Na bela igreja construída em 1877 e que fica no topo de um morrinho às margens da Rua Amazonas, Blumenau teve uma grande missão cinco anos atrás: dar início às comemorações dos 500 anos da Reforma Protestante no país. Na Paróquia do Centro, subindo aquela estradinha de paralelepípedo perto do Hospital Santa Catarina, fiéis se reuniam pela primeira vez em uma tarde de domingo para celebrar o pentacentenário do dia em que Martinho mudou a história do cristianismo. Não era por menos. Com 23,3 mil adeptos às ideias de Lutero, a cidade tem a maior comunidade luterana em todo o Brasil.
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Então, chegou o verdadeiro dia. O tal 31 de outubro, aniversário daquele momento que nós aprendemos na escola, em que Martinho Lutero prega na porta da igreja do Castelo de Wittenberg, Alemanha, suas 95 teses. A divisão do cristianismo e a criação de uma nova vertente de fé foram consolidadas a partir daquela data.
Nesta terça os municípios do Vale celebrarão os 500 anos da Reforma com cultos, corais e orquestras, e planejam uma mobilização capaz de envolver dezenas de milhares de pessoas na região. Em Blumenau, por exemplo, as ações serão concentradas na Igreja Martin Luther, Itoupava Seca, a partir das 19h. Além disso, pontualmente às 15h17min (em alusão ao ano de 1517), haverá um badalar dos sinos nas paróquias da cidade durante três minutos.
Outros municípios como Pomerode — onde 46% dos habitantes, mais de 11 mil pessoas, são luteranas —, Timbó, Indaial, Brusque e Rio do Sul também terão comemorações. Para o pastor timboense Dari Jair Appelt, é a hora dos fiéis não apenas valorizarem a data importante e impactante — afinal de contas não é todo dia em que se completa 500 anos de algo —, mas também refletirem sobre o futuro. Na opinião do religioso, a Reforma marcou um período de mudanças quanto ao pensamento sobre a igreja e isso precisa estar em evolução constantemente na cabeça das pessoas.
— A igreja não pode ficar estagnada, engessada. Precisa se atualizar. Há todo um legado principalmente com a educação e isso é fantástico. Recentemente nos reunimos com jovens e eles elencaram alguns pilares em que precisamos evoluir para estarmos sempre em reforma, até mesmo quebrando algumas resistências que sempre tivemos — comenta Appelt.
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O pastor Milton Jandrey, ministro da Igreja do Espírito Santo, acredita que a volatilidade dos sentimentos e percepções sobre a vida são pontos que precisam ser trabalhados “nos 500 anos que virão pela frente”. Ele avalia que a função luterana não é apenas citar e contextualizar a palavra de Deus, como também discutir questões familiares atuais e estar atento àquilo que envolve a sociedade.
— Vivemos em uma sociedade que hoje é líquida, não quer ter vínculos e está mais preocupada consigo mesma, com o “eu”. É um momento delicado que envolve os fiéis e o próprio capital, o consumismo. Temos que pensar mais no nosso planeta, no mundo, tanto para uma vida de fé quanto pela vida em coletividade — argumenta Jandrey.
A Igreja Luterana surgiu basicamente com a revolta de Martinho Lutero quanto à venda de indulgências, as tais salvações divinas pagas que eram comercializadas durante o século 16. Democratização dos estudos e da música foram outros pontos que marcaram a Reforma e resultaram na divisão da Igreja do Ocidente, com os católicos de um lado e luteranos do outro.
— Temos o nosso legado e que precisa ser vivido com responsabilidade. Esse é um princípio (o de democratizar a igreja) luterano, para que mais pessoas possam ter acesso à palavra de Deus ?— finaliza o pastor blumenauense.
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Em Santa Catarina, 213 mil pessoas são luteranas, o segundo maior número do país, atrás apenas do Rio Grande do Sul (450 mil). O Estado está à frente de outros mais populosos como Paraná (88 mil) e São Paulo (40 mil).