Pela primeira vez, em 30 anos, haverá atraso no pagamento de salário dos servidores da Prefeitura de Joinville. Sem dinheiro para honrar a conta integralmente em 7 de janeiro, o prefeito Udo Döhler (PMDB) anunciou que irá parcelar o vencimento. Serão 40% na segunda-feira e outros 60% na quinta-feira da semana que vem.
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A folha dos 11.020 funcionários públicos consome R$ 25,5 milhões mensais. A informação de que não há dinheiro em caixa para garantir o pagamento dos servidores foi levada ao prefeito Udo Döhler pelo secretário Nelson Corona na noite de quarta-feira.
O grupo que participou da transição desconfiava dos problemas financeiros, até porque viu a dificuldade da gestão anterior em pagar o 13º (não houve o provisionamento mensal e a conta teve de ser bancada de última hora).
Apesar de saber que enfrentaria dificuldades com o caixa, o novo governo não imaginava que não teria dinheiro suficiente para pagar a folha dia 7 de janeiro. Em 27 de dezembro, em uma conversa informal, o então secretário Fábio Marcelo da Silva (Fazenda) teria dito ao sucessor Nelson Corona que poderia haver dificuldades com o pagamento dos salários.
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A informação é de que o caso não foi informado pelo agora ex-prefeito Carlito Merss (PT). Na época que recebeu a informação extraoficialmente, o núcleo duro do governo decidiu que analisaria o assunto dia 2 de janeiro, até porque não tinha muito o que fazer no meio do recesso e sem acesso às contas.
– Não tínhamos essa informação (da falta de dinheiro em caixa): se tivéssemos, na transição mesmo teríamos conversado com nosso antecessor (Carlito Merss) – fala o prefeito, que também nega o alerta feito a Nelson Corona.
A decisão de parcelar o pagamento dos servidores foi tomada na tarde de quinta-feira, em reunião a portas fechadas no gabinete do prefeito. Participaram da conversa os secretários Nelson Corona (Fazenda), Bráulio Barbosa (Gabinete), Miguel Bertolini (Administração) e o procurador Luiz Gubert.
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O grupo discutiu a possibilidade de realizar algum tipo de negociação bancária para levantar o dinheiro, o que foi descartado devido a questões legais – também não haveria tempo para levantar a quantia até 7 de janeiro. Para garantir os 40% do salário na segunda-feira (são R$ 10,2 milhões), o prefeito suspendeu outros pagamentos. Os fornecedores não receberão nada até que a folha seja colocada em dia.
A aposta é que a parcela seguinte (R$ 15,3 milhões) seja paga com o dinheiro do IPTU (a conta única, com 15% de desconto, vence dia 8 de janeiro). Com o restante da arrecadação – a maior parcela do ICMS entra na conta do município sempre no dia 20 de cada mês -, a administração municipal garante que terá recursos para normalizar o pagamento dos salários em fevereiro. ?????
“Faltou provisionamento para o pagamento dos salários de dezembro” ?
A Notícia – Há dificuldade para o pagamento dos salários?
Udo Döhler – Não se trata de uma dificuldade: faltou provisionamento para o pagamento dos salários de dezembro. E não compete a nós explicar. Isso (o provisionamento para o pagamento) teria de ser feito pela gestão anterior. Nós só soubemos (do problema) na quarta-feira à noite. Durante a quinta-feira, buscamos a melhor solução para o problema. Determinamos que a Prefeitura não honrará nenhum outro compromisso antes de resolver a questão do salário.
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AN – Quando o senhor fala em não honrar compromissos, o senhor está falando no pagamento de fornecedores?
Udo – Estou falando no pagamento de qualquer coisa. Sustamos todos os pagamentos para reservar todos os recursos para a folha. Com recursos desse governo, estou saldando um compromisso do governo anterior. E o melhor que se pode fazer agora é pagar 40% do salário naquela data agendada e os outros 60% no dia 10 (de janeiro).
AN – E por que dividir o pagamento?
Udo – Podíamos ter pago tudo no dia 10 (de janeiro), mas sabemos que o servidor já estava programado para receber o salário no dia 7. Então, raspamos todos os centavos disponíveis para que o servidor não fique sem dinheiro algum no dia 7. Os compromissos emergenciais, o servidor vai poder honrar no dia 7. O restante, será pago no dia 10.
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AN – É inviável realizar um empréstimo ou qualquer outro tipo de transação bancária para pagar o salário integralmente?
Udo – Não há como fazer em tão curto tempo. E se fizéssemos seria ao arrepio da lei. Poderíamos buscar recursos em outra fonte, mas também seria ao arrepio da lei. Teríamos problemas com o Tribunal de Contas. E temos muito cuidado e respeito com as leis.
AN – Durante a transição, não se identificou esse problema de caixa, essa falta de provisionamento?
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Udo – Não. Se tivéssemos essa informação, na transição mesmo já teríamos conversado com o nosso antecessor para buscar soluções. Não encontrando, teríamos anunciado uma nota conjunta avisando que não pagaríamos o salário. Então estaríamos admitindo com grande antecedência: olha, não vai dar para pagar dia 7, vamos pagar dia 10.
AN – O que deu errado na transição?
Udo – Faltou informação. Não tínhamos essa informação.
AN – Entre essa quarta e sexta-feira, o senhor falou com Carlito Merss sobre a situação, pediu algum tipo de explicação?
Udo – Não. Agora, a responsabilidade é minha e tenho de resolver os problemas daqui para frente. O que passou, passou. Não vou perder tempo discutindo o passado.
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AN – Mas é complicado assumir o governo nessas condições…
Udo – É. Mas essas encrencas estão aí e precisam ser resolvidas.
Recursos foram usados para pagar fornecedores e 13º
Último secretário da Fazenda no governo Carlito Merss (PT), Fábio Marcelo da Silva explica que em toda a virada de ano há dificuldades financeiras por causa do pagamento de fornecedores, 13º salário dos funcionários e abono de Natal. Só com fornecedores, foram gastos mais de R$ 3 milhões em dezembro, lembra Fábio.
Segundo o ex-secretário, nos últimos anos, para contornar a situação e não atrasar os salários dos servidores, a Prefeitura fazia uma operação financeira chamada Crédito Direto ao Fornecedor (CDF), onde o credor ia até o banco, pegava dinheiro emprestado e dava como garantia notas de empenho de que iria receber da Prefeitura em janeiro.
Outra ação feita no governo Carlito foi antecipar o IPTU para janeiro (antes de 2009, o vencimento era março). Com isso, a Prefeitura sempre contava com dinheiro em caixa no primeiro mês do ano para cumprir com as obrigações, complementa Fábio.
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– Não pudemos fazer o CDF porque é ilegal deixar restos a pagar para próxima gestão, mas Udo poderá fazer isso nos próximos anos, se precisar – sugere.
Quando Carlito assumiu a Prefeitura, os salários de dezembro já haviam sido pagos pela gestão Tebaldi porque em dezembro de 2008 a administração recebeu R$ 22 milhões da venda das contas dos servidores para o Banco do Brasil.
Esse dinheiro ajudou no pagamento da folha. Outra observação que o ex-secretário de Carlito faz é que a folha de pagamento daquela época não tinha o impacto que tem agora.
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– Em 2009 passou a vigorar o plano de cargos e salários, o que elevou bastante a folha – finaliza. Carlito foi procurado durante a tarde desta sexta-feira, mas não retornou às ligações. ?
Sindicato critica e convoca assembleia
Em nota à imprensa, o Sindicato dos Servidores Públicos de Joinville (Sinsej) disse estranhar a falta de dinheiro para fazer os pagamentos.
– Desde novembro havia uma equipe de transição da nova gestão da Prefeitura. Ela teve acesso aos dados de todos os setores do município. O seu papel era garantir o normal funcionamento da Prefeitura e impedir que esse tipo de problema acontecesse – diz a nota.
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O presidente do Sinsej, Ulrich Beathalter, emenda dizendo que “alguém errou feio” na transição ao não ter cuidado desse assunto antes. A nota informa, ainda, que a falta de dinheiro também foi desculpa para cortar vários benefícios na última gestão, mas nunca afetou os salários dos servidores.
O Sinsej considera o atraso de salários muito grave e, por isso, marcou uma assembleia para quarta-feira (9/1), às 19 horas, na sede do sindicato, para conversar com a categoria.
– É algo novo que está acontecendo. Vamos conversar, esclarecer até porque muita gente está de férias e não está entendendo a situação – fala Ulrich, que também pretende falar com a Prefeitura para que isso nunca mais se repita.
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O presidente do sindicato disse, ainda, que a categoria vai ficar atenta e mobilizada. O Sinsej reforça que o salário dos funcionários precisa ser prioridade de qualquer administração e, de acordo com a legislação, deve ser depositado no 5º dia útil do mês (contando o sábado).
– Atrasar o pagamento significa descumprir o acordo de trabalho entre a Prefeitura e os servidores, que desempenharam suas funções durante todo o mês de dezembro.