*Por Rory Smith

Assim que sai da estação central de Dortmund, você vê o preto e o amarelo. Decorada com as cores luminosas da equipe, a loja do Borussia Dortmund chama a atenção do outro lado da praça.

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No centro da cidade, os rostos sorridentes parecem sair de todos os cartazes. Nos subúrbios, bandeiras e faixas ficam penduradas nos postes de luz o ano todo. Há pessoas com lenços, outras com bonés e outras com camisetas, seja dia de jogo ou não, unindo tudo com preto e amarelo. Depois de um tempo, começa a parecer menos que Dortmund é uma cidade que tem um time de futebol e mais um time de futebol que de alguma forma gerou uma cidade ao seu redor.

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(Foto: Felix Schmitt / The New York Times)

O futebol é um jogo, claro. Mas também é um esporte, que é o que um jogo se torna quando um número suficiente de pessoas investe nele, financeira ou emocionalmente. E também é um negócio, que é a forma que o esporte assume quando o investimento emocional gera um retorno financeiro. E também é – talvez o mais importante – uma forma de identidade, um sentimento de pertencimento.

Isso é verdade em toda parte, mas é em lugares como Dortmund que se vê isso mais facilmente: uma cidade entregue a um time, onde, nas horas que antecedem cada jogo, todo mundo parece falar do mesmo assunto, caminhar na mesma direção, sonhar com o mesmo resultado.

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(Foto: Felix Schmitt / The New York Times)

O futebol não voltou para Dortmund e para o resto da liga alemã, a Bundesliga. Em vez disso, uma nova forma – uma visão de seu futuro indesejável e inevitável em curto prazo – estreou: acústica, discreta, sem o espetáculo que lhe dá poder. As ruas estavam quietas. Os estádios, protegidos pela polícia e cercados por aço, estavam vazios.

Muitos dos bares e restaurantes autorizados a abrir optaram por permanecer fechados, atentos aos riscos do vírus, com medo das consequências de até pequenas aglomerações. Inúmeros torcedores que poderiam tê-los lotado, tempos atrás, haviam se desligado. Uma pesquisa da rede de televisão alemã ZDF constatou que 62 por cento dos torcedores preferiram cancelar a temporada inteira a exibir uma imitação pálida à sombra de uma pandemia.

Houve bastante interesse, no entanto, pela cobertura da Sky Germany da primeira rodada de jogos – encabeçada pelo clássico entre o Dortmund e seu feroz rival, o Schalke –, que, neste novo mundo sombrio, atraiu seis milhões de espectadores, um recorde, cada um assistindo em casa, atomizado e quase sozinho, uma tribo ainda conectada por suas cores, mas incapaz de se reunir à sua maneira padrão.

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(Foto: Louisa Marie Summer / The New York Times )

Para alguns, o que eles viram não foi futebol, mas um mero negócio, uma transação sem emoção, um evento realizado simplesmente para proteger o faturamento das emissoras. Afinal, o esporte não tem um propósito inerente; nós lhe damos significado, com consequência, e os torcedores nas arquibancadas servem como avatares para os milhões que assistem em casa; suas reações moldam e refletem as nossas.

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A maioria das poderosas torcidas organizadas da Alemanha já havia deixado claro que os jogos disputados de forma isolada, sem torcida, sem o espetáculo, não significam nada. Uma fina faixa na arquibancada do jogo entre o Augsburg e o Wolfsburg dizia: "O futebol sobreviverá. O negócio é que está doente."

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(Foto: Felix Schmitt / The New York Times)

Nesses primeiros minutos de jogo, enquanto os jogadores tentavam se livrar da ferrugem diante da arquibancada cinza e estática em seis cidades, e em mais duas no dia seguinte, era difícil não pensar se isso tinha algum significado. Não foi um espetáculo. Sem o espetáculo, é difícil defender isso como um negócio. Sem o negócio, o esporte – pelo menos em sua forma atual – não pode continuar.

Mas então, com pouco menos de meia hora de jogo, algo aconteceu. Julian Brandt, do Dortmund, lançou a bola para seu companheiro de equipe Thorgan Hazard. Seu cruzamento furou a defesa do Schalke. Erling Haaland deu dois passos, girou o corpo e meteu a bola dentro do gol: o primeiro gol do futuro imediato do futebol.

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(Foto: Emile Ducke / The New York Times )

Naquele momento, foi possível ver além do silêncio, do cinza e da tristeza, sob os negócios e o esporte, que o futebol é apenas um jogo. Mas um ótimo jogo.

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