A presença de alunos com mais de 40 anos em cursos de graduação é uma realidade em todo o país. Na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), estudantes nesta faixa etária somam mais de 1,8 mil e mostram que idade não é empecilho para nada.
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Conforme explica o historiador Rodrigo Rosa, até o final dos anos 1990, as instituições de ensino superior eram de difícil acesso e direcionadas apenas para grupos de elite. Já nos anos 2000, o acesso se tornou mais democrático e isso, consequentemente, possibilitou a entrada de pessoas de baixa renda e com idade mais avançada na universidade.
— Temos toda uma construção social, formando preconceitos e discriminações. Temos isso contra as mulheres, orientações sexuais, religiões. E isso sempre atende a determinados interesses, geralmente socioeconômicos, então no ambiente educacional a gente tenta fazer com que as pessoas reflitam sobre tudo isso para que possamos lutar contra — complementa a professora da UFSC, Sidneya Gaya.
Em Santa Catarina, o público maior de 40 anos ainda é minoria. Os 1,8 mil estudantes da UFSC representam cerca de 6% do total. Desses, ainda, apenas 670 são maiores de 50 anos e cerca de 200 possuem mais de 60.
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Nestes grupos, as mulheres predominam a escolha pela universidade após os 40 anos no Estado. São 933 mulheres, 25 delas acima dos 65 anos — grupo com maior número de homens (44).
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O assunto sobre pessoas mais velhas na universidade tomou conta da internet nas últimas semanas depois que uma mulher, de 44 anos, foi alvo de deboche nas redes sociais por começar a cursar a primeira faculdade em São Paulo. Em vídeo, uma estudante jovem aparece perguntando como “desmatricula” a colega de sala que já era para estar aposentada. O caso, que foi chamado de etarismo, repercutiu nas redes sociais.
A história de Denise Becker foi similar quando entrou na universidade, aos 44 anos. Para cuidar da família e apoiar a carreira do marido, ela deixou o sonho de ter um curso superior em segundo plano e, em 2015, escolheu fazer Jornalismo. Foi quando se deparou com o julgamento e questionamentos do espaço ao qual estava ocupando.
— Me sentia insegura e sem vontade de continuar. Eu me sentia julgada o tempo todo, mas eu escolhi não parar. Hoje faço doutorado na UFSC e a minha idade atual é 51 anos. Vez ou outra a gente ainda percebe alguns olhares, mas sigo fazendo perguntas e não entendendo de “rolês”, porque afinal, eu ocupo o espaço que eu quero independente da idade — diz.
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Estudante de geografia da UFSC, Paulo Roberto conta que não sentiu nenhuma forma de preconceito ao entrar na universidade aos 43 anos. A chegada no curso superior depois dos 40 anos se deu porque ele precisou trabalhar desde cedo devido às condições de vida da família. Mesmo assim, e tendo passado por disciplinas em todos os turnos, sente que não houve preconceito.
— Muito pelo contrário, eu tenho mais dificuldade de mexer com a tecnologia e todos os estudantes sempre foram solícitos em me ajudar. Para ser sincero, eu que senti vergonha de estar entrando na universidade aos 40 anos, porque a sociedade cobra que quando você atinge uma certa idade, precisa estar com a vida mais estabilizada. Mas no meu caso, a vida não seguiu uma linha reta, muitas coisas aconteceram e impediram eu realizar isso — conta.
A colega de Roberto, Elelina Soares Silvestre faz Geografia aos 65 anos. Na terceira graduação, todas feitas após os 30 anos, a catarinense conta que em nenhum momento se sentiu discriminada.
— Tenho visto muita gente mais velha e acho que todo mundo se sente acolhido em ver os iguais ali — diz.
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Conforme contam ambos, a valorização da juventude na sociedade é muito evidente, o que transforma o ambiente frequentado com mais desafios, independente da área.
— Os mais velhos são descartáveis e costumam ser vistos, muitas vezes, como estorvo. Por isso, pode ser que eu enfrente muitas dificuldades quando eu me formar, por exemplo, mas a experiência de vida vai me contribuir muito, então vale a pena — diz Roberto.
O aumento no número de pessoas acima de 40 anos deve ser algo comum nos próximos anos, conforme explica a professora Sidneya Gaya.
— É muito rico ter pessoas de diversas faixas etárias e grupos sociais. Todas as formas de discriminação estão sendo combatidas pelas próprias políticas afirmativas e pelos processos educacionais — diz.
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O que é etarismo
Etarismo é a discriminação e preconceito relacionados à idade de uma pessoa, seja ela mais velha ou mais nova. Os mais velhos, no entanto, estão mais sujeitos à discriminação etária por associações a estereótipos de atraso que acabam fomentando uma sociedade mais tolerante à violência contra idosos.
— Se eu acho que o velho é frágil, que o velho é ignorante que não acompanha uma entrevista na internet ou que não sabe usar o Google, esse preconceito vai combinar lá na frente com a violência — explicou a assistente social Naira Dutra Lemos ao g1, na última semana.
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