Quando abrirem as velas no domingo, será a última vez que os velejadores da Volvo Ocean Race pisarão em terra firme por no mínimo duas semanas. Até Newport, em Rhode Island, nos Estados Unidos, serão 5,6 mil milhas ao ritmo do vento e sob o domínio das ondas. Na bagagem, quase nada: uma ou outra peça de roupa para usar embaixo do traje impermeável, produtos de higiene e, vez ou outra, um petisco “contrabandeado”. De cada porto, levarão apenas as memórias.

Continua depois da publicidade

Ao longo das últimas semanas, a reportagem entrevistou vários velejadores para descobrir se, assim como a maioria de nós, eles são tentados a levar “lembrancinhas” para casa. No barco não é possível, diante do espaço reduzido, quase claustrofóbico, de convivência. Mas como as famílias costumam encontrá-los em cada parada, seria de se esperar que levassem um pedaço da aventura em terra como recordação.

No entanto, a resposta é unânime. Os homens e mulheres que desbravam os mares mais perigosos do planeta exercitam o desapego. Afinal, por que carregar coisas quando podemos levar experiências? Faz sentido.

– Não levamos nada. Vamos a tantos lugares, então tentamos aproveitar o máximo possível e manter na memória – diz o espanhol Xábi Fernandez, comandante do barco Mapfre.

Dee Caffari, velejadora que comanda o barco Turn The Tide On Plastic, complementa:

Continua depois da publicidade

– Levo muitas boas memórias. Viemos de condições muito frias, e em Itajaí encontramos um tempo ensolarado, a praia. Aproveitamos o máximo que pudemos.

É preciso desapegar de muitas coisas para encarar uma regata que dura oito meses e é apontada como a mais dura prova do esporte profissional que existe. Ficaram de lado a casa, a família, os amigos. O prazer de tomar um banho quente e de dormir uma noite inteira. A sensação de estar com a roupa seca. E a de comer algo além de “comida de astronauta”.

Martine Grael, medalhista olímpica e única brasileira a disputar a regata volta ao mundo nesta edição, a bordo do veleiro AkzoNobel, carrega chocolates sempre que pode. É um “conforto psicológico”, diz. Dos supermercados locais vão embarcar castanhas e amêndoas, para garantir energia, alguns biscoitos – para quebrar a monotonia da comida pastosa – e frutas. Especialmente maçãs e laranjas. O problema é que elas estragam rápido, então vão durar apenas os primeiros dias de viagem.

– A gente é muito preocupado com o peso a bordo. Mas tem uma pessoa que adora salsicha, e de vez em quando, no meio da perna (trecho), tira alguma, ninguém sabe da onde e divide com todo mundo – conta Martine.

Continua depois da publicidade

Preocupação com o peso extra

O peso a mais, dentro do barco, significa menor velocidade. É tudo o que as equipes não querem em uma disputa em que vence quem atravessa primeiro a linha de chegada. Por isso a alimentação é controlada – o cálculo leva em conta o mínimo necessário para o pior cenário possível. E, vez ou outra, ele acontece.

A equipe espanhola Mapfre, depois de ter uma vela rasgada no Cabo Horn, estendeu em cinco dias a viagem e a alimentação precisou ser racionada. Um bilhete alertou a tripulação que teriam que reduzir os lanches pela metade. No final, ao invés de três refeições ao dia, era feita apenas uma. Ugo Fonollá, o repórter a bordo do barco, conta que a fome era tanta ao chegar a Itajaí que foi preciso maneirar para não passar mal. Ele perdeu cinco quilos nos dias de racionamento.

Na bagagem vai uma bolsa por tripulante. Martine Grael, por exemplo, leva três trocas de roupa, que serão usadas por baixo do macacão impermeável. Ela descobriu, ao longo da regata, que a lã é o tecido que melhor se adapta à vida no mar. Seca rápido e esquenta o corpo para as temperaturas geladas que virão pela frente.

As “malas” só vão entrar no barco pouco antes de partir. Assim como os alimentos e os produtos de higiene. Nada de sabonete ou shampoo: para o banho, somente toalhas umedecidas.

Continua depois da publicidade

Se o sacrifício vale a pena? Eles garantem que sim. Numa competição tão desgastante, emocional e fisicamente, é preciso ter paixão pela vela para encarar o desafio. Antônio Fontes, velejador português que fez estágio no AkzoNobel antes de assumir uma vaga no barco SHK/Scallywag – veleiro onde viajava John Fisher, atleta que morreu ao cair da embarcação próximo ao Cabo Horn – resume o sentimento dos atletas:

– É o topo da carreira para um velejador profissional, trabalhei bastante para conseguir chegar aqui. Há menos pessoas que ultrapassaram o Cabo Horn do que pessoas que subiram o Everest. É um sonho realizado.

::: Leia mais notícias do Vale do Itajaí no Santa

::: Leia mais notícias de Santa Catarina no NSC Total

Tempo para estar em casa

Para a maioria dos velejadores, as paradas da Volvo Ocean Race são oportunidades para uma rápida “fugidinha” para casa. A brasileira Martine Grael, por exemplo, dividiu-se entre Itajaí e o Rio de Janeiro, onde vive com a família. A saudade era grande, principalmente do arroz com feijão.

De volta a Itajaí esta semana, Martine bateu ponto na área gastronômica, em especial no estande que vende caldinho de feijão. Uma delícia, segundo ela. No tempo livre, entre um treino e outro, atendimento a patrocinadores e à imprensa (afinal, ela é a “dona” da festa por aqui), a velejadora ensaiou manobras no skate quando a Vila da Regata ainda estava fechada ao público.

Continua depois da publicidade

O pessoal do barco Turn The Tide On Plastic – a tripulação mais jovem desta edição da Volvo Ocean Race – aproveitou o tempo livre para surfar. O português Bernardo Freitas se machucou enquanto pegava ondas na Praia Brava, e teve que ficar fora da próxima perna da regata. A comandante do time, Dee Caffari, foi recebida na lendária – e restrita – Praia da Atalaia. Já é prata da casa.

Parte dos velejadores aproveitou para conhecer a região. Florianópolis foi um dos destinos favoritos. Outros, como o comandante do AkzoNobel, o holandês Simeon Tienpont, ficaram o mínimo de tempo por ali. A mulher dele está grávida, e a família achou melhor evitar que ela viajasse de avião por enquanto.

Etapa de Itajaí lança tendência na Volvo

Enquanto os velejadores preferem levar somente memórias de cada cidade onde aportam, as equipes de terra não abrem mão de comprar souvenirs. Na África do Sul, por exemplo, os turbantes fizeram sucesso. Em Itajaí, nada esteve mais em alta entre os estrangeiros do que as camisetas que trazem nomes de praias catarinenses estampadas.

Produzidas por uma marca local de Itajaí, elas viraram objeto de desejo. Jonno Turner e Amy Monkman, que apresentam bem-humorados vídeos online nas redes sociais da Volvo Ocean Race, usaram mais de uma vez camisetas que levavam no peito os nomes de Itajaí e das praias Brava e Cabeçudas.

Continua depois da publicidade

– Decidimos que a partir de agora vamos fazer isso em todas as paradas – comentou Turner.

No Facebook, pessoas de todo o mundo pediram informações sobre onde poderiam conseguir camisetas iguais. Amy pediu a Chris Stoner, o dono da marca, para divulgá-la ao público.

– A gente vê diariamente os estrangeiros vindo, de todas as equipes. Já sabem o que é Cabeçudas, Praia Brava, eles têm um carinho pelo o que é daqui – comenta o empresário.

Espanhóis da equipe Mapfre vencem regata local em Itajaí

As equipes da Volvo Ocean Race voltaram para a água na sexta-feira em Itajaí para a In-Port Race, minicorrida local da regata de volta ao mundo. Em um percurso entre boias nos arredores da baía de Itajaí, seis veleiros disputaram a prova que vale pontos no desempate da Volvo Ocean Race.

A regata começou pontualmente às 14h com a disputa pela ponta, que foi vencida pelo barco da Mapfre. A embarcação espanhola largou na frente, seguida de perto pelas equipes Vestas e AkzoNobel. Na tarde ensolarada em Itajaí e com um grande público em barcos e na Vila da Regata acompanhando a prova — que durou uma hora —, as equipes fizeram um aquecimento para a grande largada da próxima etapa, neste domingo, às 14h, com destino a Newport, em Rhode Island, nos Estados Unidos.

Continua depois da publicidade

Com cerca de 10 minutos de prova, o Team Brunel, que havia vencido a etapa até Itajaí, teve problemas na vela e ficou para trás. Mapfre e AkzoNobel seguiram brigando na ponta até o fim da prova, que teve o barco espanhol cruzando em primeiro a linha de chegada, seguido pelo AkzoNobel, que tem a brasileira Martine Grael na tripulação.

O veleiro da Dongfeng Racing Team ficou em terceiro, seguido por Turn The Tide On Plastic, Team Brunel e Vestas 11th Hour Racing. O time Sun Hung Kai/Scallywag foi o único a não participar, pois chegou em Itajaí somente na quinta-feira à tarde e ainda está fazendo reparos no barco. A equipe ficou parada no Chile e desistiu da etapa entre Auckland (Nova Zelândia) e Itajaí após o acidente que causou a morte do tripulante John Fisher.

Confira o que vai rolar na Vila da Regata nos últimos dias

Sábado:

– A partir das 10h: Volvo Youth Academy – corrida de crianças e adolescentes

– 12h30min às 14h30min: Natália Pereira Quinteto l 16h às 17h: Grupo de Dança Millenium – Palco Pódium

– 17h às 19h: Nós III Rústico e Acústico no Palco Principal

– 19h30min às 21h: MPB Trio- no Palco Principal

– 21h30min à 0h: Banda Gt 80

Domingo

– Abertura dos portões às 10h

– 11h30min: Cerimônia (Banda Siri na Lata) no Palco Principal

– 12h30min às 14h30min: Elisa Cordeiro e Trio no Palco Principal

– 14h: Largada para Newport (EUA)

15h às 18h: Roda De Samba no Palco Principal

Das 16h às 17h: Cia Backsdance Family – Dança, Amor em Movimento no Palco Pódium

Onde assistir a regata

– Vila da Regata: só ali é possível ver de perto a emocionante despedida dos velejadores

– Morro da Atalaia: se você prefere uma visão do alto, é o melhor ponto de Itajaí

– Molhe Sul: desta vez o Molhe Norte, em Navegantes, está fechado para as obras da nova bacia de evolução. Mas o Molhe Sul, em Itajaí, traz uma vista privilegiada do circuito que os barcos fazem antes de partir

Continua depois da publicidade

– Praia da Atalaia: é possível assistir, mas, dependendo do ângulo, pode ser difícil avistar os veleiros

Praia de Cabeçudas: você conseguirá ver os barcos à distância

Praia Brava: um pouco mais longe, mas é possível avistar as velas coloridas no mar