Os recentes casos de resgate a trabalhadores em situação análoga à escravidão chamam a atenção para um crime que viola os direitos humanos, a Constituição e está previsto no Código Penal. Pela legislação brasileira, esse tipo de caso fere a dignidade humana e nega direitos trabalhistas, deixando a vítima em uma situação de insegurança. Para combater essa prática ilegal, é preciso denunciar às autoridades e saber identificar as formas de violência.
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Em 2023, Santa Catarina já teve duas operações para resgatar 26 pessoas que estavam em situação de trabalho escravo contemporâneo. Neste ano, o caso mais chocante no Brasil até o momento foi o resgate de 207 trabalhadores em situação de violência em vinícolas na Serra do Rio Grande do Sul.
Pelo artigo 139 do Código Penal, reduzir alguém à condição análoga à de escravo é crime e pode levar à pena de reclusão de dois a oito anos em caso de condenação judicial e pagamento de multa. Sete situações distintas caracterizam o emprego de mão de obra escrava: trabalho forçado, servidão por dívida, jornada exaustiva, condição degradante de trabalho, cerceamento de transporte, vigilância ostensiva e apoderamento de documentos.
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Nem sempre todas essas categorias são encontradas em um mesmo local, mas apenas uma já indica a escravidão contemporânea porque todas são incompatíveis com a dignidade humana. Em Santa Catarina, a condição degradante de trabalho é a mais registrada, principalmente na área rural, seguida pela servidão por dívida — segundo a Auditoria Fiscal do Trabalho (AFT).
As finalidades do trabalho escravo são as mais diversas no Brasil. Atualmente é comum encontrar casos em plantações e atividades rurais, na construção civil, para exploração sexual e no trabalho doméstico.
O vídeo explica o que é o trabalho análogo à escravidão
Tipos de trabalho escravo e como identificar
Os conceitos de trabalho escravo estão descritos na portaria Nº 1.293, publicada pelo antigo Ministério do Trabalho em 2017. As características são observadas por auditores fiscais em ações de fiscalização para avaliar se há ou não condições análogas à de escravo para efetuar o resgate das vítimas. Veja as definições abaixo.
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Trabalho forçado
O trabalho forçado se refere a situações em que as pessoas são coagidas a trabalhar por meio do uso de violência ou intimidação. Nesses casos, os trabalhadores não desejam permanecer no serviço e nem atuam de forma espontânea. Eles podem sofrer ameaças, além de tortura física e pressão psicológica.
Condição degradante de trabalho
As condições degradantes são aquelas que negam qualquer aspecto da dignidade humana e colocam a saúde e a segurança do trabalhador em risco por conta do ambiente de trabalho. Tem relação com a pouca disponibilidade de água, falta de higiene e locais inadequados para repouso e alimentação. Também pode ser constatado a partir do perigo apresentado pela instalação onde as pessoas são alocadas pelo empregador.
Servidão por dívida
A servidão por dívida acontece quando o trabalhador fica vinculado a um serviço em razão de uma dívida imputada pelo empregador ou outras pessoas. A vítima fica restrita ao serviço por conta do débito, sem poder deixar o local de trabalho.
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Jornada exaustiva
Jornada exaustiva é toda forma de trabalho, de natureza física ou mental, que viole o direito fundamental do trabalhador por conta das jornadas muito longas ou de intensidade extrema. Nessas situações, prejudica a saúde, segurança, descanso e o convívio familiar e social da vítima. O trabalhador acorda muito cedo e descansa muito tarde, atuando por 14 horas, por exemplo.
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Cerceamento de transporte
Cerceamento do uso de transporte é toda forma de limitação ao uso de qualquer meio de transporte existente, particular ou público. O empregador tenta impedir que o trabalhador deixe o ambiente de trabalho ou alojamento ao restringir o acesso a meios de transporte.
Vigilância ostensiva
Ao exercer qualquer forma de controle ou fiscalização, direta ou indireta, no local de trabalho, o empregador exerce vigilância ostensiva. Assim, tenta impedir que o trabalhador deixe o local de trabalho ou alojamento.
Apoderamento de documentos e objetos
Ao se apoderar de documentos ou objetos pessoais de forma ilícita, o empregador impede que o trabalhador tenha acesso aquilo que é de direito. Acontece quando a vítima tem carteira de trabalho ou passaporte confiscado, ou um bem pessoal é confiscado até o fim de um serviço para garantir a permanência da pessoa no local de trabalho.
Como denunciar o trabalho escravo
Os órgãos responsáveis por atuar em casos de trabalho escravo são o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Auditoria Fiscal do Trabalho (AFT). Apesar de terem funções distintas, os dois podem receber denúncias por seus canais diretos e investigar casos suspeitos.
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O MPT possui um portal para oficializar as denúncias. Em caso de dúvida ou dificuldade, também é possível fazer a denúncia pessoalmente em uma sede do órgão.
Para denunciar de forma remota e sigilosa, foi criado o Sistema Ipê, único sistema exclusivo para denúncia de escravidão contemporânea no Brasil. Ele é o sistema oficial do Fluxo Nacional de Atendimento das Vítimas de Trabalho Escravo e foi lançado em 2020 pela Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Por ligação de telefone, o Disque 100 também recebe denúncias de trabalho escravo. Esse é o canal do governo federal para recebimento de denúncias de violações de direitos humanos.