Há algo de mágico nas arquibancadas de um estádio. Ali a atmosfera faz com que a partida de futebol mais morna pareça final de Copa do Mundo para o torcedor fanático. Talvez seja o ar de união que faz com que qualquer pessoa deixe do lado de fora do estádio a sua identidade e, durante 90 minutos, assuma o posto de torcedor. Essa sensação única de ser torcedor cria imagens, cria heróis e cria histórias. O estádio pequeno no interior vira o Maracanã, o gol lutado e feito sem querer se transforma na mais bela obra prima. Talvez seja com essas imagens e histórias que uma certa torcedora do Metropolitano abastece sua mente durante os jogos. Talvez, pois nem ela sabe definir ao certo como é a partida na sua cabeça. Para ela, o futebol está no coração.
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Larissa Miraflor Lembeck tem 10 anos e há pelo menos cinco descobriu a paixão pelo esporte. Incentivada pelo pai, começou a torcer pelo Vasco, mas, pela proximidade, foi em um jogo do Metrô que ela fez sua estreia nas arquibancadas, há quatro anos. Amor à primeira vista. Larissa vai ao estádio sempre que possível ao lado do pai, Jeferson Alan Lembeck, que diz que a filha é apaixonada pelo time carioca, mas doente pelo Metrô. Certamente muitas outras crianças estavam no Estádio João Marcatto ontem para ver o Verdão em campo contra o Inter de Lages, mas Larissa se diferencia deles por um acaso da vida que não a impossibilita de ser uma fã incondicional de futebol. Nascida prematuramente aos seis meses de gestação, por conta de uma retinoplatia de grau avançado ela é cega. Larissa nunca viu uma bola rolar num gramado, um gol ou as cores do Metropolitano, mas em sua cabeça tudo isso existe.
Antes da partida começar ela entra em campo com os jogadores. De mãos dadas com o atacante Peu, pisa no gramado e é aplaudida ao lado dos atletas. Sentada na arquibancada do estádio, Larissa escuta a partida pelo rádio ao lado do pai, que comenta e narra os lances para a filha. Assim que a bola rola ela posiciona a pequena mão em uma figa que dura firmemente a partida inteira. As pequenas pernas nem alcançam o chão e não param quietas durante os 90 minutos.
Torcedora esperava vitória por goleada
O palpite dela para a partida contra o Inter é de 4 a 1 para o Verdão. Abre um sorriso no rosto ao ouvir do pai a notícia de que Léo Moura, fora do jogo por problemas físicos, sentou na frente dela para acompanhar o jogo. Vestindo uma camiseta do Metropolitano autografada por Léo Moura, Larissa é uma das torcedoras mais atentas na arquibancada. Diz que ama futebol e o Metropolitano, sem um jogador específico, mas o clube como um todo, e sua paixão fica visível a cada minuto de bola rolando.
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Mas a expressão de Larissa passa da alegria para a tristeza ainda no primeiro tempo. Aos 22 e aos 31 minutos, em dois gols tomados pelo Metrô.
“Imagino as cenas na minha cabeça e crio os lances”
Para ela não há memória mais emocionante no futebol.
– Gosto de torcer, cantar, gritar. Eu fico muito nervosa, sou apaixonada por futebol. Imagino as cenas na minha cabeça e crio os lances – explica, sem saber muito bem como contar aos outros a forma mágica com que entende o futebol, usando imaginação e todos os outros sentidos do corpo no lugar da visão.
A torcida dela é recompensada quando Peu, aquele mesmo que entrou em campo com ela, marca de pênalti para o Metrô. Larissa pula, canta, vibra e comemora muito. Quando a partida se encaminha para o final e a produção do Verdão em campo cai, a garota declara que futebol é algo injusto. A expressão triste fica visível em seu rosto conforme os minutos passam na narração no rádio e o time não consegue o empate.
Movida acima de tudo pela paixão, Larissa encontra maneiras diferentes de enxergar a vida. Ao fim do jogo ela levanta da cadeira, abraça o pai e se despede de quem estava ao seu lado na arquibancada também com abraços, ainda tremendo após a tensão de 90 minutos em que a paixão falou mais alto e a magia do estádio de futebol desenhou cenas inesquecíveis em sua memória.
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