Dos seis sobreviventes da tragédia na Colômbia, três eram próximos pela convivência no time de futebol profissional. Ainda que os traumas físicos do acidente sejam diferentes entre eles, as dores são as mesmas. Alan Ruschel, Jakson Follmann e Neto, cada qual um pilar que mantém o outro de pé.

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– Não faço mais planos para a vida – diz Ruschel, seguido por Follmann, antes de Neto concluir o pensamento:

– Procuro aproveitar ao máximo o dia.

– Porque hoje estou aqui.

Frases que se complementam e traduzem as vidas após o 29 de novembro.

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Follmann e Ruschel tinham amizade profunda antes da tragédia. Não à toa estavam sentados lado a lado na aeronave. Neto estava no banco da frente. A relação dele com os outros dois era de colega de trabalho. Ainda melhor porque a equipe estava no auge na temporada, com a permanência na Série A assegurada e prestes a disputar a primeira decisão internacional da história do clube. Quando a fase do time é positiva, as relações entre jogadores, por mais que não tenham proximidade, ficam mais fortes.

– Eu não tinha tanta proximidade com o Alan. Tinha de treino, do dia a dia, todo mundo se gostava. Mas eu não frequentava a casa dele, e hoje é diferente. Do Follmann fui padrinho de casamento, um momento bacana da minha vida. A gente fala a mesma língua – dimensiona Neto.

Nos dias que antecederam o casório do agora embaixador da Chapecoense, Neto procurava pelo noivo nas dependências da Arena Condá. A todo instante parecia haver algo a tratar sobre o matrimônio, quando na verdade era a cumplicidade entre eles. Mantém forma de tratamento muito similar da que havia um ano atrás.

As primeiras palavras são em tom de brincadeira, sempre. Depois delas é que falam sobre o que realmente desejam. É uma abordagem característica de jogadores de futebol. Algo que

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Follmann preserva. Mesmo com o encerramento da carreira, forçado pela amputação de parte da perna direita, o ex-goleiro mantém o hábito de estar por pelo menos um período do dia nas dependências do clube.

– Isso de frequentar o clube eu não vou perder nunca. Frequento os treinos, vou a todos os jogos, e até falo na roda antes e depois dos jogos quando posso. Ainda me sinto atleta, não me sinto um ex-atleta – explica o goleiro.

Recuperado, o lateral-esquerdo Alan Ruschel voltou à rotina de atleta. Os jogos, concentrações e treinamentos dificultam a proximidade física com os outros dois. Os horários e locais que frequenta nas dependências da Chapecoense são diferentes e por isso o contato pessoal entre eles diminuiu, mas não se enfraqueceu.

– O Alan está jogando, então nos vemos pouco. Quando estamos juntos, procuramos nos ajudar. Acho que amizade é isso: um ajudar o outro. O amigo verdadeiro abraça e também cobra. Ficou o legado de um confortar o outro – explica Neto.

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Primeiro resgatado do acidente, Ruschel suportou a fratura na coluna, voltou gradativamente aos treinamentos e pôde retomar a carreira. Depois de participar de jogos festivos, sua primeira partida, e como titular, foi em 13 de setembro, no empate com o Flamengo pelas oitavas de final da Copa Sul-Americana, e na Arena Condá, como tanto quis.

A relação de mais de uma década entre Follmann e Ruschel foi fortalecida pela tragédia. Eles se conhecem desde os primeiros passos no futebol em Caxias do Sul (RS), quando estavam no Juventude. Alan chegou a morar em imóvel de propriedade de Jakson. Se antes a amizade dos dois bastava, agora carece ter a do zagueiro junto.

– Conheci Neto assim que cheguei na Chape e depois do ocorrido nos aproximamos bastante. Quero manter essa amizade pelo resto da vida – explica Ruschel.

Uma ligação que vai além da amizade. Os atletas sobreviventes da tragédia do voo da Chapecoense necessitam uns dos outros para seguirem em frente.

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– Depois de tudo que aconteceu, agora somos muito mais irmãos. Estamos unidos para sempre – chancela Follmann.

Sobrevivente que também retornou a Chapecó sem companheiros de trabalho, o jornalista Rafael Henzel mantém contato com os três. A própria vida se encarrega disso. É próximo e bemquisto por Alan, Jakson e Neto. Sente dores semelhantes, mas não compõe o círculo íntimo entre os atletas. Do acidente ao regresso aos microfones, foram 41 dias. Em 9 de janeiro voltou a ancorar o programa de notícias matinal na rádio Oeste Capital, à época com uma tala em um dos pés e em cicatrização de ferimentos na região das costelas. Hoje é mais ativo na carreira que antes de embarcar no avião da LaMia, com espaço na agenda para palestras e outros compromissos, para contar sobre a retomada depois daquela madrugada.