Há um ano, um vírus fatal para milhões de pessoas e capaz de se propagar com uma rapidez nunca antes vista, invadiu a vida e mudou a rotina de pessoas espalhadas pelo mundo inteiro. De lá pra cá, a população precisou conviver com as incertezas e a ansiedade de uma espera, enquanto assistia às descobertas da ciência. 

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A corrida por uma vacina contra o novo coronavírus foi o principal objetivo do primeiro ano da pandemia, enquanto os países e a população tentavam lidar com a disseminação e as consequências do vírus.

A dúvida dos primeiros meses da crise sanitária, sobre se seria possível produzir uma vacina eficaz contra o SARS CoV-2, deu lugar a testes e estudos que aos poucos foram trazendo algumas certezas e uma perspectiva sobre o início de vacinação no mundo.

O médico imunologista e professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), André Báfica, diz que o desenvolvimento das diferentes vacinas se valeu de conhecimentos de várias áreas da ciência e da compreensão da doença e do vírus. O especialista cita também o avanço nas tecnologias novas, como as vacinas de RNA mensageiro dos laboratórios Pfizer e Moderna, como outras novidades importantes da ciência no primeiro ano da pandemia.

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Esta técnica usa código genético para “ensinar” o organismo a produzir proteínas como a Spike, que é utilizada pelo coronavírus para penetrar na célula humana, e dessa forma produzir anticorpos contra o vírus. 

O método já vem sendo estudado há décadas, mas as vacinas de RNA contra a Covid-19 foram as primeiras licenciadas no mundo. As taxas de eficácia das vacinas e como elas atuam no corpo para combater sintomas leves, médios e graves da doença também foram informações esclarecidas ao longo deste ano, com a elaboração e os resultados dos estudos clínicos feitos pelos laboratórios. As vacinas usadas no Brasil, por exemplo, a CoronaVac tem eficácia média de 50,38% contra todas as formas da doença e a vacina de Oxford/Astrazeneca, de 70%.

Embora muitos avanços e respostas tenham sido obtidas nesse período, ainda há incertezas que cercam as vacinas que buscam prevenir a Covid-19. Uma delas é o impacto das variantes sobre as vacinas em utilização. Uma das dúvidas, no entanto, é se os imunizantes que já vêm sendo utilizados protegem com eficácia contra as novas linhagens do coronavírus. Segundo Báfica, outro desafio para a sequência da pandemia deve ser antecipar quais variantes podem surgir.

– As fábricas terão que se antecipar nas variantes que estão aparecendo, saber quais vírus que estão circulando no mundo. Precisamos ter dados disponíveis, porque o vírus viaja rápido, na velocidade de um avião. As fábricas podem ser coquetéis e para o próximo ano (o caminho) é fazer esse tipo de antecipação. Temos tecnologia para isso – pontua.

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Apesar do otimismo com as novas vacinas e da expectativa por um ritmo maior de vacinação no Brasil, afirmar que a pandemia vai chegar ao fim com a vacina ainda não pode ser encarado como uma certeza, segundo o imunologista.

– Tem se trabalhado para o futuro é de termos uma vacina para solucionar essa pandemia. Se a gente chegar no mesmo nível da infecção pelo Influenza, que causa gripe, anual, será uma grande vitória já. Uma grande vitória porque temos grandes problemas em controlar a transmissão do vírus. Como o vírus tem transmissão fácil e o comportamento dos seres humanos é muito difícil, esse controle em vários lugares é mais difícil. Por isso, a vacina ideal seria uma que não depende do comportamento dos seres humanos – afirma.

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Como ocorre a transmissão

Mas muito antes das vacinas começarem a dar esperanças à população, foi preciso adquirir conhecimento suficiente sobre o vírus e sobre a sua ação de contágio e de infecção. A primeira descoberta em relação à doença foi quanto à transmissão. 

Estudos iniciais descobriram três formas de contágio: o mais provável, por contato direto com o vírus; o mais comum, por aproximação com pessoas infectadas, através de secreções como saliva, muco ou gotículas respiratórias e em distância de até um metro; e indiretamente, através de superfícies ou objetos contaminados.

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Presidente da Sociedade Catarinense de Infectologia, Fábio Gaudenzi explica que, embora no início da pandemia as superfícies contaminadas tenham sido tema de preocupação, com um ano de estudos já é possível saber que a transmissão indireta é muito menos comum:

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– O vírus tem a capacidade de se manter por períodos prolongados em alguns ambientes, a depender das condições do local, como umidade e sol, por exemplo, mas é preciso que se tenha uma quantidade suficiente (do vírus) para ocorrer a contaminação. É muito mais difícil dessa forma, do que se pensava no começo, mas ocorre. Por isso da recomendação de higienização das mãos.

Distância, uso de máscara e higiene das mãos são ações preventivas
Distância, uso de máscara e higiene das mãos são ações preventivas (Foto: Diórgenes Pandini)

Comprovadamente, segundo o infectologista, a forma mais comum de contágio entre as pessoas é através da aproximação com quem está infectado. Isso porque o doente pode expelir gotículas – uma gota pequena, porém pesada – que conseguem atingir a distância de até um metro de quem a está liberando. E é por essa razão, inclusive, que as autoridades sanitárias cobram o distanciamento mínimo de 1,5 metro entre as pessoas e o uso de máscaras.

Por fim, o contágio também pode ocorrer pelo ar, através de aerossóis – gotas quebradas em tamanho microscópico e com comportamento de gás, que podem flutuar pelo ambiente por períodos maiores. Nesse caso, o risco é maior para os profissionais da saúde e pessoas que trabalham em ambientes onde os pacientes são atendidos.

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– Assim, além do paciente, o ambiente também tem capacidade de transmissão, mesmo que eu não tenha mais o paciente no local. Eu vou aspirar aquele gás e me contaminar – explica.

Uso de máscara

Antes mesmo do vírus chegar ao Brasil, o que se viu foi a busca desenfreada por máscaras. As farmácias tiveram seus estoques zerados entre o final de fevereiro e o início de março, a ponto de profissionais da saúde recomendarem publicamente o não uso do acessório em todo o país.

Até mesmo o ministro da Saúde, à época Luiz Henrique Mandetta, chegou a fazer um apelo público para que as máscaras fossem doadas à instituições de saúde. Pouco depois, no entanto, conforme a compreensão sobre a doença evoluiu, houve outro entendimento:

– A máscara é recomendada para quem tem sintomas, mas mesmo os pacientes assintomáticos (com Covid-19), também transmitem. Então começou a se entender melhor essa transmissão e se viu que assintomáticos ou pré-sintomáticos – dois dias antes dos sintomas aparecerem – também transmitem. Então utilizo de forma ampla, para evitar que liberem vírus no ambiente – esclarece Gaudenzi.

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Por quanto tempo uma pessoa transmite o vírus?

Inicialmente se falava em torno de 14 dias, tempo em que as pessoas comprovadamente infectadas precisavam ficar em isolamento total. Depois, pelos estudos, se viu que o contágio não acontecia mais após 10 dias da doença nos pacientes que apresentavam sintomas leves, reduzindo, portanto, o período de isolamento.

Agora, por conta das novas variantes encontradas em todo o mundo, inclusive a brasileira, que surgiu em Manaus, mas que já circula nas cidades catarinenses, novas pesquisas precisam ser feitas. Segundo o infectologista Fábio Gaudenzi, alguns estudos preliminares têm mostrado que o tempo de liberação do vírus pode ser maior, o que acendeu um alerta entre os estudiosos.

Lockdown: se fechar traz resultados?

Na luta contra um vírus que se dissemina no contato entre pessoas, uma das primeiras e principais medidas foi o fechamento de estabelecimentos e eventos que de alguma forma reúnam a população e, portanto, possam ser ocasiões de transmissão da doença. O chamado lockdown é até o momento motivo de divergência de parte da população e de políticos, que questionam a medida sob o argumento dos impactos econômicos e sociais que ela poderia provocar.

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O epidemiologista do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Lúcio Botelho, lembra que o isolamento não é novidade e costuma ser usado em outras pandemias, como a pandemia do vírus H1N1, em 2009. Ele explica que, na prática, isolar as pessoas reduz a contaminação e faz com que o vírus, sem ter tantos hospedeiros humanos para se replicar, enfraqueça no ambiente.

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Lockdown foi decretado em SC em 18 de março de 2020, logo no início da pandemia
Lockdown foi decretado em SC em 18 de março de 2020, logo no início da pandemia (Foto: Diórgenes Pandini/DC)

O professor cita o exemplo de países que adotaram a medida na crise sanitária atual e que experimentaram reduções nos índices de contágio. É o caso de Portugal, por exemplo, que em fevereiro reduziu em 92% a média de casos diários de Covid-19 com um novo lockdown, e do Reino Unido, que em seis semanas entre janeiro e fevereiro de 2021 diminuiu em 80% o número semanal de pacientes com coronavírus.

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Mais do que funcionar, para o especialista o lockdown é necessário em momentos como o estágio atual da pandemia. O problema é que a discussão sobre essas restrições é vista por muitas pessoas como um embate entre saúde e economia, quando a análise deveria ser diferente, na avaliação dele. O professor defende que o isolamento carece justamente de medidas econômicas para dar apoio às pessoas para permitir o isolamento.

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– Não há mais dúvida de que o lockdown funciona, mas ele não pode ser simplesmente o fechamento como se todo mundo morasse em uma casa com condições de higiene, provisão de alimentos. Tem que ser uma coisa planejada: o que vamos fazer para dar sustentação às pessoas, ao pequeno, ao micro, ao médio, e até ao grande empresário. Não há antagonismo entre saúde e economia, há a necessidade de que em curto espaço de tempo, planejadamente, feche tudo para que volte o mais rapidamente possível e se fortaleça – avalia.

Tratamento e cura

Antivirais, antiparasitários e medicamentos desenvolvidos para diversas outras condições foram testados ao longo de 2020, com a expectativa de que pudessem tratar a infecção causada pelo coronavírus.

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No Brasil, o uso indiscriminado de medicamentos sem eficácia comprovada causou grande polêmica. Em Santa Catarina, até mesmo a ideia de ministrar ozônio aos contaminados que residem em Itajaí, no Litoral Norte do Estado, foi ventilada, mas não se consolidou. As inúmeras pesquisas realizadas até o início deste mês de março não encontraram evidências ou indicações consistentes sobre a eficácia de remédios contra o coronavírus, conforme afirmam os órgãos mundiais de saúde.

De acordo com o presidente da Sociedade Catarinense de Infectologia, Fábio Gaudenzi, uma série de tratamentos ainda continuam em teste e medicamentos antigos são reavaliados com frequência, mas não se chegou ao resultado esperado, com alta taxa de eficiência, até o momento:

– É por isso que gera essa dúvida e discussão intensa. Porque os trabalhos não conseguem mostrar uma grande resposta. Ficam muito próximos do placebo – quando não tem alteração no organismo. Estatisticamente não se consegue provar que eles (os remédios) tenham eficácia. Muita pouca coisa tem tido resultados e ainda é muito aquém do necessário.

Neste contexto, sem um único tratamento verdadeiramente capaz de combater a doença, o infectologista reforça que o foco das autoridades em saúde segue para o mesmo ponto de partida do início da pandemia: evitar ser contaminado.

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– Sabemos que entre 20% e 60% das pessoas que tiverem a forma mais grave da doença, vão acabar evoluindo pro óbito. Quer dizer que de cada 100 pessoas que entram em um UTI, 60% acaba morrendo. Por isso o foco ainda é evitar o contágio e a nossa maior maior perspectiva é em relação a não ter a doença, através da vacina ou das vacinas.

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