O Parlamento ucraniano decidiu neste sábado que uma eleição presidencial vai ser realizada antecipadamente, destituindo o presidente Viktor Yanukovytch, e liberou da prisão a opositora Yulia Timochenko, recebida como heroína em Kiev.
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O Parlamento votou neste sábado pela “liberação imediata” de Timochenko. Ela deixou um hospital onde estava internada sob custódia em Kharkiv (leste) e foi direto para a capital ucraniana para se juntar aos manifestantes na Praça da Independência.
A ex-primeira-ministra, musa da Revolução Laranja de 2004, estava em uma cadeira de rodas, enfraquecida por problemas nas costas, e usava sua inconfundível trança. Ela era mantida em detenção desde 2011 por abuso de poder.
Visivelmente emocionada, Timochenko saudou os “heróis da Ucrânia”, diante de cerca de 50.000 pessoas reunidas na Praça da Independência.
“Vocês são heróis, vocês são os melhores da Ucrânia!”, disse.
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A multidão gritava “Yulia, Yulia, Yulia”.
“Eu não reconheci Kiev, com os carros queimados, as barricadas, mas é uma outra Ucrânia, a Ucrânia dos homens livres”, afirmou a líder oposicionista, algumas horas depois da destituição do presidente Viktor Yanukovytch pelo Parlamento.
Uma grande imagem de Yulia Timochenko era exibida no centro da Praça da Independência, ocupada há três meses por manifestantes hostis ao presidente Yanukovytch.
“Se alguém disser a vocês que acabou e para voltarem as suas casas, não acreditem em uma palavra. Vocês devem terminar o trabalho”, pediu.
“Se aqueles que mataram e aqueles que deram as ordens não forem punidos com o maior rigor, será uma vergonha eterna”, acrescentou Timochenko.
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Antes de sua chegada, padres celebraram uma missa para uma das vítimas da violência do início da semana.
Muitas pessoas ligaram seus telefones celulares, enquanto outras acenderam isqueiros e tochas. Depois da cerimônia improvisada, todos cantaram o hino nacional.
“Nós viemos por Yulia, sempre votamos nela. As outras lideranças da oposição podem ser seus assessores, mas é ela a verdadeira chefe”, afirmou Victoria, uma dona de casa.
“A ditadura caiu”, havia proclamado Timochenko no site de seu partido.
Mais cedo, depois de terem decidido pela libertação de Yulia, os deputados confirmaram que o poder está vago.
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“O presidente Yanukovytch deixou seu posto e não cumpriu mais suas funções”, indicou a resolução adotada pelos deputados, que marcaram para o dia 25 de maio a data de uma eleição presidencial antecipada.
Em Kharkiv (leste), Viktor Yanukovitch, que teoricamente deve governar até março de 2015, garantiu que não tinha intenção alguma de deixar o poder.
“O país assiste a um golpe de Estado (…). Eu sou um presidente eleito legitimamente”, ressaltou.
Mas o presidente do Parlamento, Olexandre Turtchinov, disse que Yanukovytch chegou a tentar fugir para a Rússia e foi impedido pela Polícia de Fronteiras.
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Os Estados Unidos saudaram neste sábado a liberação de Yulia Timochenko e afirmaram que o país deve “decidir seu próprio futuro”.
“Nós a desejamos uma rápida recuperação enquanto busca o tratamento médico adequado, de que tanto precisa”, indicou a Casa Branca em um comunicado, acrescentando: “O princípio inquebrantável que deve guiar os acontecimentos é o de que o povo da Ucrânia deve decidir seu próprio futuro”.
A Casa Branca indicou em seu comunicado que tem defendido permanentemente “uma redução da violência, uma mudança constitucional, um governo de coalizão e eleições antecipadas”.
“Os acontecimentos de hoje nos aproximam dessas metas”, acrescentou.
Washington concluiu: “Trabalharemos com nossos aliados, com a Rússia e com as organizações europeias e internacionais adequadas para apoiar uma Ucrânia forte, próspera, unida e democrática”.
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O governo russo manifestou seu apoio ao presidente ucraniano, ressaltando que “a oposição não cumpriu suas obrigações” e denunciando “os extremistas armados e os atos que constituem uma ameaça direta à soberania da Ucrânia”.
Enquanto o acordo que foi adotado na sexta-feira previa um determinado número de medidas emergenciais a serem seguidas pelo governo, Viktor Yanukovytch afirmava que “não tinha nada a assinar com os bandidos que aterrorizam o país”.
“Não há golpe de Estado em Kiev. Os prédios oficiais estão abandonados. O presidente do Parlamento foi legitimamente eleito”, reagiu no Twitter o ministro polonês das Relações Exteriores, Radoslaw Sikorski, que participou das negociações entre oposição e governo.
A Polícia esvaziou o bairro que abriga os prédios do governo na capital, deixando a área sob controle dos oposicionistas.
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Já o Exército indicou em um comunicado que não vai “se envolver no conflito político”.
As deserções se multiplicaram neste sábado no campo do chefe de Estado, à medida que a oposição assumia o poder.
Ameaça à integridade territorial
Dois aliados de Yulia Timochenko foram designados para o comando do Parlamento e do Ministério do Interior.
“Nosso principal objetivo é restabelecer o funcionamento das instituições”, declarou seu novo presidente, Olexandre Turtchinov, durante uma entrevista coletiva à imprensa pouco depois de sua eleição.
A Polícia havia afirmado antes que está “ao lado do povo” e que compartilha suas aspirações por “mudanças rápidas”, em um comunicado divulgado no site do Ministério do Interior.
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O presidente Yanukovytch estava a caminho de Kharkiv, onde estava sendo realizado um congresso de autoridades políticas das regiões pró-russas do leste, no qual a “legitimidade” do Parlamento ucraniano foi questionada, com os participantes considerando que a instituição atua “sob a ameaça das armas”.
“As decisões do Parlamento tomadas sob certas condições colocam em dúvida a sua legitimidade e sua legalidade”, ressaltaram essas autoridades.
“A integridade territorial e a segurança da Ucrânia estão ameaçadas”, alertaram.
A Ucrânia, com 46 milhões de habitantes, está dividida entre o leste ligado à Rússia e de língua russa e o oeste nacionalista e de língua ucraniana.
No subúrbio de Kiev, um engarrafamento gigantesco foi provocado pelo movimento de milhares de ucranianos que visitavam a luxuosa mansão do presidente, abandonada pelas forças de segurança.
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O local é mantido pelas forças oposicionistas, que proíbem o acesso ao local, mas permitem que os curiosos observem de fora, através das janelas, vendo, por exemplo, cômodos decorados com mármore e ouro, a suntuosa sala de recepção e uma coleção de faisões.
A decisões doParlamento vieram depois de um acordo assinado na noite de sexta-feira com a mediaçãoo dos europeus. Ele previa uma eleição presidencial antecipada, a formação de um governo de coalizão em dez dias e um retorno à Constituição de 2004, votada às pressas pelos deputados.
O acordo tinha sido concluído depois dos confrontos que deixaram cerca de 80 mortos desde terça-feira e centenas de feridos em Kiev, em um nível de violência sem precedentes para esta ex-república soviética.
Veja também: Yanukovytch anuncia antecipação das eleições na Ucrânia