Distâncias curtas, de 15 quilômetros, que demoram quase uma hora para serem percorridas em horário de pico. Trajetos de 30 quilômetros que duram quase duas horas, mesmo sem engarrafamento. Percursos que parecem intermináveis, mas que são vividos diariamente por quem se desloca por Florianópolis e nas cidades da região.

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Considerada a pior cidade brasileira para se dirigir, segundo pesquisa do aplicativo Waze de 2017, que mede o índice de satisfação dos motoristas com base no nível de trânsito, de segurança, de qualidade das vias e do fator econômico e social, a Capital catarinense está avaliada com nota 3,98 no estudo que tinha 10 como pontuação máxima.

Também não é uma das melhores cidades para se andar de ônibus, de acordo com dados da Prefeitura de Florianópolis: de 2014, desde o início da operação do Consórcio Fênix, até 2019, o número de passageiros que utilizam o transporte coletivo só reduziu. Passou de 55 mil usuários para 40 mil em cinco anos. Enquanto os anos passam e a população aumenta, as soluções demoram a aparecer.

Em 2019, apenas a região do Sul da Ilha amenizou as filas e os congestionamentos. Por lá, o fluxo melhorou, segundo a Polícia Militar Rodoviária (PMRv), devido a construção de um novo acesso, que também atende ao novo aeroporto, entre o bairro Carianos e a SC-405, nas proximidades do Campeche. Nos demais trechos, a paciência ainda é principal companhia dos usuários.

E, para atenuar os problemas dentro da Ilha, alguns projetos estão em andamento. Recentemente, a prefeitura implantou uma terceira faixa na rodovia Admar Gonzaga (SC-404), sentido Morro da Lagoa-Av da Saudade, mesmo sendo uma rodovia estadual. Agora, começa a fazer o mesmo em sentido oposto.

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Um dos projetos mais aguardados é o anel viário, por onde deve passar um corredor exclusivo de ônibus, no formato BRT (Bus Rapid Transit). A circulação será por toda a Avenida Beira-Mar Norte, na região da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e com a volta concluída na Beira-Mar Sul.

O projeto do BRT que está ainda na primeira etapa e essa “solução” é uma história que se arrasta ao longo dos anos, desde 2012. O projeto total contempla 17 quilômetros e será realizado por etapas, com licitações específicas para cada área. Nesse momento, estão em obras a duplicação de um trecho da Deputado Antônio Edu Vieira, no entorno da UFSC, e a implantação de uma pista para ônibus no bairro Saco dos Limões. Não há previsão de quanto tempo a prefeitura vai levar para concluir a obra toda.

Em termos de mobilidade, toda vez que se demora um ano para resolver o problema, ele cresce 2%, 2,5%. A cada quatro anos sem investir em grandes projetos de mobilidade, estou acumulando 10% naquele problema que não resolvi Coordenador do Grupo de Trabalhos do Comitê Metropolitano para o Desenvolvimento da Grande Florianópolis, Ângelo Marcos Arruda

Outro projeto em andamento, porém esse feito pelo governo do Estado, é a ampliação de um trecho da SC-401, na saída do bairro Itacorubi, sentido Norte da Ilha. A terceira pista, que vai do cemitério até a conhecida Curva da Morte, pretende desafogar o trânsito de quem sai dos bairros ao Leste da Ilha pela Admar Gonzaga.

A intervenção é de pequeno porte e considerada por especialistas um paliativo, assim como a implantação das terceiras pistas (uma em cada sentido) feita recentemente pelo Dnit na Via Expressa Continental (BR-282), que desafogou em parte a chegada e a saída da Ilha de Santa Catarina. Para o doutor em Engenharia de Transportes pela USP, José Leles de Souza, essas ações até podem ajudar a desafogar determinado trecho, mas não serão, na avaliação dele, a solução para a mobilidade da Ilha:

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– Se quiser resolver o problema, tem que mexer nas estruturas de transporte.

O especialista defende que linhas de ônibus confiáveis podem ser uma solução para os problemas de mobilidade, mas analisa o transporte coletivo, como está, incapaz de fazer com que um motorista deixe o veículo próprio, por exemplo, para optar por um ônibus:

– Com os corredores, há ganho de tempo e até em conforto, mas só dá para aplicar quando você tem um sistema viário amplo.

Veja mais: Mapa mostra a formação de engarrafamento e filas em Florianópolis

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(Foto: Reprodução)

Os obstáculos da Ilha

Para Arruda, ao pensar na mobilidade da Capital e suas imediações, não se pode ignorar a demografia de Florianópolis: é uma ilha e, portanto, ladeada por morros, montanhas, água, córregos e mangues, o que dificulta a ocupação dos espaços.

— Estamos em uma ilha, cuja acessibilidade central é por rodovias estaduais, avenidas que cortam de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Significa dizer que sai todo mundo na mesma hora e deságua nesses lugares, que são os mais comprometidos do ponto de vista da quantidade de veículos circulando – avalia.

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Com uma média de um carro para cada dois moradores, segundo dados do Detran de 2018, a Capital catarinense soma 521 automóveis para cada 1 mil habitantes. Somente os emplacados em Florianópolis, incluindo as motos, são 360,8 mil veículos, segundo balanço divulgado pelo Detran há pouco mais de um mês.

Isso, sem contar os carros, as motos, os ônibus e os caminhões que entram na Ilha de SC diariamente. Em outubro, em média de 106 mil veículos entraram por dia em Florianópolis, segundo a Diretoria de Operações de Trânsito de Florianópolis.

De acordo com o secretário segundo de Mobilidade e Planejamento Urbano de Florianópolis, Michel Mittmann, a entrada de veículos teve um aumento de 15% com o encerramento dos serviços da Zona Azul – sistema de estacionamento rotativo – o que "já era previsto pela Prefeitura". A volta dos trabalhos, que deve ocorrer no próximo ano (nova licitação está em andamento), deve reduzir o número de usuários com veículo particular, ainda conforme Mittmann.

Para o arquiteto e urbanista Ângelo Arruda, o problema do deslocamento na Grande Florianópolis poderia ser amenizado com o transporte náutico, algo também em discussão pelo governo do Estado.

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—Não dá para pessoas morarem em Biguaçu, trabalharem no Centro e atravessarem a ponte todos os dias tendo uma baía que você enxerga de um lado a outro. Poderia deixar o carro em um estacionamento, pegar um barco, descer na Praça XV — sugere.

Veja no mapa os horários de maior volume de veículos na região Continental

Transporte integrado e conectividade no transporte

Uma tentativa de fazer mais pessoas optarem pelo ônibus em vez do automóvel é a integração do transporte coletivo entre os municípios da Grande Florianópolis. Na segunda-feira (25), uma audiência pública discutiu a adesão de Palhoça ao modelo proposto para a região. A resposta do município é a etapa que falta para o governo do Estado lançar o edital de concessão, que já foi assinado por sete dos nove municípios da região.

Para o professor da Udesc Daniel Pinheiro, responsável por um estudo sobre opções de mobilidade em Florianópolis, a conectividade é, de fato, um ponto chave para fazer o transporte coletivo ganhar a preferência dos moradores. No entanto, essa conectividade é vista de uma forma ampla, interligando inclusive com outros modais.

– O ideal seria a pessoa que mora em regiões mais afastadas do Centro poder vir de carro até determinado local, deixá-lo em um estacionamento, pegar um ônibus e seguir o destino em direção ao Centro, onde a concentração de carro é maior. Essa interligação é importantíssima – aponta Pinheiro.

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Por fim, o uso da bicicleta, que em cidades europeias como Amsterdã é o grande trunfo da mobilidade, por aqui, segundo os especialistas consultados, ainda segue uma matriz bem brasileira, de ser mais um meio de lazer do que um veículo de transporte.

– Compreender a necessidade de opção de outros modais de transporte é fundamental para a mobilidade. Qualquer cidade continuará crescendo, em população e em volume de veículos. Se não gero alternativa de circulação, pelo transporte marítimo, ampliação do sistema cicloviário interligando as regiões da cidade, o volume dessa frota e a demanda de deslocamento vão crescer. E essa demanda vai se pautar pelo veículo individual – avalia Leles de Souza.

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