A celebração de fim de ano em Correia Pinto, na Serra catarinense, foi marcada pela entrega de aves e cestas de natal aos servidores da prefeitura. A cidade também foi enfeitada com decorações festivas. Nada muito incomum, a não ser pela origem do dinheiro que bancou a festa.
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Segundo um levantamento preliminar do Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE) ao qual a NSC TV teve acesso e que enviado a integrantes da CPI da Covid, a administração pagou por tudo com dinheiro destinado ao combate à pandemia de coronavírus — que já matou mais de 18 mil pessoas em SC.
O levantamento aponta que 110 municípios do Estado usaram verba federal com “desvio de finalidade”. No topo da lista, além de Correia Pinto, aparece ainda Santo Amaro da Imperatriz, na Grande Florianópolis.
A ação do TCE foi uma resposta a um ofício do senador e hoje ministro da Casa Civil Ciro Nogueira (PP-PI) que pediu aos 27 Tribunais de Contas Estaduais e ao Tribunal de Contas da União (TCU) informações sobre gastos com a pandemia. A solicitação foi feita em abril no contexto da CPI da Covid e resposta foi encaminhada no fim de julho.
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O TCE afirma que o levantamento é preliminar e que é passível de correções. “Esses dados, apurados em conjunto com o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), estão em fase de aprofundamento das informações para checagem de indícios de desvio de finalidade”, disse em nota.
Mesmo assim, o texto foi enviado à CPI. Em nenhum trecho do documento é citado que os dados passariam por revisão.

Os auditores investigaram como e onde foi aplicado o dinheiro encaminhado pela União ao Estado e municípios por meio da lei complementar nº. 173/2020. A legislação prevê duas fontes de recurso chamadas de 52 e 53. A 52 tem uso exclusivo para gastos com saúde e assistência social. Porém, para a 53 não há uma determinação de aplicação.
Dinheiro ainda teria custeado móveis, plantas e pavimentação de ruas
Segundo o documento do TCE, a gestão anterior da prefeitura de Santo Amaro da Imperatriz usou a verba 52 para pagar servidores, comprar móveis, plantas, café e pavimentação de ruas. Mais de R$ 2,6 milhões teriam sido usados com “desvio de finalidade”.
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Em nota, quando procurada pela reportagem da NSC, a prefeitura afirmou que inverteu as fontes de recurso na hora de repassar dados ao TCE. Ainda no texto, a gestão reiterou que aplicou os recursos corretamente de acordo com a lei, sendo mais de R$ 330 mil em ações de assistência social e saúde.
“Informamos que esta municipalidade aplicou os recursos exatamente como determina o texto da Lei, ou seja R$ 337.237,25 com assistência e saúde e o restante com outras áreas de atuação”, disse a nota.
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O município da Grande Florianópolis registrou mais de 3 mil casos de Covid-19. Até terça-feira (10), segundo dados do governo estadual, 73 pessoas morreram no município em decorrência da doença.
Mais de R$ 1 milhão teria sido usado com “desvio”
Segundo município com mais “desvios”, Correia Pinto teria aplicado o recurso da saúde no custeio da iluminação de natal, manutenção de veículos da prefeitura e na construção de uma ponte. Ao todo, R$ 1,1 milhão foi gasto.
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A cidade da Serra catarinense tem cerca de 12 mil habitantes. Desde o início da pandemia, 1.845 casos e 59 óbitos foram confirmados. O município tem quatro postos de saúde e um hospital público. Esse último não dispõe de Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Pacientes que necessitam deste tipo de atendimento são encaminhados para Lages.

Sobre os “desvios”, a antiga gestão negou, em nota, ter cometido irregularidades. Um erro nas informações enviadas ao TCE justificaria o ocorrido. Ao invés de computar os gastos citados como 53 — que não tinha destinação pré-definida — foi marcado como 52, exclusivo para saúde.
A atual administração municipal informou que assim que soube do conteúdo do levantamento solicitou informações à equipe contábil. Os técnicos teriam constatado equívoco no envio de informações ao TCE.

Para o presidente da comissão de moralidade da OAB/SC, Rogério Duarte, é necessário uma apuração sobre esses gastos:
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— Tudo precisa ser investigado. Mesmo que seja erro de digitação, é preciso abrir um processo e apresentar defesas.
Falta transparência nos gastos pelo Estado, aponta TCE
O levantamento do TCE também analisou o dinheiro recebido e gasto pelo governo do Estado. Segundo os auditores, o governo detalhou apenas o que foi feito com R$ 638 milhões de despesas, com dinheiro transferido da União, no Portal da Transparência, o que não abrange o total de mais de R$ 2,4 bilhões encaminhado pelo governo federal.
Segundo os auditores, isto comprometeu a transparência na aplicação dos recursos destinados ao combate à pandemia.
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O governo do Estado informou que recebeu recursos do Governo Federal, da Assembleia Legislativa, do Tribunal de Contas, do Poder Judiciário, de pessoas físicas e de instituições privadas. Ao todo, Santa Catarina recebeu R$ 1,78 bilhão e sendo R$ 333 milhões para enfrentamento da pandemia e R$ 1,44 bilhões como auxílio financeiro.
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Também disse que R$ 638 milhõesforam aplicados diretamente na Saúde. O restante do recurso foi aportado para minimizar a queda de receita, que atingiu mais de 30 por cento em maio de 2020.”
O governo informou ainda que essas informações constam no Balanço Geral do Estado e foram apresentadas ao Tribunal de Contas do Estado em março deste ano.
O governo do Estado também ressaltou que em junho deste ano, o TCE aprovou as contas do governo do Estado por unanimidade, com o menor número de ressalvas e recomendações dos últimos 18 anos.
Irregularidades podem configurar crime
O advogado especialista em Direito Público com ênfase em Gestão Pública, Guilherme Moura Cardoso, explica que se constatados, os desvios podem caracterizar crimes de responsabilidade.
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Ele cita que os “desvios de finalidade” podem ser enquadrados na lei de responsabilidade fiscal — que proíbe que recursos transferidos entre entes da federação sejam utilizados em finalidade diversa da pactuada.
Além disso, a possível irregularidade fere também a lei dos crimes de responsabilidade, o código penal e o artigo 37 da Constituição, no que trata sobre a administração pública.
— As sanções podem partir de ressarcimento aos cofres públicos e multa, passar por perda de mandato eletivo e chegar a enquadramentos criminais — disse.
CPI vai analisar levantamento
Em nota, o TCE confirmou que enviou o levantamento inicial ao Senado. “O Tribunal de Contas de Santa Catarina (TCE/SC), em resposta ao ofício recebido do Senado Federal, e observando o prazo que lhe foi assinado, encaminhou àquela Casa Legislativa, no último dia 26 de julho, relatório técnico contendo levantamento inicial sobre a destinação dos recursos enviados pela União aos municípios catarinenses para o combate à pandemia da Covid-19”.
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Já o MPSC, informou que o levantamento foi analisado e solicitadas “correções e complementações ao TCE”. A conclusão da análise deve levar mais um mês, informou o órgão. “Somente após o recebimento da versão final que vamos definir a forma de atuação do MP”.
A assessoria do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), que assumiu o lugar de Ciro Nogueira na CPI da Covid, informou que ele irá analisar os documentos e se comprovados decisivos, apresentará denúncias na CPI.
Retrospectiva da pandemia de Covid-19
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