*Por Susan Gubar
O cacho de bananas reluzia sobre o balcão. "Coma-me, beba-me, consuma meu sumo", elas provocavam, como a fruta tentadora de "Goblin Market", o poema erótico de Christina Rossetti. Fiquei desconcertada, pois detesto a textura gosmenta das bananas. (Desculpe, Chiquita!) Mas de que outra maneira eu poderia consumir todo o magnésio de que preciso para poder continuar no ensaio clínico de um novo tratamento contra o câncer?
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Há alguns anos, tive de passar por uma série de longas infusões porque a quimioterapia resultou em deficiências minerais. Agora, parecia que o medicamento experimental que estou tomando fazia o magnésio escorrer pelos meus poros. Embora eu tomasse uma pílula com 500 miligramas de magnésio todas as noites, em meu exame de sangue mais recente os níveis estavam tão baixos que a enfermeira que me acompanha, Alesha, entrou em pânico. Depois de insistir que eu voltasse a fazer o exame em um mês, ela recomendou que eu comesse espinafre, amêndoas, feijão-preto, abacate e couve-de-bruxelas.
"Alesha, você é meu anjo da guarda, mas não se esqueça da ileostomia!", eu disse. Com um sistema digestivo comprometido, é impossível comer quantidades suficientes dos alimentos que ela listou sem sofrer com terríveis bloqueios intestinais.
"Ah, é claro. Talvez manteiga de amendoim… ou banana!", ela sugeriu.
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A banana, perfeitamente protegida por seu casaco amarelo, é uma fonte de sustento portátil – para quem gosta. Estava pensando se ela perderia as vitaminas e minerais se eu fizesse um pão de banana, quando recebi um e-mail da minha amiga Nancy K. Miller. Paciente oncológica, ela descobriu que havia um nódulo crescendo em seu pulmão. Suas opções são cirurgia, radiação ou ablação, e tudo isso é muito pior que comer uma banana.
"Não é que eu não soubesse que o câncer se espalharia, mas você já pensou que um dia o medicamento que você está tomando pode parar de funcionar?", escreveu Nancy.
"É claro. Meu medicamento vai parar de funcionar ou vai me dar outro tipo de câncer, como leucemia", respondi em seguida, depois de tomar uma taça de vinho tinto.
"Como vivemos desse jeito?", respondeu Nancy.
"A alternativa é bem pior", retruquei.
No dia seguinte, quando as bananas começavam a ficar passadas, tive uma ideia. Pesquisei "álcool e magnésio" no Google e descobri que o vinho expulsa minerais do corpo. O culpado por minha deficiência de magnésio talvez seja o pinot noir, não o medicamento experimental. O sedutor "coma-me, beba-me, consuma meu sumo" repetido pelas uvas fermentadas já havia causado problemas no passado e poderia trazer consequências ainda piores no futuro. Por que sucumbi a elas mais uma vez?
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O estresse de "viver desse jeito" – com a espada de Dâmocles constantemente sobre minha cabeça – talvez tenha contribuído para que eu bebesse cada vez mais. Depois de ser obrigada a abandonar a sala de aula e de abrir mão de um corpo saudável, da vitalidade física, do cabelo e de uma sensação de futuro seguro, será que eu estava me anestesiando com doses cada vez maiores de vinho? Estarei mitigando minha situação sombria com a leveza dos primeiros goles e o esquecimento das últimas taças?
Esse efeito colateral do tratamento prolongado não apareceu em minhas leituras sobre o assunto, provavelmente porque geralmente não se fala dos problemas com a bebida. Pela mesma razão, médicos e enfermeiras podem não suspeitar do que está realmente acontecendo. Entretanto, a dependência do álcool representa um enorme perigo.
Conviver diariamente com uma doença crônica é uma chatice; conviver todas as noites com uma doença crônica pode ser extremamente deprimente… sem o torpor do álcool. Naquele momento, a ideia de abrir mão do consolo de ficar de porre parecia insuportável. Eu estava bebendo mais nos últimos tempos, mas o álcool fazia parte da minha vida desde muito antes do diagnóstico.
Ainda assim, e se o consumo excessivo de vinho estivesse atrapalhando minha capacidade de reter magnésio, a despeito de quantas vitaminas de banana eu fizesse? As bananas já estavam tão estragadas quanto meu humor, quando concluí que deveria conversar com meu marido, Don, sobre o problema.
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"O magnésio é uma ótima razão para você limitar o consumo de bebida. Não é uma questão moral, mas física. Mas não tente parar tudo de uma vez", ele me disse.
É uma bênção ser aceita, mesmo com meus defeitos, por um companheiro que me ama! A abstinência seria um tombo pior que o causado por qualquer casca de banana. "Que tal tomar uma tacinha ou duas durante o jantar?", sugeriu Don, e riu, contando que no século XVIII era comum beberem duas garrafas por dia, embora provavelmente se tratasse de vinho do porto diluído.
Duas taças de vinho por noite é o dobro da recomendação diária para mulheres; entretanto, seria uma grande redução para mim. Até o próximo exame de sangue, decidi que não comeria banana, mas diminuiria o consumo de vinho… para tentar elevar os níveis de magnésio em meu corpo.
Quando Nancy me enviou outro e-mail, morri de rir da imagem que veio em anexo. Ela encontrara um desenho que havia feito de um médico idoso que alertava seu paciente: "Pense na alternativa." A figura fez com que ela se lembrasse do misógino professor Von X, em "Um Teto Todo Seu", de Virginia Woolf.
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Nem Nancy nem eu seguiríamos as ordens de autoridades paternalistas nos obrigando a fazer tudo o que fosse necessário para vencer a chamada batalha contra o câncer. Certamente chegaremos ao ponto em que consideraremos a morte como alternativa e deixaremos de aceitar intervenções médicas. Mas esse momento ainda não chegou. E, de qualquer maneira, ninguém me forçou a limitar o consumo de álcool. A ideia partiu de mim.
Enquanto observava o desenho, me senti tomada de amor por meu marido e também por Nancy, que nunca abre mão de sua perspectiva irônica e de seus valores peculiares ao lidar com a doença. Ao pensar nela, me lembrei das palavras de Christina Rossetti sobre dependência e intoxicação: "Não existe amiga melhor que uma irmã / Na calmaria ou na tempestade; / Animar quem se entedia, / Buscar quem se perde, / Levantar quem cai, / Fortalecer quem para".
Embora eu não esteja muito feliz com o que vem pela frente, espero sinceramente não ter de comer bananas.
(Susan Gubar, que convive com o câncer de ovário desde 2008, é professora emérita de inglês na Universidade de Indiana. Seu livro mais recente se chama "Late-Life Love".)
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