“A galinha não come o milho de uma vez só, é de grão em grão”. A frase resume bem o espírito de Zenaide Souza, 72 anos, fundadora e proprietária do restaurante Pedacinho do Céu, destruído por um incêndio na praia do Pântano do Sul na madrugada de 16 de janeiro. Exatamente um mês após ver o trabalho de quase 30 anos arder em chamas em poucos minutos, o recomeço é marcado pela ajuda de amigos, familiares, vizinhos e até desconhecidos que se comoveram com o drama de dona Zenaide, sua família e os 20 funcionários que trabalhavam no local.

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Das doações feitas em mãos para a matriarca dos Souza, de itens básicos, porém importantes, como garfos e facas, até os donativos em dinheiro através de uma vaquinha na internet, a solidariedade de muitos já gerou cerca de R$ 18 mil para serem usados na reconstrução do Pedacinho do Céu. Ainda faltam R$ 32 mil para dona Zenaide chegar aos esperados R$ 50 mil, importantes para o restaurante reabrir as portas com a mesma plenitude de antes, mas ainda longe dos estimados R$ 150 mil de prejuízo com as labaredas da madrugada daquela segunda-feira.

— Em dezembro, gastamos R$ 25 mil em uma reforma. Depois veio o incêndio e destruiu tudo. Mas o que mais me deixa feliz é ver como as pessoas ajudaram. Veio doação de tudo que é lugar. De argentinos, portugueses, gaúchos, paulistas, de vizinhos. Mais importante que o dinheiro, são as demonstrações de amor e carinho que recebi. Teve uma catadora de latinha do bairro que comprou um número da rifa só pra nos ajudar — conta dona Zenaide, enquanto é cumprimentada por nativos e turistas que frequentam a praia do sul da Ilha.

Quiosque vai quebrar o galho

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Um quiosque de madeira já está erguido no meio do deck. As madeiras que serão usadas para levantar a cozinha devem chegar nesta quinta-feira às areias do Pântano. Já estão pagas. A expectativa da capitã é de em 15 ou 20 dias abrir o quiosque, e voltar a vender seus pastéis de camarão, bolinhos de siri e bacalhau, além de água, sucos, cerveja e refrigerante.

Com o quiosque aberto daqui uns dias, segue a reforma no restante do restaurante, ainda sem expectativa de conclusão. De qualquer forma, com o quiosque aberto, dona Zenaide já pode voltar a vender seus quitutes e tratar diretamente com a clientela que faz parte de sua história e do Pedacinho. A obra é feita por 11 homens, todos moradores do bairro. Dona Zenaide coordena tudo, fiscaliza, acompanha e palpita. Quer tudo como antes. E já visualiza o novo Pedacinho do Céu.

— Vamos começar tudo de novo, como em 1988, e tudo vai ficar ainda melhor — planeja.

Ação Cultural no Salão do Pântano

A comunidade do Sul da Ilha literalmente abraçou dona Zenaide e o Pedacinho do Céu. Desde um abraço coletivo em volta do restaurante, passando por um chá de bar, até vizinhos — que seriam concorrentes — que reverteram a renda inteira de um dia de trabalho para ajudar a mãe de oito filho e avó de 11 netos.

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Neste fim de semana tem mais. Na sexta e no sábado, a partir das 19h, acontece no Salão do Pântano do Sul, ao lado da igreja do bairro, o “Festival Cultural Pedacinho do Céu! Arte feita em Florianópolis”.

Em prol da reconstrução do Pedacinho, o evento, que custa R$ 10 por dia, terá shows musicais, stand up comedy, poesia, artes plásticas, banca de livros e CDs e gastronomia local. Entre as atrações, o grupo musical Esporão de Bagre e os músicos Cesinha Espíndola, Luiz Meira, Regi Barcelos e banda, entre outros artistas locais.

— A comunidade emprestou o salão para fazermos a festa. Vai ser ótimo. Tem gente que me diz, “mas dona Zenaide, perdestes tantas coisas”. E eu respondo: mas ganhei tantos amigos. E no festival vai ser isso, festa para celebrar a vida, o amor e as amizades — ensina.

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Solidariedade de todos os cantos

Dona Zenaide é a simpatia em pessoa. Viu a reportagem da Hora de longe. Acenou. Nos esperava com um largo sorriso no rosto. Ao chegarmos, foi logo contando tudo sobre a reforma, os detalhes, o que será ali, o que será acolá.

Muitos a procuram para saber a quantas anda o renascimento de um clássico do Pântano. O argentino Paulo Barcena, 51 anos, mora em Buenos Aires e há seis anos veraneia no Pântano. Foi dele a melhor definição da personalidade e estilo de dona Zenaide:

— Ela lembra a minha avó. Ela lembra a avó de todos nós. Estava na Argentina quando o Pedacinho do Céu foi incendiado, um amigo me mostrou a notícia. Choramos eu a minha esposa. Ficamos comovidos. O bom é saber que ela tem força de vontade e vai voltar melhor que antes — torce Paulo.

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