Versões da troca de tiros que terminou com a morte de dois delegados da Polícia Federal na madrugada de quarta-feira, em Florianópolis, já estão registradas no inquérito aberto pela Delegacia de Homicídios da Capital. Os delegados Elias Escobar, 60 anos, e Adriano Antônio Soares, 47 anos, morreram em função dos disparos. Já o vendedor de cachorro-quente Nilton Cesar Souza Júnior, 36 anos, que também foi atingido ao trocar tiros com eles, continua sob custódia da polícia no Hospital Florianópolis.

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Foram ouvidas ao menos cinco pessoas que são consideradas testemunhas-chave para o esclarecimento do caso: além de um vigilante da boate onde a briga teve início e das duas mulheres que trabalham no local, também prestaram depoimento dois taxistas que acompanharam a confusão sob pontos de vista diferentes. Um deles levou os delegados até a casa noturna e outro já estava estacionado em frente à boate.

Os depoimentos deles e de outras testemunhas foram obtidos pela RBS TV, com exclusividade, nesta quinta-feira. As narrativas têm alguns pontos conflitantes, como o exato momento em que o desentendimento teria começado, e também não esclarecem quem atirou primeiro.

Relatos repassados à polícia, no entanto, indicam que Nilton saiu na frente e já estava sob a mira das armas dos dois delegados federais quando deixou a casa noturna. Versões também apontam que um dos delegados chegou a empurrar um funcionário de Nilton na saída.

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Os depoimentos confirmam que os delegados e Nilton só tiveram contato dentro da boate onde a briga começou. No entanto, um taxista ouvido pela polícia revela que um dos delegados chegou a disparar com a pistola para o alto durante uma corrida, após jantar em um restaurante no Sul da Ilha.

Os delegados, segundo esse mesmo taxista, ainda estiveram em uma casa de striptease antes de seguirem para o local do tiroteio. A versão das duas mulheres que estavam na boate indica que os delegados já chegaram alcoolizados e queriam continuar bebendo. As duas confirmam que são acompanhantes e dizem que pediram que os delegados fossem embora porque não vendem bebidas no estabelecimento.

Uma delas também afirma em depoimento que um dos delegados pretendia levá-las ao hotel onde estavam hospedados, o que foi recusado. A polícia ainda procura os dois homens apontados como envolvidos nas mortes. Ambos são funcionários de Nilton no negócio de cachorro-quente.

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Um deles, segundo a polícia, não estava envolvido na troca de tiros, mas outro teria participado do confronto e atirado contra um taxista em frente ao Hospital Florianópolis.

AS TESTEMUNHAS

A polícia ouviu cinco testemunhas que tiveram participação ativa nos acontecimentos. Além de um vigilante da boate e das duas mulheres que trabalhavam no local, foram ouvidos dois taxistas: um que os levou até a casa noturna e outro que já estava estacionado em frente à boate e observou a confusão do lado de fora, prestando socorro a um dos delegados após o tiroteio.

TEMPO NA BOATE

Os dois delegados teriam permanecido entre 15 a 20 minutos na boate até que a confusão começasse. Essa é a estimativa informada por um vigilante da casa noturna à polícia. A informação também corresponde com a estimativa do taxista que os acompanhou no estabelecimento.

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GRITOS DE “POLÍCIA”

Todas as cinco principais testemunhas ouvidas em depoimento confirmam que os delegados gritaram “polícia federal” ou ao menos “polícia” na hora da confusão. Os gritos são mencionados pelo vigilante, pelas duas mulheres e pelos dois taxistas ouvidos.

CONTRADIÇÃO SOBRE RESPOSTA

Apesar de os gritos de “polícia” terem sido ouvidos por todas as testemunhas, há uma contradição sobre outro grito. Apenas as duas mulheres que trabalham na casa disseram ter ouvido “perdeu, perdeu” em resposta aos policiais. O vigilante, no entanto, não faz menção ao segundo grito. Os dois taxistas também disseram não terem ouvido gritos de “perdeu, perdeu”.

CONHECIDO NA CASA

O vendedor de cachorro-quente Nilton e era conhecido na boate. As duas mulheres ouvidas pela polícia e o vigilante da casa noturna mencionaram que ele costumava frequentar o local para entregar lanches.

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BOATE ANTERIOR E TIROS PARA O ALTO

O taxista que levou os dois delegados para a boate conta que a noite de ambos começou por volta das 20h, quando os pegou em um hotel e os levou a um restaurante. Outros três delegados estavam juntos. Por volta da 1h30min, depois de todos jantarem e beberem, levou o mesmo grupo de volta para o hotel. No caminho, o taxista disse que o delegado mais novo (seria Adriano) abriu o vidro e fez dois disparos com a pistola para o alto.

Três delegados ficaram no hotel, mas Adriano e Elias quiseram dar sequência à noite. Então, o taxista os levou para uma casa de striptease na avenida Mauro Ramos. Os dois entraram, deram uma volta e retornaram. “Queriam algo mais simples e mais rápido, que não precisasse pagar drinks”, contou o taxista no depoimento. O taxista decidiu levá-los para a boate onde a confusão aconteceu. Disse ainda que os acompanhou até o estabelecimento porque costumam pagar gorjeta para quem leva clientes.

CONTRADIÇÃO SOBRE A CONFUSÃO

As duas mulheres que trabalham na boate dizem que a confusão entre os envolvidos começou no corredor de acesso à saída, já fora da parte interna da casa, e não dão detalhes do desentendimento. Elas apenas afirmam que os delegados queriam beber, mas pediram que eles se retirassem porque o lugar não vende bebidas. A versão do taxista que os acompanhou dentro da boate, no entanto, traz outros detalhes. Ele diz que os delegados sentaram para “ver as meninas e logo em seguida começaram a circular pela casa em locais proibidos para clientes”. Isto teria motivado o atrito entre os delegados e Nilton, que estava acompanhado de seu funcionário. Segundo o taxista, a confusão começou já dentro da casa e teve sequência na hora em que todos saíam.

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EMPURRÃO NA SAÍDA

Depoimentos indicam que o vendedor de cachorro-quente Nilton foi o primeiro a sair pelo corredor. Isto é apontado pelo taxista que estava estacionado em frente ao local (ele faz menção a Nilton como “o gordinho”) e pelo taxista que acompanhava os delegados. O taxista que os acompanhava ainda narrou que o funcionário de Nilton queria que os delegados saíssem primeiro, mas foi impedido. “O delegado mais novo pegou ele pelo braço e empurrou para fora”, contou. A situação é confirmada por uma das mulheres. Ela diz que “um daqueles dois (delegados) empurrou” o funcionário “e saíram porta afora”.

DELEGADOS SACARAM ARMAS PRIMEIRO

Não há certeza sobre quem atirou primeiro, mas depoimentos apontam que os delegados foram os primeiros a sacar as armas na confusão. O taxista que já estava estacionado no local diz que o “gordinho (seria Nilton) vinha na frente e estava de costas para os outros dois”, que estavam com arma na mão, “apontando para a nuca do gordinho”. O outro taxista, que acompanhava os delegados, disse ter visto o delegado mais novo (Adriano) “sacar a arma e apontar para as costas de Nilton” e ainda ter gritado “todo mundo aqui vai morrer”.

Nenhum dos taxistas viu Nilton sacar a arma. Os dois taxistas dizem ter ouvido disparos em seguida, mas sem saber confirmar quem atirou primeiro. As duas mulheres ouvidas dizem não ter visto o que aconteceu da porta para fora. O vigilante ouvido disse ter corrido na hora dos fatos, mas que no seu entendimento Nilton teria atirado primeiro.

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TIROS NO HOSPITAL

Depoimentos esclarecem os tiros ouvidos próximos do hospital que recebeu os baleados na ocorrência. O taxista que levou o delegado Adriano até a unidade médica conta que, na hora em que estava saindo, percebeu a chegada do mesmo táxi que havia levado os delegados para a boate. No mesmo instante, uma pessoa dentro de uma caminhonete Tucson desembarcou com uma arma na mão e disse “vaza daqui, teu cliente matou meu patrão, senão vou te estourar”. Em seguida, tiros foram disparados.

O relato é semelhante com o do próprio taxista que seria o alvo dos tiros. Ele diz que foi até o hospital e procurou conversar com o funcionário de Nilton, responsável por levá-lo na caminhonete Tucson até a unidade. Mas relata que o funcionário não quis conversa e fez os disparos em sua direção, apesar de não atingi-lo.