: não acreditem em tudo que escrevem por aí. Na dúvida, aliás, é mentira.

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Mas fui surpreendido também, e isto é o mais bonito, por leitores especiais que chegaram ao meu texto por motivos totalmente imprevisíveis, como é o caso do seu Luiz Dias, que em agosto de 2011 me escreveu uma mensagem assim: “Estava procurando no DC a página do Sudoku (sou apaixonado por esse passatempo), quando vi sua matéria As profissões do meu avô. Sinto que fiquei com uma pontinha de inveja, visto que não tive a mesma oportunidade, pois meu avô faleceu antes do meu nascimento”, e então passou umas três páginas contando histórias sobre seu avô. Serei eu um sentimental ou é realmente valioso pensar que seu Dias deixou de jogar Sudoku por um dia para lembrar do avô que não teve?

E existe finalmente uma terceira categoria de leitores: aqueles que não vão de jeito nenhum com a sua cara, por mais esforço que você faça, mas leem a coluna de vez em quando só pra incomodar. Lembro que na estreia uma mulher me ameaçou dizendo que era assinante! Eu já tinha sido ameaçado por todo tipo de gente, mas jamais por uma assinante de jornal. Outro dia, enquanto eu bebia uma cerveja, um rapaz veio tirar satisfação a respeito de um texto que ainda nem tinha sido publicado. Outra coisa inédita. A estes, aceitando o conselho de Brás Cubas, pago com a felicidade e um piparote.

Seja como for, além das pesquisas em Marte, devo deixar a coluna porque está cada dia mais difícil escrever histórias criativas e absurdas. A concorrência da vida é desigual. Ontem mesmo li a notícia de que uma moça tatuou o nome do Boninho no seio esquerdo – bem perto do coração! – para tentar entrar no próximo BBB. Mais tarde, soube de um chinês que roubou um iPhone e depois enviou a lista de contatos escrita à mão para o dono. Como posso escrever uma crônica boa desse jeito? Provavelmente é possível, mas preciso parar e pensar. Enquanto isso, mando notícias de Marte, e adeus!

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