– Flores, sim; beijos de batom, não!

Merlin Holland, neto de Oscar Wilde, espera que os admiradores, principalmente as admiradoras, do escritor irlandês que têm a hábito de beijar sua sepultura, no cemitério Père Lachaise, em Paris, vão compreender esta mensagem.

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Sob um belo sol de outono, Merlin Holland e Dinny McGinley, ministro irlandês das Artes e do Patrimônio, inauguraram na terça-feira (29) o túmulo reformado do autor de O Retrato de Dorian Gray onde repousa, também, desde 1950, seu último amante, Robert Ross.

E, para assegurar que os fãs serão mais razoáveis que apaixonados, no futuro, o túmulo sobre o qual foi construído um monumento alegórico representando uma esfinge alada, esculpida em 1912 por Jacobs Epstein, está, a partir de agora, protegido por placas de vidro de dois metros de altura.

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Frequentado durante anos, o túmulo tombado em 1997 pela França, como monumento histórico, tornou-se um lugar de peregrinação do romantismo, pelo que se apresentava quase que inteiramente coberto de marcas de beijos impregnadas de pigmentos vermelhos.

O surpreendente ritual que começou, misteriosamente, nos anos 90, acabou por enfear a sepultura, uma vez que os conteúdos gordurosos dos batons penetraram profundamente na pedra.

Intérprete célebre das obras de Oscar Wilde, o ator britânico Rupert Everett assistiu à colocação do novo dispositivo de proteção.

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– Os beijos, para Oscar Wilde, não eram simplesmente sinais de amor. Ele os associava ao perigo, e até à morte – lembrou ele, destacando que o escritor foi preso e condenado a dois anos de trabalhos forçados por um beijo homossexual. – “Um beijo pode arruinar uma vida humana”, escreveu um dia Oscar Wilde. Eu me pergunto como ele pôde suportar a homenagem de beijos de batom, que tiveram suas marcas deixadas por milhares de admiradoras nos últimos anos… Talvez dissesse: “Salvem-me de meus discípulos!” – imaginou Rupert Everett.

Oscar era muito cuidadoso com sua imagem, apresentando-se sempre bem vestido, acredita Everett.

– Não acho que lhe agradaria a ideia de repousar num túmulo degradado, mesmo por beijos de batom – diz o ator.

Merlin Holland admite que esse ritual dos beijos é “extraordinariamente tocante”, mas considera que as destruições do local não podem continuar.

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– O túmulo é uma obra de arte e um monumento histórico. É preciso protegê-lo. As homenagens poderão ser feitas de outra forma, com flores, por exemplo – afirma.

A reforma e a colocação em prática da proteção de vidro foram financiadas pela família do escritor e pelo governo irlandês, com a participação técnica do departamento de Monumentos Históricos da França. O ministro francês da Cultura, Frédéric Mitterrand, alegrou-se com o fato de “o túmulo de Oscar Wilde, uma das maiores figuras da literatura europeia, reencontrar o esplendor inicial, agora protegido”.

– As paredes de vidro não estão lá para afastar os admiradores. Elas dizem simplesmente: “Por favor, protejam a memória deste homem!” – disse o neto do escritor.

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No entanto, o túmulo reformado não recuperou a verdadeira aparência: a esfinge, uma alegoria ao gênio de Oscar Wilde, perdeu seu sexo, durante o assalto de um misterioso vândalo nos anos 1960. A peça, famosa por seu tamanho imponente, a ponto de fazer escândalo durante a inauguração, em 1912, não foi restabelecida.

Wilde morreu na capital francesa em 1900, aos 46 anos.