Um mês após dois jacarés terem sido encontrados mortos no rio Itacorubi, em Florianópolis, a situação continua cercada de mistério. A polícia investiga quem são os responsáveis pelo crime ambiental. De acordo com uma análise exclusiva feita a pedido do Hora de Santa Catarina, a água do canal está poluída, mas, as autoridades ainda não identificaram qual a influência do óleo retirado do local nesse contexto. 

Continua depois da publicidade

> Receba notícias de Florianópolis e região pelo WhatsApp

No último dia 6 de novembro, moradores da cidade foram surpreendidos com imagens dos jacarés mortos, sem cauda e sem cabeça. Os animais também foram flagrados sendo arrastados por outro jacaré em um local visivelmente sujo de óleo. Segundo o Instituto Geral de Perícias (IGP), os répteis foram caçados.

Polícia Civil investiga as mortes

Após a conclusão do laudo pelo IGP, o documento foi entregue à Polícia Civil para dar continuidade às investigações.

— Segundo informações do delegado Fábio Faustino, da Delegacia de Repressão a Crimes Ambientais da DEIC/PCSC, a Polícia Civil de Santa Catarina está apurando informações sobre a autoria do crime e concentra esforços na investigação para responsabilizar os autores. — afirmou a polícia por meio de nota. 

Continua depois da publicidade

Poluição da água

Além da gravidade do episódio ocorrido há um mês, o fato também chamou atenção para outro problema, a qualidade da água que abriga os animais e os riscos envolvidos na poluição da bacia hidrográfica, que destina seus efluentes para o Manguezal do Itacorubi. 

A pedido do Hora de Santa Catarina, um laboratório fez a análise daquela água. A coleta foi feita em um ponto na rua lateral de um shopping, no bairro Santa Mônica. Os resultados mostraram uma alta carga de material orgânico proveniente de esgoto doméstico e não apontaram a presença de metais pesados, ligados à indústria. 

— Pela análise, conseguimos ver vários parâmetros acima do recomendado pela legislação federal. A quantidade de coliformes totais e de nitrogênio amoniacal encontrados superaram a quantidade aceitável — explica Ana Paula Bohm, química responsável pela análise. 

As regras relacionadas a rios, córregos e aos padrões de lançamento de efluentes na água foram estabelecidas pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente por meio da resolução 357. Segundo a legislação, a quantidade de coliformes totais – que são bactérias provenientes de fezes humanas – na água deve ser de no máximo mil colônias. Nas amostras colhidas pelo laboratório havia três milhões de colônias das bactérias. 

Continua depois da publicidade

Quanto ao nitrogênio amoniacal, presente na urina humana, o padrão estabelecido pelo Conama 357 é de 3.7 miligramas por litro (mg/L). Na água do canal foram detectadas 6.16 mg/L. Já a Demanda Química de Oxigênio (DQO), que indica a quantidade de matéria orgânica no rio, deve ser de até 5 mg/L. O resultado da análise foi de 126.76mg/L.

Resultado da análise da água do rio Itacorubi
Análise apontou altos índices de coliformes na água (Foto: Reprodução, laboratório)

— As análises deram muito acima do ideal, o que mostra que aquele córrego está contaminado e mostra que o rio está recebendo esgoto de outros locais sem tratamento. Tudo isso é possível afirmar mediante as análises — pontua Ana Paula.   

> Cobra de jardim é venenosa? Conheça a espécie

Desequilíbrio ambiental

O esgoto in natura identificado na água pode causar um desequilíbrio no ecossistema com grande impacto para os peixes e micro-organismos que vivem naquele espaço. Segundo a bióloga Lígia Moretti, a ação humana dificulta ainda mais a recuperação desses ambientes. 

— Aquele esgoto jogado ali in natura vai impactar muito o ambiente. Demora até o rio conseguir fazer a autodepuração e a cada dia é jogado cada vez mais material, então fica difícil de a natureza fazer o trabalho sozinha. Sempre teriam de ter ações preventivas e o tratamento adequado para poder jogar ali uma quantidade que a natureza consiga manter o ecossistema em equilíbrio — afirma.  

Continua depois da publicidade

Bacia do Itacorubi
Após uma ação do MPF, a Justiça definiu que órgãos municipais e a Casan devem despoluir a bacia hidrográfica do Itacorubi (Foto: Tiago Ghizoni, Diário Catarinense)

Com a poluição do local, existe ainda o risco de eutrofização, fenômeno que modifica a coloração de rios e lagoas e diminui o oxigênio nesses locais. 

— A eutroficação vai proporcionando a fertilização dos ambientes costeiros e à medida que a fertilização avança, temos a floração de algas e com isso, a redução da disponibilidade de luz no fundo [da água]. Sem luz no fundo vem a pouca quantidade de oxigênio, que é insuficiente para a manutenção da vida. Estamos falando de problemas que ao fim podem levar a prejuízos para a maricultura, pesca e até para o turismo — explica Paulo Horta, cientista e professor de biologia da Universidade Federal de Santa Catarina. 

> Jacaré de parque em Florianópolis ganha nome após votação: CoronaJac

Limpeza em novembro 

Depois que os jacarés foram encontrados mortos, uma empresa foi contratada em caráter emergencial pelo Instituto de Meio Ambiente de Santa Catarina (IMA) para fazer uma limpeza do canal. 

Nove mil litros de material contaminado e quatro toneladas de resíduos sólidos foram retirados do local após o trabalho feito entre os dias 9 e 11 de novembro. Tudo que foi coletado na água seguiu para análise para ser comparado com outras amostras colhidas ao longo do canal. 

Continua depois da publicidade

O IMA ainda não divulgou o resultado das análises, por isso não é possível afirmar se existe alguma relação entre o óleo e os resíduos sólidos recolhidos com a morte dos animais.

Recuperação da Bacia do Itacorubi

A discussão sobre o cenário de poluição e interferência humana na região do rio Itacorubi já alcançou instâncias maiores. No último mês de outubro, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve uma sentença que determina que órgãos municipais de Florianópolis devem despoluir e recuperar a bacia hidrográfica do Itacorubi. A decisão é relacionada a uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF).

De acordo com o Ministério Público, os danos ambientais ocorridos na bacia influenciariam diretamente as condições do manguezal, por esse motivo, o MPF pediu que o Município de Florianópolis, a Companhia de Melhoramentos da Capital (Comcap), a Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (Casan) e a Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis (Floram) promovam a despoluição do local. 

> Poluição causada por alagamento na Lagoa da Conceição é inquestionável, diz delegada

Segundo determinação da 6ª Vara Federal de Florianópolis, a Casan deve fechar ligações de esgoto com os cursos d’água e atuar com o Município para a despoluição do manguezal, fazendo a atualização do sistema de canalização e drenagem pluvial da região que deságua na bacia. O prazo estabelecido para a implementação das ações foi de 60 dias.

Continua depois da publicidade

Procurada pela reportagem, a superintendência de Saneamento da Secretaria Municipal do Meio-Ambiente afirmou que houve inspeção no local na tarde da última sexta-feira (3) e que o trabalho foi feito junto com equipes da Casan. A superintendência também informou que determinou à Companhia que faça vistoria e limpeza das redes inativas, inclusive no bairro Santa Mônica.  

Leia também  

SC registrou em novembro o menor número de mortes por Covid em 17 meses

Com 9 mortes, Vale do Itajaí tem fim de semana de violência no trânsito e comoção

Temporais devem atingir todas as regiões de SC, alerta Defesa Civil