O discurso do candidato governista à presidência uruguaia no fechamento da campanha deu uma senha para o futuro dos uruguaios: as conquistas sociais festejadas no governo do popularíssimo José Pepe Mujica serão mantidas durante o do ex-presidente Tabaré Vázquez, 74 anos, favorito nas eleições deste domingo. A palavra de ordem entre os apoiadores de Tabaré é a de que os avanços não são de um indivíduo, mas da Frente Ampla (a coalizão de centro-esquerda da qual ele e Mujica fazem parte). Mais: são do povo uruguaio.
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Mujica e Tabaré costumam divergir dentro da Frente Ampla. Uma das divergências se dá em relação às liberdades individuais. O candidato, de formação socialista e forte base teórica, é um médico oncologista que se contrapõe a medidas como a legalização do aborto até a 12ª semana e a regulação para produção e venda da maconha pelo Estado. Assessores da Frente Ampla, porém, asseguram: o máximo que Tabaré poderá mudar nesses dois avanços civis é o de tirar das farmácias o ambiente para o varejo da Cannabis sativa.
– Isso não é problema. O importante é que o alto cultivo e a produção para fins medicinais está em estágio avançado e não retrocederão – diz Julio Rey, da federação de cultivadores de Cannabis.
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No encerramento da campanha, quinta-feira, Tabaré falou sobre 10 anos da Frente Ampla, nos governos dele e de Mujica, que foi seu sucessor. Além dos avanços nos direitos individuais, a redução no índice de pobreza nessa década foi de 39% para 11%, e o bom momento deve continuar neste anos. Os analistas e o próprio governo estimam um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em 3,4%.
– Quem imaginaria há 10 anos que festejaríamos tamanha redução da pobreza? Tamanho otimismo com relação ao futuro? – bradou Tabaré, no Estádio Centenário, em Montevidéu.
Há uma unanimidade entre os analistas: Tabaré, que atingiu 47,8% dos votos no primeiro turno, vencerá no segundo. A única dúvida se dá quanto à vantagem que conseguirá – os institutos variam entre 52% e 55% para Tabaré e 37% a 40% para seu adversário, o “blanco” Luis Lacalle Pou. No primeiro turno, aliás, havia um consenso de que, caso a vitória fosse conseguida com índice inferior a 45%, o Partido Colorado se uniria ao Partido Nacional (Blanco). Por conta da mistura de vermelho com branco, formariam a “aliança rosa”. Mas Tabaré roçou os 50%, e não necessariamente os votos migrariam entre as siglas oposicionistas, em razão da rivalidade entre elas – algo como muitas vezes ocorre entre PP e PMDB no Interior gaúcho, integrantes de um resistindo ao outro.
Essa vantagem do socialista é admitida por Lacalle Pou, que prometeu, no comício de encerramento, “voltar a lutar”, já agradecendo a quem o apoiou. Enfim, quase o reconhecimento explícito da derrota.
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A campanha foi amena. No final, Lacalle Pou se irritou com adversários que zombavam dos “pitucos”, pessoas de classe alta. Na TV, uma “pituca” fala ao telefone com “Cuquito” – o pai de Lacalle Pou, o ex-presidente Luis Alberto Lacalle (1990-1995), queixando-se das exigências feitas por camponses e empregadas domésticas. O próprio Mujica pediu desculpas a Lacalle Pou, atribuindo a “ultrapassagem dos limites” ao “calor do momento”. Depois, disse que a “fraternidade” deve ser “preservada”.
Continuidade e busca de respaldo
Dois ministros de Tabaré Vázquez já estão escolhidos. Representam a espinha dorsal de um governo que vai manter as bases do atual. Eduardo Bonomi, confidente do presidente José Mujica, continuará ministro do Interior e almeja dar continuidade ao atual governo. Danilo Astori, atual vice-presidente, será o ministro da Economia e pensa em respaldar medidas de sua área buscando acordos com a oposição. Leia o que pensam:
Eduardo Bonomi
“Nos próximos cinco anos, se eleitos, continuaremos as políticas que estão sendo levadas adiante, sobretudo porque, neste ano, começaram a dar resultado nos lugares onde estabelecemos experiências piloto. Seguiremos instalando câmaras.”
Danilo Astori
“Vamos estender a mão, buscar acordos que nos permitam reforçar resoluções fundamentais. Não conheço, no mundo, nenhuma experiência política exitosa e durável que não tenha sido tomada por acordo, um acordo que se eleve por cima dos partidos.”
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