Ele acorda às 6h, faz ginástica todos os dias em sua bicicleta ergométrica e toma café da manhã com frutas, iogurte e mel. Durante o ano, fica fora de casa, por lugares diferentes do Brasil, durante três meses e meio. Walter Orthmann gosta mais de viajar do que ficar no escritório, trabalha oito horas diariamente, não tira férias desde o ano 2000 e nunca se estressa no trabalho.

Continua depois da publicidade

Caro leitor, você pode estar pensando que ele é mais novo do que você, mas não, ele apenas é mais ativo. Na verdade, ele tem 90 anos de idade, oito filhos, e acredita ter encontrado no trabalho a fonte da juventude. Na quinta-feira, Orthmann completou 75 anos de carreira na mesma empresa, a RenauxView, pioneira do setor têxtil na região de Brusque.

Para ele, o trabalho como gerente de vendas confunde-se com a própria vida. Tanto que nem uma proposta de Luciano Hang, o rei do império Havan, solidificado também em Brusque, pelo dobro do seu salário, no final da década de 1980, convenceu Orthmann a abandonar o lugar onde nasceu, como ele próprio define, quando fala da empresa. A seguir, conheça os ensinamentos dele:

RECONHECIMENTO

Acho válido, porque é difícil alguém mais conseguir o que alcancei. Talvez hoje eu já seja o maior funcionário do mundo. Na verdade, ninguém sabe quem seria esse funcionário, então estamos pesquisando. A Rank Brasil me ligou hoje (ontem) de Curitiba dizendo que também vai buscar esse dado. Isso para alcançarmos o ranking mundial. Dificilmente alguém de 90 anos, como eu, trabalha. E eu estou fazendo minhas viagens tranquilamente.

Continua depois da publicidade

ROTINA DE VIAGENS

Durante três meses e meio do ano, talvez, estou viajando. Geralmente fico três semanas no Nordeste, depois eu volto, fico mais uma semana em São Paulo. Na segunda-feira, vou para São Paulo, depois volto. Na outra semana, vou para o Rio… e volto. Fico (em Brusque) três ou quatro semanas depois do Carnaval, aí vou para o Nordeste, fico três semanas lá… É assim.

ATIVIDADE ATUAL

Eu sou gerente de vendas, supervisor da área do Nordeste. E ainda faço a parte de São Paulo e Rio. Lá, eu tenho clientes que conheço há 50 anos. Então esses ficam para que eu atenda. Porque eles são acostumados e fazem questão. Eles não querem nem que outro vá visitá-los. Eu sempre atendi muito bem.

EXPOSIÇÃO NA MÍDIA

Essa é a vantagem que você tem hoje. Primeiro, eu gosto sim. Porque aos 50 anos eu já fiz uma festa. Aos 55, outra. Aos 60, outra. Aos 65 outra… aos 70 foi a grande festa que a TV Globo passou no Fantástico. Não sei se você viu, mas dá para ver ainda. Pode ver… está no YouTube.

PESQUISA NA INTERNET

Pesquiso na internet sim. Mas não gosto muito. Toda a minha atividade está aqui dentro (mostrando um caderno). Todo ano, eu tenho um caderno diferente, com todos os clientes, tudo marcadinho, e tenho tudo na hora. É muito prático, né? Eu tenho o cliente e sei quanto ele pagou, quanto custou, quanto ele recebeu… tá tudo em pé. Quando surge um novo cliente eu já anoto. Tudo está anotado. Esses clientes todos eu conheço. Faço contato com o representante de Fortaleza, o Renato, por exemplo, e a cada dois meses e pouco eu estou lá.

Continua depois da publicidade

CANSAÇO DE VIAJAR

É gostoso. Quando você gosta de fazer alguma coisa, é muito bonito. Conheço a família dona dos hotéis. Eu não mudo o hotel. Todo mundo me conhece. Hoje eu já estou trabalhando com a terceira geração de clientes. Pai, filho e, agora, o neto. Eu gosto mais de viajar do que ficar aqui. Estou acostumado. Minha esposa já está acostumada também.

FAMÍLIA

Minha primeira esposa faleceu aos 55 anos. Ela teve um derrame e, aos 58 (anos de idade) eu casei com uma menina bem nova, tinha 27 anos só. Hoje nós vivemos muito bem. Hoje ela está com 59, e eu com 90. E é tranquilo. Ela entende as viagens, faz questão de verificar se está tudo bem, e ela cuida de casa. Eu tenho um filho de 19 anos, que está fazendo faculdade e estágio aqui na empresa (RenauxView). Tenho filha que é atriz, que mora em São Paulo, com 27 anos. Ela é atriz de teatro, mas de vez em quando pega papeis na televisão. Ela é modelo e agora está começando a atuar. Tem 1,80 (metro de altura).

INÍCIO NA EMPRESA

Era um tipo de trabalho, totalmente manual. Totalmente difícil. Porque não existia tanto maquinário. Eu comecei como um simples funcionário de expedição, que enrola o tecido. Depois, vim para o escritório como office boy, pegava dinheiro vivo. Entrei quando a empresa tinha 13 anos. Eu sou o funcionário número 130. Entraram bilhões de funcionários depois. E depois fui para o faturamento e, logo em seguida, como gerente de vendas. Isso foi em 1955. Naquele ano, eu ia para São Paulo e Rio de ônibus, porque não tinha avião.

CRESCIMENTO DA EMPRESA

O mérito foi modernizar a fábrica. Porque o tear, antigamente, fazia. Aqui em Brusque ela é pioneira, porque o velho cônsul (Carlos Renaux) veio da Alemanha para cá e criou a feira da tecelagem aqui. Nem máquina de calcular tinha na época. Era tudo feito à mão. Daquele início da empresa, ainda uso muito a máquina de escrever. Mas também entrou no YouTube.

Continua depois da publicidade

STRESS NO TRABALHO

Eu não posso dizer, porque cada pessoa é diferente. Mas eu sempre trabalhei com vontade. A pessoa tem que ter muita vontade, né? Nada tem que ser feito por obrigação. Tem que fazer com liberdade, com prazer. Aí sim o serviço rende. Se você não faz com prazer, você não resolve nada.

DIFICULDADE E VONTADE DE SAIR

Nunca pensei em sair. Nunca E agora, depois de 75 anos… eu ontem mesmo falei: vou continuar até quando minha saúde me ajudar. Minha esposa falou também, como passou na TV Globo, que quer que eu trabalhe… nem se ela tiver que me trazer de carro, mas ela quer que eu trabalhe. Trabalho é saúde. Todos os meus amigos e colegas que se aposentaram cedo, não tem mais ninguém vivo. Eu tenho 35 anos de aposentadoria. Desde 1978, e não gosto de ficar em casa. É muito gostoso (trabalhar). Eu fico satisfeito de conseguir trabalhar ainda.

TRABALHO É SAÚDE

O trabalho melhora a saúde porque você não fica parado. Você caminha, você mexe… a cabeça está sempre atenta para qualquer coisa, sempre funcionando. Eu chego em casa, eu tenho minha bicicleta, eu mexo nela. À noite, vou jogar baralho com os meus amigos. Ando de bicicleta para fazer ginástica, para movimentar as pernas, deitado. Isso eu faço todo dia. E à noite, vou jogar baralho no clube com os amigos, passar o tempo, para me divertir. Cuidar da alimentação é muito importante. Não bebo, não fumo, nunca fumei na vida. Saber perdoar é muito gostoso. Sempre estar disposto a tudo, não se incomodar. O que acontecer, aconteceu.

SABER PERDOAR

Tem muito isso de perdoar no trabalho. Você tem que saber rever as coisas. Não estar só com má vontade. Se não dá para fazer, tem que deixar, não adianta quebrar a cabeça.

Continua depois da publicidade

CONVITE PARA SAIR

Tive muitas propostas. Já recebi da Havan. Quando ele começou (apontando em direção à Havan da cidade, que fica perto), mais tarde, ele disse: ‘Ó, eu te pago o dobro. Quanto tu ganha? Quer vir trabalhar comigo?’ Eu respondi que não, que estava satisfeito onde estava. Eu disse: ‘Eu sei o que eu faço aqui, é o que eu gosto de fazer. De aprender aqui as coisas, e isso aqui eu não vou abandonar’.

SEM DÚVIDAS

Nem conversa. Não queria nem um pouco sair. Porque, para mim, eu nasci aqui (na empresa). Essa é a minha vida. Uma empresa que eu gosto de viver, gosto de trabalhar, sou bem atendido, todo o pessoal me conhece. Nas minhas visitas aos meus clientes, todo mundo me conhece, por causa do tanto de tempo que viajo. O trabalho é minha vida. Teve um colega meu que saiu para um outra (empresa) que fechou. E agora? Fechou, tá sem emprego.

Presidente da RenauxView, Armando Hess de Souza,

deu uma placa para seu funcionário mais antigo na quinta

Foto: Paula Leitão, Prefeitura de Brusque, Divulgação

CHEFES

No começo, os diretores eram alemães, e eu falava só alemão. Estou no décimo-segundo diretor. Com todos eles, eu me dei bem. Quem trabalha, quem faz as coisas certas, é sempre bem visto. O patrão gosta de você, ele sabe que você trabalha para a empresa. Isso é importante hoje: fazer bem para a empresa. Então você é reconhecido. Isso acontece aqui também. Cada pessoa tem que trabalhar para a empresa, e com vontade, porque aí ele é reconhecido. Se não já, mas aos poucos ele vai chegando lá. Ele tem que trabalhar com seriedade, honestidade.

MELHOR MOMENTO

Sempre foi bom. Sabendo lidar com o trabalho, sempre é bom, não tem momento ruim.

HORÁRIO DE TRABALHO

Aqui na fábrica, eu trabalho oito horas. E quando viajo, não tenho horário. Viajo de madrugada… clientes só atendem depois das 9h… e, daí, fico até as 21h. Não dá para contar (as horas). Eu tenho que topar tudo. Se não, não dá para fazer esse tipo de trabalho. Quando você viaja, essas horas têm que render.

Continua depois da publicidade

RELAÇÃO DE TRABALHO

Em cada estado, tem um representante. E a relação com eles é muito boa. Tem que ser boa. Muitos eu escolhi para trabalhar comigo. Os jovens têm muito respeito comigo. É preciso, porque eles só podem aprender.

DETALHISTA

Antigamente, eu chegava das viagens e dizia: ‘Eu quero fazer um tecido xadrez. Quero quatros fios verde, quatro brancos, três azuis… cada cor, e eu dizia o que queria fabricar. Eu tinha a cartela de cores e escolhia quantos fios, preparava um ficha para o tecelão. Foi naquela época que comecei como gerente de vendas, então eu trazia as novidades. Hoje, eu preciso conhecer bem os tecidos. Eu tenho aqui um contador de fios. E você precisa saber quantos fios têm um tecido. Você olha aqui dentro e você vê quantos fios têm. Isso tudo tem que saber, é assim que se faz o pano. Não é fácil fazer tecido.

FÉRIAS

De 2000 em diante, eu não tirei mais férias. Eu tenho mais de 100 dias de férias para tirar, mas eu já perdi (o direito). Agora eles me obrigam a tirar 20 dias de férias, e é a pior coisa para mim. Eu tive férias agora (há pouco), e fiquei doente. Me dói aqui, me dói lá… Eu não estou acostumado. Eu estou acostumado a levantar cedo. De férias, 8h30min eu ainda estava na cama. Daí eu não faço nada. Antes eu não tirava férias porque não dava tempo. Eu fazia tudo sozinho. Não era como hoje, quando tudo está organizado.

RECEITA

Eu levanto às 6h, tomo banho, e tomo café muito bem: com duas laranjas lima, um pedaço de mamão, iogurte com pozinho de linhaça. Depois, uma fatia de pão de centeio, com mel. Café não. Só leite, e um pinguinho de café, mas sem açúcar. Nunca tome açúcar. Ele é o maior veneno que tem. Também não tomo refrigerante. Só uma taça de vinho ou uma lata de cerveja no final de semana.

Continua depois da publicidade

Linha do tempo profissional

Homem de uma única empresa, conheça a trajetória de Walter Orthmann na RenauxView:

1938 – Entrou na RenauxView aos 15 anos como funcionário de expedição, enrolando os tecidos da empresa. Orthmann foi o funcionário número 130 da companhia.

1939 – Mudou de função, chegando ao escritório como office boy.

– Na época, nem cheque existia. Fazia os pagamentos em dinheiro vivo – conta Orthmann.

1939 – Foi parar na área de faturamento. Como o telefone da época atrapalhava algumas transações, ele começou a viajar para encontrar os clientes, ensaiando a mudança para área de vendas.

1955 – Conquistou o cargo de gerente de vendas, que ocupa até hoje, sem pretensões de sair. Na primeira viagem, vendeu o equivalente a um mês de faturamento em vendas da RenauxView.

1978 – Ele se aposenta, mas sem deixar de trabalhar. Desde o ano 2000

não tirava férias, mas, recentemente, saiu por 20 dias. Mas Orthmann diz que preferia

ter seguido trabalhando.