Quem trafega pela BR-101 na região de São José, na Grande Florianópolis, percebeu que há uma terceira faixa liberada para o fluxo de veículos em alguns trechos no sentido Curitiba. A intervenção tenta minimizar os frequentes congestionamentos na rodovia. Contudo, o novo espaço para carros não foi criado após um alargamento da via, mas com uma camada de asfalto sobre o antigo acostamento.

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A situação será repetida na Via Expressa da Grande Florianópolis (BR-282). Para tentar diminuir as filas diárias que milhares de motoristas enfrentam ao passar pela Capital, houve a liberação da terceira faixa ao longo de todo o trajeto no sentido BR-101. Para quem segue em direção às pontes de acesso à Ilha, a obra na pista adicional deve ser finalizada até julho.

A ausência de acostamento nos trechos mais movimentados de rodovias em Santa Catarina é visto com cautela por diversos especialistas. A principal preocupação é o risco de causar mais acidentes no momento que algum veículo tiver problemas simples, como furo no pneu ou falha mecânica. Sem acostamento para deixar o carro, o motorista terá que diminuir a velocidade sobre a pista e sair do automóvel, o que pode aumentar o risco de colisões traseiras e atropelamentos.

O professor Glicério Trichês, mestre em engenharia civil e doutor em infraestrutura aeroportuária, afirma que asfaltar o acostamento é uma “solução tupiniquim” para a falta de planejamento em infraestrutura. Ele ressalta que a manutenção do espaço faz parte das atividades de conservação da rodovia, as quais devem estar contempladas no planejamento de cada órgão gestor.

Glicério Trichês ressalta que o acostamento tem outras funções para conservação da rodovia. Uma das principais é encaminhar as águas pluviais que caem na rodovia para o sistema de drenagem superficial do pavimento, estruturas geralmente chamadas de sarjetas.

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– Acostamento é sinônimo de segurança para o usuário e fluidez para o tráfego, com importância fundamental no desempenho da rodovia. Ainda tem o seu limite de bordo utilizado para o posicionamento das placas de advertência, sinalização e informações para os usuários – afirma o professor.

O diretor da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), Dirceu Rodrigues Alves, admite que há menos risco de acidentes porque ambas as rodovias são duplicadas e têm canteiro central, de forma que não é necessário invadir a pista contrária para ultrapassar. Contudo, o perigo recai sobre os veículos trafegando em alta velocidade próximos às ribanceiras e “paredões”, algo que potencializa acidentes.

– A engenharia de tráfego deve pensar em dimensões maiores para essas pistas. Condenamos a ausência do acostamento porque consideramos um risco muito grande – afirma Alves.

Especialista em direito, planejamento e gestão no trânsito, Márcia Pontes cita que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê que o acostamento é definido como área para utilização de ciclistas e pedestres, prioritariamente para os moradores de áreas próximas das rodovias.

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– Estão preocupados com a fluidez dos motorizados e indo na contramão do discurso de cidade para as pessoas, algo que costuma surgir apenas em época de Semana Nacional do Trânsito. Fora isso, continuam tirando os poucos espaços que o pedestre e o ciclista tem – lamenta Márcia.

Terceira faixa poderia ser implantada em trechos de SCs

A rodovia estadual mais movimentada de Santa Catarina, a SC-401, tem acostamento na maior parte do traçado e congestionamento quase todos os dias. Motivo para criar uma terceira faixa em alguns trechos da rodovia localizada em Florianópolis? Sim, na opinião do comandante da Polícia Militar Rodoviária de Santa Catarina (PMRv), tenente-coronel Evaldo Hoffmann.

Apesar do Deinfra ser o responsável pela infraestrutura das rodovias estaduais, enquanto a PMRv atua como órgão fiscalizador, Hoffmann afirma que há dois locais específicos onde uma terceira faixa poderia melhorar o tráfego. Um desses é em frente ao Centro Administrativo, onde ele sugere que a terceira pista poderia facilitar a retomada de aceleração dos veículos e a melhor fluidez do trânsito.

O outro trecho, mais crítico, são os acessos para o bairro João Paulo, tanto no sentido bairro quanto para o Centro. Hoffmann afirma que a revitalização daquele ponto é uma reivindicação dos moradores, já que os congestionamentos são frequentes e não há sequer acostamento.

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Mesmo sugerindo a terceira faixa em alguns trechos, o que poderia acabar com o acostamento que há em frente ao Centro Administrativo, o comandante da PMRv reconhece a importância do espaço. Ele afirma que a ausência ou a má conservação do acostamento podem aumentar a possibilidade de atropelamento de pedestres e ciclistas, algo que inclusive ocorreu recentemente na rodovia.

Outro ponto de atenção da PMRv é a SC-405, na região Sul de Florianópolis, já que há volume médio diário de 50 mil carros na rodovia. Hoffmann afirma que existe um grande gargalo no entroncamento da rodovia com a Avenida Pequeno Príncipe, acesso ao bairro Campeche, e que um curto trecho de terceira faixa amenizaria o problema.

– Estamos sugerindo a mudança de local do ponto de ônibus e da ciclofaixa para termos um trecho de 150 a 200 metros com uma pista extra. Assim, quem sai da Pequeno Príncipe pode fazer a conversão à direita sem precisar parar e faz com que o trânsito não trave – explica o comandante da PMRv.

O Deinfra e a Secretaria de Estado da Infraestrutura foram procurados, mas não quiseram falar sobre o assunto.

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A primeira experiência de asfaltar o acostamento para criar uma terceira faixa na BR-101 na Grande Florianópolis ocorreu em 2012, com extensão do Km 204 ao Km 215 no sentido Sul da rodovia. A medida foi considerada positiva pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) pois melhorou o fluxo de veículos entre São José e Palhoça, incluindo o trecho de acesso para a Via Expressa.

Liberação foi emergencial

O inspetor da PRF Luiz Graziano afirma que a liberação dos trechos no sentido Norte foi emergencial e é uma solução que deve ser adotada para o curto prazo. Ele reconhece os riscos da falta de acostamento, mas destaca que a terceira faixa é uma ação paliativa para melhorar o trânsito na região, visto que o município de Palhoça chegou a declarar situação de emergência na mobilidade urbana.

– Temos que definir as prioridades. O que é melhor agora: abrir mão do acostamento para ter uma terceira faixa que dê mais vazão ao trânsito, ou manter só duas e ter um acostamento como uma medida de segurança? O ideal seria três a quatro faixas na BR-101 e mais o acostamento. Mas, infelizmente, não é o que temos no momento – justifica Graziano.