Em tempos de globalização, até pequenos conflitos causam turbulência mundial. Imagine-se um estremecimento entre superpotências.
Continua depois da publicidade
É profundamente preocupante o que está ocorrendo na Crimeia, a península ucraniana que decidiu por referendo retornar à Federação Russa. A situação política da nova República da Crimeia, assim reconhecida pela Rússia, desperta nacionalismos exacerbados e reacende o antagonismo entre potências nucleares que já deixaram o mundo em sobressalto durante décadas. Nada mais indesejável do que uma nova Guerra Fria neste momento em que nações de todos os continentes buscam recuperação econômica e estabilidade social depois de sucessivas crises globais.
Há evidente autoritarismo por parte da Rússia, que promoveu uma invasão armada no país vizinho sob o pretexto de proteger cidadãos de origem russa depois que o governo da Ucrânia foi derrubado por um golpe popular, com o apoio do Ocidente. A anexação da Crimeia à Rússia, oficializada ontem pelo presidente Vladimir Putin, foi respaldada por um referendo que teve 96,7% de votos favoráveis, mas que também foi promovido sob ocupação de tropas estrangeiras e boicotado pelas minorias ucranianas e tártaras da região. Nada é translúcido nesse processo, que também envolve interesses econômicos e ódios étnicos.
As represálias anunciadas pelos Estados Unidos e por seus parceiros europeus, congelando ativos financeiros da Rússia no exterior e impedindo russos e ucranianos de viajarem para o Ocidente, são tímidas diante da gravidade do episódio. Mas não há outro caminho: vários países da Europa dependem do gás russo e os próprios norte-americanos querem manter desimpedidos os caminhos da diplomacia. O referendo até pode ter sido ilegítimo e ilegal, como diz uma nota conjunta dos Estados Unidos e da União Europeia, mas é um fato consumado.
Diante de tal situação, resta esperar que ucranianos e russos encontrem um caminho de tolerância e de convivência pacífica, e que escaramuças entre militares e civis, como a que registrou vítimas ontem, sejam evitadas pelos governos dos dois países. Também se espera que as justificadas sanções ocidentais não derivem para o isolamento total da Rússia e para o reatamento da Guerra Fria, que só tende a trazer danos a todos. Em tempos de globalização, até pequenos conflitos causam turbulência mundial. Imagine-se um estremecimento entre superpotências. Talvez ainda haja espaço para o diálogo, mesmo que ambas as partes já tenham avançado demais pelo caminho da força, do golpismo e das acusações mútuas.
Continua depois da publicidade
A comunidade internacional precisa se manter atenta e vigilante com o que acontece na Crimeia, pois, embora pareça um conflito distante, sempre que as regras internacionais de autodeterminação dos povos são pisoteadas, o mundo todo corre perigo