O treinador de vôlei suspeito de estuprar atletas em São José, na Grande Florianópolis, chegou a coagir uma das vítimas durante as investigações. Segundo a delegada Marcela Goto, da Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso (DPCAMI), André Testa teria simulado um depoimento com um dos atletas afim de garantir que ele negasse as acusações à polícia.

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— O suspeito passou a coagir as testemunhas. Inclusive, com uma testemunha, ele [o treinador] chegou a simular uma situação onde ele seria delegado de polícia e passaria a fazer as perguntas, e a testemunha deveria responder negando os abusos sexuais — relata. 

O caso veio à tona após reportagem exclusiva da NSC, em apuração conjunta dos jornalistas Raphael Faraco e Juan Todescatt.

A primeira denúncia ocorreu em maio deste ano. Segundo as investigações, o abuso ocorreu em 2017 quando a vítima ainda era menor de idade. Depois, mais três atletas registram um boletim de ocorrência contra André. O crime mais recente teria ocorrido em abril.

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— Ele tinha o mesmo modus operandi. Ele ganhava confiança, saia para restaurantes e bares, fornecia bebidas alcoólicas para adolescentes e, posteriormente, abusava sexualmente dos mesmos — explica a delegada. 

A polícia acredita que existe um número maior de vítimas. Isto porque, nos depoimentos, atletas contaram situações envolvendo outras pessoas. Além disso, como André atuava em outros lugares, há chances de que os crimes tenham sido realizados em outros ambientes, com outras pessoas. 

— A investigação prossegue. Já foram identificadas novas testemunhas e acredito que com a prisão do autor, outras vítimas possam se encorajar e comparecer à delegacia de polícia para relatar os abusos sexuais — finaliza.

Após a prisão, André foi encaminhado ao presídio, onde segue detido. Ele é investigado pelos crimes de estupro de vulnerável, importunação sexual, além dos artigos 232 – por constranger os adolescentes perante outros atletas – e 243 – por fornecer bebidas alcóolicas às vítimas -, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), e por coagir testemunhas ao longo do processo. 

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Treinador de vôlei suspeito de estupro de atletas adolescentes tem prisão mantida

Em nota, a defesa do treinador, alegou que a prisão foi “importuna, desnecessária e ilegal” e que ele é inocente das alegações: 

“A prisão preventiva de André Wilson Testa é inoportuna, desnecessária e ilegal. A polícia apenas apresentou ilações e conjecturas e, com isso, não comprovou a imprescindibilidade da prisão preventiva, assim como não justificou o cabimento de outras medidas cautelares diversas da prisão.

André é inocente e não são procedentes as imputações. Conforme se comprovará no transcorrer do processo, há denuncismo de viés vingativo. Todas as informações colhidas até o presente momento foram produzidas sem que fosse oportunizado o direito ao contraditório.” – Dr. Leandro Henrique Martendal (OAB/SC 38.879); Dr. Marlon Charles Bertol (OAB/SC 10.693)”.

FCV se manifesta 

Nesta sexta-feira (5), a Federação Catarinense de Vôlei se manifestou sobre o caso envolvendo o treinador e os atletas. Assinada pelo presidente Dante Klaser, a nota diz que não recebeu nenhuma denúncia contra o treinador, mas que “como medida preventiva” afastou André das suas funções. 

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“A Federação Catarinense de Vôlei vem a público se manifestar perante a matéria publicada no dia de ontem (04/08/22) que ganhou repercussão pela gravidade dos fatos apontados. Inicialmente cumpre esclarecer que a FCV repudia qualquer ato de violência, assédio ou discriminação, o esporte, em especial o vôlei, não compactua com qualquer prática abusiva, pelo contrário trata-se de formar pessoas melhores e contribuir como opção saudável de vida.

Esclarecemos ainda que em nenhum momento recebemos qualquer tipo de denúncia envolvendo o Sr. André e que tão pouco tomamos conhecimento dos procedimentos policias ou judiciários visto que tramitam em segredo, porem, como medida preventiva no sentido de facilitar as investigações, o afastamos das suas funções até que os fatos sejam devidamente apurados pelas autoridades competentes”.

Relembre o caso

O treinador e árbitro de voleibol André Testa foi preso nesta quinta-feira (4) depois que ex-atletas o denunciaram por estupro de vulnerável e assédio sexual. As vítimas eram garotos de 15 anos, como trouxe o colunista do NSC Total Raphael Faraco.

Os jovens, que na época eram adolescentes, contaram a relação de confiança que tinham no treinador e como ele conseguia ser “manipulador” e “persuasivo”, o que dificultou também que as vítimas entendessem os crimes.

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— Ele ganha muito a confiança e acabou abusando de mim — contou uma das testemunhas ao repórter Juan Todescatt e a equipe da NSC TV. — Eu não tava, como eu posso dizer, eu não tava entendendo direito essa situação. Eu era virgem na época. Foi a minha primeira vez — completou.

— Ele era muito manipuador, ele entrava muito na cabeça dos atletas. Ele conseguia fazer os atletas verem que eles é que iam sair como os errados — contou o pai de um dos atletas que se mobilizou para avançar com as denúncias.

Os assédios e estupros teriam ocorrido na casa de Testa, em motel e também na Casa Atleta, local onde os jogadores ficam durante os treinamentos. Além disso, o treinador teria embriagado algumas das vítimas.

— Ele me convidou para essa Casa Atleta um dia que iam estar todos os atletas lá, e eles não estavam, né? Até em casa pedir para ir, porque ia ter um evento, uma situação lá. E aí, chegou na Casa Atleta, não tinha [nada]. Só tinha ele [André Testa] — relatou uma das vítimas.

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André treinava a Associação Desportiva e Cultural Terra Firme, que representa o município de São José em competições estaduais e recebe verbas públicas do Executivo.

Ele é conhecido no meio esportivo catarinense e brasileiro. Inclusive, foi árbitro de linha de voleibol nas Olimpíadas do Rio de Janeiro, em 2016.

Prefeitura de São José

Procurada pela reportagem, a prefeitura disse que já tinha afastado preventivamente o treinador de todas as atividades quando soube das denúncias. Confira a íntegra do texto:

“A Fundação Municipal de Esportes e Lazer – FUNESJ informa que:

1- Em maio deste ano a Superintendência da FUNESJ tomou conhecimento informalmente do Boletim de Ocorrência registrado sob o nº 0421157/2022-BO- 00526.2022.0001609 junto a Delegacia de Proteção à Criança, Adolescente, Mulher e Idoso de São José, feito por um atleta que foi atendido em anos anteriores por um dos projetos, e que os fatos apresentados à autoridade policial tratavam de um “possível estupro” praticado por um dos técnicos da modalidade de voleibol.

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2- A par de parte dos fatos, uma vez que as investigações correm em segredo de justiça, e após solicitar à Procuradoria Geral do Município orientações sobre as providências a serem tomadas, a FUNESJ acatou as recomendações da PGM e buscou notificar imediatamente os responsáveis técnicos pelo projeto Voleibol do Futuro e o professor foi afastado.”

Associação Terra Firme

A Associação Terra Firme afirmou que não concorda com esse tipo de situação, nenhum tipo de assédio, físico, moral ou sexual, e que prontamente afastou o professor para que as investigações fossem feitas sem qualquer interferência junto aos jogadores.

Confederação Brasileira de Vôlei

Já a Confederação Brasileira de Volêi enviou nota dizendo que, diante das denúncias recebidas, determinou à Federação Catarinense de Voleibol o afastamento imediato de André Testa de suas funções, além de suspender seu registro na entidade, até que os fatos sejam devidamente apurados.

A CBV reitera que repudia qualquer tipo de assédio e trabalha de forma incessante por um ambiente pautado pela ética e pelo respeito, e livre de qualquer tipo de violência ou preconceito.

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