Escoltado por motociclistas da Polícia Militar nas ruas, vaiado por servidores federais na frente do Fórum, saudado com palmas no corredor e agraciado com homenagens dentro do Tribunal de Justiça, em Florianópolis, onde também participou de audiência na frente de um preso usuário de crack.

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Em Florianópolis na manhã desta segunda-feira, o ministro Ricardo Lewandowski, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), se mostrou entusiasmado com a possibilidade de fazer um Brasil melhor.

Apesar da agenda cheia de compromissos oficiais na Capital catarinense, ele também foi visto em um box do Mercado Público ao lado do prefeito Cesar Souza Júnior e do presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Nelson Schaeffer Martins, onde tomou um café.

Idealizador das audiências de custódia pelo País, em que um preso em flagrante deve ser encaminhado a um juiz em 24 horas, o ministro estima que hoje em média 50% das prisões em flagrante são irregulares.

Nos seus cálculos, até o fim do ano o 120 mil pessoas não perigosas devem deixar de ser presas, o que vai gerar economia anual de R$ 4 bilhões. Segundo o ministro, o Brasil tem 600 mil presos, destes, 40% (240 mil) são provisórios e há casos em que ficam anos sem ver um juiz. Lewandowski concedeu rápida entrevista coletiva no Tribunal de Justiça.

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Como avalia o impacto da audiência de custódia?

Na medida que um Estado importante como Santa Catarina adere a essa iniciativa, eu penso que a audiência de custódia está plenamente consolidada no País. Não apenas pela adesão espontânea de uma magistratura importante, de um Judiciário relevante como é o catarinense, mas também porque na semana passada o STF, em um julgamento histórico, em que essa audiência foi questionada por uma associação de policiais, considerou-a plenamente compatível com a Constituição de 1988. Ela contribui para o respeito da cidadania em geral.

Mas e a falta de estrutura do Judiciário no interior?

É claro que o mundo não se fez num único dia e a audiência de custódia não será implantada de uma vez num único ato. Isso será um processo paulatino. Em cinco a 10 minutos, o magistrado resolve a situação do preso, ao invés de deixar acumular os processos. Hoje, o juiz tem contato direto com o preso, ver se oferece perigo para a sociedade, se é violento, se pode ser recuperado e se pode responder em liberdade ou segregado da sociedade e deve ir para à prisão. No Brasil todo, a experiência tem demonstrado que 50% das prisões não devem ser transformadas em prisões preventivas. A iniciativa contribuirá para que a carência de vagas no País seja mitigada sem que o poder público gaste um único tostão.

Mas há receio de juízes, promotores e policiais que nas ruas aumente a violência com essas solturas.

Absolutamente não. Os presos que são liberados não são liberados sem condições. São liberados mediante tornozeleiras (em SC elas ainda não foram implantadas), encaminhados para serviços de recuperação de drogas, de acompanhamento social. Busca-se recolocá-los no mercado de trabalho, portanto, são atendidos por psicólogos, assistentes sociais. Não é uma medida isolada. O perigo é manter uma pessoa que não deve ser presa, muitas vezes um jovem, uma pessoa que cometeu um primeiro crime, é um primário, cometeu um delito de menor potencial ofensivo. Ele vai para cadeia, é aliciado pelas organizações criminosas e sai pior do que entrou, pós-graduado no crime. Com essa medida estamos contribuindo para a segurança. Vamos manter presos somente aqueles que representem ameaça à sociedade.

Há prazo para interiorização desse projeto?

Não temos prazo, mas temos juízes criminais que estão conscientes do drama que se desenrola nas prisões. Nós temos os piores sistemas prisionais do mundo, infelizmente, e alguns espontaneamente já estão querendo trazer para as suas comarcas essa iniciativa que é a audiência de custódia.

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O senhor sofreu críticas em um protesto de servidores federais na frente do Fórum. Há alternativa sobre o que reivindicam (retirada do veto sobre reajuste salarial de 78%)?

Eles tiveram recentemente aumento de três parcelas de 5% como todos os servidores federais do país. O que havia era realmente o projeto inicial que previa aumento de até 78%. Esse projeto foi enviado numa realidade em que o momento econômico era outro e hoje os cofres públicos não comportam mais esse aumento e a presidenta da República vetou. Eu passei a negociar com as autoridades fazendárias durante muito tempo, inclusive com auxílio de técnicos e chegamos a um valor de 41,35% pagável em oito semestres (três anos e meio), que é o valor compatível com que o orçamento pode comportar.