A calmaria e a tranquilidade do mar na Praia de Itaguaçu se opõem à personalidade forte e intensa de Carlos Alberto da Silva. Não conhece? Ok. A maioria das pessoas o conhece mesmo é pelo apelido: Paru. O homem de 64 anos, proprietário de um restaurante na pequena e tranquila praia continental, é uma das figuras mais icônicas de Florianópolis. Há quatro décadas, o marido da dona Fátima e pai da Vanessa e do Juliano alegra as ruas da Capital durante o Carnaval vestido de noiva.

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Carnavalesco por natureza, como se autointitula, ele é o criador do Bloco das Noivas Virgens do Paru, e figura entre as personalidades do Carnaval de rua da Capital. Entre os inúmeros quadros com fotos de famosos que visitaram o restaurante, imagens do tempo em que era atleta de halterofilismo e referências ao Figueirense, o time do coração, ele recebeu a reportagem para contar histórias e falar dos 45 anos de folia. Até um infarto ele chegou a sofrer durante as festividades.

A gente bem que tentou, mas não teve jeito de fazer a noiva aparecer. Para não dar azar, ela só vai surgir no dia do casamento, quer dizer, em meio as celebrações com os demais blocos durante o Carnaval.

Detalhes da criação da Noiva do Paru, a relação dele com a festa, críticas pela perda da essência das celebrações na Capital e outros assuntos você confere na entrevista a seguir:

Como começou a história de se fantasiar de noiva?

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Eu sempre saía vestido de mulher na praça (Praça XV). Antigamente, a Praça XV era só dos blocos de sujos. Eu sempre saía com os caras famosos, inclusive o falecido Lagartixa, que foi o maior Rei Momo do Carnaval de Florianópolis, para mim ele é eterno. Ele saía junto com a gente, vestido de mulher, na Praça XV. Em 1979, quando casei, surgiu a ideia. A minha mulher não gostava de Carnaval, apesar de ter conhecido ela no Carnaval. Casei no dia 3 de fevereiro.

O vestido usado por ela foi guardado, na mesma caixa em que compramos. Ela botou no guarda-roupa e disse: “Se vier uma filha mulher, ela vai casar com esse vestido”. Tudo bem. Guardamos o vestido. Quando chegou março, no Carnaval, ela foi para a casa da família, roubei o vestido, fui para casa da minha irmã, fiz aquela maquiagem, sem peruca, porque não tinha peruca na época, aí botaram uns arranjos na cabeça, tal, e saí pela primeira vez vestido de noiva. Conclusão: no dia 19 de novembro nasceu a minha filha mais velha (Vanessa), mas aquele vestido não tinha mais. Detonou todo. Então, a primeira vez que saí, foi com o vestido da minha mulher.

Carnaval é uma coisa que ninguém me segura. E a família, minha mulher, me apoia.

Como isso repercute na família? Eles te apoiam? Também desfilam com você?

Tudo tranquilo. A minha irmã saiu muitos anos comigo, vestida de noivo. A gente sempre fez sucesso na praça. Fui hors-concours do Licgay, não podia mais concorrer… Toda vez que eu entrava vestido de noiva, era 1º lugar. Licgay, Bloco do Lira, Bloco da Toalha, Sou mais eu, Berbigão do Boca… bem depois daqueles blocos que a gente saía na Praça XV batendo em lata, tamborim de couro de cabrito. Carnaval é uma coisa que ninguém me segura. E a família, minha mulher, me apoia. Inclusive, muitas madrugadas tenho que acordar ela para abrir o vestido, porque não consigo.

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Você segue algum ritual?

Tem, sim. Tem um maquiador todo ano, que faz uma maquiagem para durar a noite toda. Tudo no esquema. E assim, esse ano não, mas daqui para frente, vou renovar (o armário), vou pegar mais um (vestido de noiva). É uma coisa que, infelizmente, a gente perdeu um pouquinho daquele pique do Carnaval. É uma pena. A Praça XV perdeu a essência. Nada contra o funk, mas a praça está virada num pandemônio. A gente amanhecia vestido de mulher na praça para esperar o encontro do Lira e do Doze, ou quando não, esperar o primeiro ônibus para vir embora (para a Praia de Itaguaçu). Hoje, não dá mais.

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Paru conta histórias sobre o Carnaval de rua de Florianópolis (Foto: Diorgenes Pandini)
O que me faz continuar é que sou carnavalesco. Gosto de Carnaval. Para mim, uma das melhores épocas do ano é o Carnaval.

Você não tem vontade de vestir outra fantasia no Carnaval?

Não. Porque o povo espera a noiva.

Como surgiu a ideia de criar o Bloco Noivas Virgens do Paru?

Isso porque, nas “antiga”, começaram a sair outras pessoas junto comigo vestidas de noiva. Começou com três, foi para quatro, depois cinco, dez… Aí, depois, fiz o bloco.

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Como as pessoas reagem quando veem você e os demais integrantes do bloco nas ruas, vestidos de noivas?

Muitas fotografias. É foto para tudo que é lado. É foto com idoso, com idosa, com jovem, com criança.

O Carnaval é "O jardineira porque estás tão triste…" e outras marchinhas.

São quatro décadas nessa brincadeira. O que te faz continuar?

O que me faz continuar é que sou carnavalesco. Gosto de Carnaval. Para mim, uma das melhores épocas do ano é o Carnaval. Está no sangue, né? Sou Embaixada Copa Lorde, comecei na ala, passei para a bateria. Fiquei muitos anos na bateria. Da bateria fui para a harmonia. Depois fui diretor de harmonia. Depois passei para a velha guarda.

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Qual a maior diferença entre o Carnaval de 1979, quando você criou o personagem, e o de hoje em dia?

(Risos). A diferença, para mim que curti tudo isso, curti um Carnaval sadio – sempre dava confusão, briga, esses troços todos –, mas hoje, infelizmente, a diferença é que começou no Carnaval de Florianópolis banda tocando vanerão. Nada contra o vanerão. Depois, começaram a trazer artistas caríssimos, que não têm nada a ver com Carnaval. Decepcionante. O Carnaval é "O jardineira porque estás tão triste…" e outras marchinhas.

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Fotos do tempo de atleta dividem o espaço com registros de visitantes do restaurante de Paru, na Praia de Itaguaçu (Foto: Diorgenes Pandini)
Carnaval significa descontração, alegria.

Você sofre ou já sofreu algum tipo de preconceito por desfilar vestido de mulher no Carnaval?

Não. Uma vez quando passaram a mão em mim, no mercado, o cara recebeu o troco e acabou caindo sentado, porque eu era um cara desse tamanho (estufa o peito e abre os braços), eu era um animal (lembrando do tempo em que era campeão catarinense de halterofilismo).

Em 2013, por conta de um problema de saúde, a noiva do Paru foi obrigada a se afastar do Carnaval. Como foi esse episódio?

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Em 2013, eu estava no Berbigão do Boca, estava no palco e senti um mal-estar. Desci do palco, uma amiga abriu o vestido atrás, aí, tomei um refrigerante para ver se melhorava, pois achei que tinha comido alguma coisa que não estava bem. Melhorei. Saí com o Berbigão do Boca, dei a volta na praça e vim parar no Trintão, que toda sexta-feira funciona. Era o ritual, todo ano quando eu saía do Berbigão do Boca, parava ali. Fiquei ali. Cheguei em casa às 4h, e lá pelas 5h30min, comecei a passar mal. Mas isso, já tinha infartado no palco do Berbigão do Boca. Mas não arriei. Fiquei 18 dias internado, e o resto do Carnaval fiquei fora. Mas naquele ano, não deixei de sair.

Quando eu estou no Berbigão do Boca, não consigo dar 10 passos, que tem alguém que quer tirar foto comigo.

O que o Carnaval significa para você?

Carnaval significa descontração, alegria… o povo sabe que eu vou estar lá. Tenho carisma, e o povo tem um carinho enorme comigo. Quando eu estou no Berbigão do Boca, não consigo dar 10 passos, que tem alguém que quer tirar foto comigo. É turista, é tudo quanto é gente. De vez em quando vem alguém do bloco e diz: “anda, anda”.

O que espera do Carnaval neste ano?

Espero que mudem a situação da Praça XV. Porque família não pode mais… Acabou (a brincadeira para) as famílias.

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