Seja em busca de um par duradouro ou do tal amor “líquido” tão falado hoje, os adeptos dos aplicativos de relacionamento (há alguns anos um dos meios mais comuns para conhecer gente nova e com os mesmos interesses) continuam ativos como sempre – mesmo em tempos de coronavírus. E isso mesmo se, por causa da quarentena, não puderem (pelo menos por enquanto) encontrar pessoalmente os usuários com quem vêm dando match nas últimas semanas. A prova disso é que foi em plena pandemia que o Tinder bateu seu recorde histórico de swipes (a ação de deslizar a tela para um lado ou para o outro): foram mais de 3 bilhões em um único dia.

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Segundo dados fornecidos pelo próprio aplicativo, ao longo da quarentena, as pessoas, além de se conectarem com mais usuários, passaram a conversar mais: as conversas diárias por meio do Tinder aumentaram em média 20% no mundo todo, e a duração dessas conversas cresceu 25%. A leitura da administração do Tinder é que as pessoas estão usando o aplicativo para realmente saber como o outro está, em vez de se preocupar em apenas “dar match”. Nas biografias, frases como “fique em casa”, “fique seguro” e o emoji que representa o ato de lavar as mãos passaram a ser muito usados.

Além disso, durante dois meses, o recurso Passaporte (normalmente disponível apenas para as assinaturas Plus e Gold) foi liberado para todos os usuários: com o recurso, os membros podem pesquisar por cidades e dar likes, matches e conversar com pessoas que estão no local escolhido. Mundialmente, São Paulo (SP) foi a cidade que mais usou o recurso, com os usuários “viajando” virtualmente pelo mundo por meio de conversas: Los Angeles, Nova York e Londres foram as cidades mais “visitadas”.

Tornar os encontros virtuais mais atraentes e divertidos por si só (e não apenas uma etapa obrigatória na direção de um encontro no “mundo real”), aliás, é uma tendência para os aplicativos de relacionamentos – e não só por causa da pandemia. Em entrevista recente à BBC News, o executivo-chefe do Tinder, Elie Seidman, explicou que a empresa tem trabalhado para tornar o ambiente virtual mais interessante e manter as pessoas online: o recurso Passaporte é um exemplo, ao lado de chamadas de vídeo e futuros eventos virtuais.

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Isso porque, segundo Seidman, os jovens de 18 anos que ingressam agora no aplicativo cresceram imersos nas mídias sociais, e veem o mundo online como algo muito natural – diferente do que acontecia com quem baixava o aplicativo em 2012, por exemplo.

– A vida digital [desses novos usuários] é tão importante quanto sua vida social no mundo físico – resumiu Seidman na entrevista.

Na opinião da historiadora Mary Del Priore, ex-professora da USP e da PUC/RJ e autora de livros como História do Amor no Brasil e Histórias Íntimas: Sexualidade e Erotismo na História do Brasil, ainda existe, sim, uma nostalgia do amor romântico (e mesmo do amor proibido dos séculos XVII, XVIII, XIX) no imaginário masculino e feminino – mas a maior facilidade de abordagem entre os possíveis interessados, o controle sobre a gravidez e mesmo a diminuição de preconceitos em relação a relacionamentos homoafetivos mantêm essa nostalgia longe das práticas amorosas e de relacionamento.

– Hoje não somos necessariamente “felizes para sempre” – ela comenta -, mas somos “felizes enquanto dure”.

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*Arte: Ben Ami Scopinho