Um médico-cirurgião com atuação em Florianópolis foi indiciado por lesão corporal gravíssima nessa segunda-feira (14). Pacientes que fizeram procedimentos estéticos com ele o denunciaram após sofrerem com queimaduras, bolhas, necrose e perda de tecido.
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O médico já foi condenado outras quatro vezes, inclusive em um caso em que uma paciente morreu após uma lipoaspiração em 2021. Marcelo Evandro dos Santos se manifestou em nota (leia completa abaixo), e disse que “sempre priorizei a saúde e o bem-estar dos meus pacientes”.
Uma das pacientes que denunciou o médico é Letícia Mello. Ela fez a primeira consulta em janeiro, para trocar as próteses de silicone e saber mais sobre uma técnica de lipoaspiração. Ela conta que o médico ainda indicou outros procedimentos.
— Disse que poderia tirar a flacidez da barriga. Logo em seguida já tocou no meio das minhas pernas, falou que também poderia ser possível tirar essa flacidez que a academia não tira, e que eu tinha uma depressão lateral — conta Letícia. Ele ainda indicou outras modificações, como a retirada de uma “gordurinha” das costas e recolocação no glúteo, o deixando mais arredondado.
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— Eu fui para procurar um procedimento, acabei sendo encantada por vários outros. Não fui avisada dos riscos que teriam, da quantidade de horas e procedimentos — lamenta a paciente.
Ao todo, Letícia passou por 12 cirurgias no mesmo dia. Foram 10 horas no centro cirúrgico e sete quilos de gordura retirados. Depois dos procedimentos, ela passou 11 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e mais de dois meses internada.
Letícia ainda conta que ficou com o lado direito paralisado, teve dificuldades para respirar, e recebeu seis bolsas de sangue.
— Fiquei muito mal, muito debilitada, muito fraca — conta.
Outras complicações começaram a aparecer: o corpo de Letícia começou a criar bolhas com secreções, que deixavam para trás marcas semelhantes a queimaduras.
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— Eu comecei a ficar totalmente queimada na barriga, nas pernas, nos braços, foi subindo para os seios e eu fiquei 20 dias ali, praticamente necrosando.
A neuropsicopedagoga saiu do hospital em abril deste ano, e registrou um boletim de ocorrência na Delegacia-Geral da Polícia Civil de Santa Catarina. O inquérito, instaurado no mesmo mês, foi concluído na segunda-feira (14).
— Hoje eu faço acompanhamento psicológico, acompanhamento psiquiátrico para não entrar em uma depressão e entender que tem um propósito eu estar viva — disse Letícia.
Investigações e inquérito
Durante as investigações, profissionais da área estética foram ouvidos pela polícia, que concluiu que um procedimento de caráter estético teria duração menor do que a cirurgia à qual Letícia foi submetida. A quantidade de gordura retirada também é maior que o normal.
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— Ocorreu uma passagem do que estava previsto pela doutrina, pela literatura, na questão de tempo e, também, na questão de gordura que foi aspirada da vítima — explicou o delegado-geral da Polícia Civil de Santa Catarina, Ulisses Gabriel.
A NSC TV também entrou em contato com uma funcionária que trabalhada em um dos hospitais onde o médico atuou, em Florianópolis.
— Eu via que era muito comum as pacientes que operavam com ele saírem de cirurgia e irem direto para a UTI, o que não é tão comum com os outros cirurgiões plásticos que operam no mesmo hospital — disse a funcionária, que não quis se identificar.
— Outro ponto também que eu via nas cirurgias dele era a quantidade de litros de gordura aspirados da mesma paciente, que era muito comum ultrapassar os 7% do peso corporal da paciente. Juntando tudo isso, a paciente saía da cirurgia descompensada.
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Outra vítima foi a auditora de saúde Andréa Pieper. Em 2022, ela fez duas cirurgias com ele, lipoaspiração e mamoplastia. Os procedimentos começaram perto das 9h e só terminaram às 22h.
— Eu fiquei muito tempo no centro cirúrgico. Quando eu cheguei no quarto, eu já senti que eu não estava bem — disse. Ela suspeitava que teve uma infecção, mas recebeu alta mesmo assim. Voltou a ser internada dias depois.
Ao todo, foram três meses de idas e vindas ao hospital, e 10 dias na UTI. Andréa perdeu a mama esquerda e a prótese da mama direita.
Processos e condenação
O médico tem ao menos sete processos de indenização por dano moral, em Santa Catarina e no Paraná. Quatro vítimas conseguiram a condenação. No caso mais grave, ele foi condenado a indenizar a família de uma paciente do Paraná que morreu após uma lipoaspiração. A juíza do caso concluiu que o cirurgião foi responsável pela morte e foi negligente na cirurgia estética.
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A sentença, proferida em 2021, cita ainda condenações anteriores por erro médico, e conclui que o réu fazia procedimentos sem ser especialista, nem associado à Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP).
O que diz o CRM
Em nota, o Conselho Regional de Medicina de Santa Catarina (CRM-SC) informou que apura a conduta do médico em uma sindicância, mas que não pode se manifestar sobre processos em tramitação.
O Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR) também disse que não pode se manifestar, e afirmou que o cirurgião está regularmente inscrito nos conselhos dos dois estados.
O que diz a defesa do médico
Em nota, o médico indiciado disse que “sempre priorizei a saúde e o bem-estar dos meus pacientes” e que as sequelas deixadas são “reações biológicas inerentes a cada paciente, as quais são informadas em termos de consentimento antes de cada cirurgia”. Leia na íntegra:
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“Em 23 anos na área da medicina, atuando nas especialidades de cirurgia geral e cirurgia plástica, sempre priorizei a saúde e o bem-estar dos meus pacientes, prestando o atendimento mais personalizado e humano possível, além de seguir e respeitar o Código de Ética Médica e todos os princípios e valores da profissão.
Solicito todos os exames necessários e forneço todas as orientações pré e pós-operatórias, além de estar sempre à disposição dos meus pacientes para atendimento e acompanhamento em casos de eventuais intercorrências. Esclareço que existem reações biológicas inerentes a cada paciente, as quais são informadas em termos de consentimento antes de cada cirurgia.
Como membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP), Society of Aestgetic Plástico Surgery (ISAPS) e da Associação Brasileira de Cirurgiões Plásticos (BAPS), estou em constante atualização profissional, realizando cursos de qualificação e participando de congressos voltados ao conhecimento e aprimoramento do domínio dos procedimentos em cirurgia plástica. Realizo uma média de 300 cirurgias por ano e, em todas, utilizo as técnicas mais modernas e recomendadas dentro da especialidade.
O Código de Ética Médica veda que o profissional exponha fatos dos quais teve conhecimento em razão de sua função, mesmo que tornados públicos. Além disso, os processos citados nesta matéria encontram-se sob sigilo processual. Por tais razões, minha manifestação sobre cada caso continuará sendo feita nos autos das respectivas ações.
Tenho confiança na ética e no comprometimento com que conduzo o meu trabalho e estou seguro de que todas as acusações serão esclarecidas na justiça.”
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