Em uma videolocadora, bastaram alguns instantes de distração da ginecologista Márcia Ruschel Meine, 43 anos, para que seus dois filhos, Natália, na época com sete anos, e Henrique, com quatro, fossem parar na ala de filmes “para maiores”. Os dois espreitavam, agachados, e soltavam risadas. Quando a mãe os chamou de volta, Henrique disparou:
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– Mãe, por que tem tantos piu-pius amarrados ali?
A pergunta, referente à decoração da prateleira, apanhou a mãe de surpresa.
– Não tem hora marcada para se falar sobre isso. Eles nos pegam desprevenidos e temos de usar a criatividade para dar uma resposta de acordo com o que têm maturidade para entender – diz Márcia.
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Natália, hoje com 13 anos, lembra que a primeira pergunta feita à mãe foi a tradicional “de onde vêm os bebês”, quando tinha 10 anos.
– Falávamos sobre isso na escola e eu perguntei em casa – relata.
Também de dentro da escola emergiu um novo debate nesta semana. A turma de Natália, no Colégio Farroupilha, de Porto Alegre, teve um bate-papo com a coordenadora pedagógica e um professor de biologia sobre a importância da vacinação contra o vírus HPV, motivado pela recém-iniciada campanha nacional que visa imunizar meninas de 11 a 13 anos.
A familiarização de meninas dessa faixa etária com uma vacina que protege contra um vírus transmitido pela via sexual trouxe à tona um assunto que nem sempre é tratado com naturalidade dentro de casa, mesmo que a curiosidade pela descoberta do corpo surja muito mais cedo, como a pergunta de Henrique na videolocadora demonstra.
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Com a chegada da campanha, os pais foram assaltados por dúvidas sobre quão abertamente se pode falar acerca de sexo com meninas de 11 anos e se a conversa derivada da vacinação pode soar como estímulo ao início precoce da vida sexual.
– O desafio é encontrar o equilíbrio. Não dá para adiantar coisas demais, mas também não dá para omitir informação e fazer de conta que não vê que ela cresceu – diz a professora Márcia Pittelkow, 45 anos, mãe de Alice, 11.
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Aluna da Escola Estadual Ildefonso Gomes, Nathália Costa da Silva, 13 anos, não acha que falar sobre sexo em casa possa estimular a prática.
– Não tem nada a ver isso de estimular, acho que é melhor falar antes que aconteça alguma coisa – defende a adolescente.
A enfermeira Nicélia Soares da Costa, 35 anos, reconhece que Nathália muitas vezes busca informação na internet e na televisão por conta própria. É o mesmo caso de Martina Acosta, 12 anos. Ela já tinha lido tanto sobre o assunto que apenas informou a mãe de sua decisão por fazer a vacina. Foi a primeira da fila quando a equipe de saúde chegou à escola.
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– O mais importante é ela entender que a vacina previne apenas uma das questões relacionadas ao sexo, mas existem muitas outras – observa a dentista Liliana Acosta, 45 anos, mãe da adolescente.
Em 2015, a faixa etária da vacinação será reduzida para nove a 11 anos. As mães ouvidas pela reportagem são unânimes: com nove anos, é mais difícil explicar. Mas isso será outro capítulo.
A vacina contra o HPV
– É feita em três doses. A primeira começou a ser aplicada esta semana, a segunda ocorre seis meses depois da primeira e a terceira após cinco anos.
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– O público-alvo da campanha neste ano são meninas de 11 a 13 anos. Há um cronograma de vacinação nas escolas, mas as doses também estão disponíveis em postos de saúde.
– Pais que não quiserem que suas filhas recebam a vacina devem assinar a carta de recusa encaminhada pela escola.
– A campanha para aplicação da primeira dose segue até 12 de abril.