Deu um estalo alto. Eu caí no chão. Senti muita dor. Foi quando olhei para a frente e enxerguei a goleira, estava tudo turvo, quase não tinha visão. Assim o volante Tinga descreve os primeiros minutos após a fratura na tíbia e na fíbula da perna direita, em um lance normal, simples, de um trabalho recreativo no CT do Cruzeiro, em Belo Horizonte.
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Em fase de recuperação, quatro dias depois de realizar uma cirurgia no local, o jogador está em casa, com a perna imobilizada. Os médicos lhe falaram a lesão é semelhante a sofrida pelo lutador brasileiro Anderson Silva. Recebe amigos, telefonemas, mensagens em busca do ânimo para voltar aos gramados – no final de semana que passou, Juan, Paulão e Alex estiveram com ele.
Não há prazo para a recuperação, nem mesmo metas para voltar aos gramados. Pelas próximas três semanas, o esforço terá de ser mínimo. No máximo, sessões de fisioterapia para diminuir o inchaço e a retenção de líquido no local. Por telefone, desde Minas Gerais, Tinga falou com Zero Hora sobre o pior momento de sua carreira:
– Chorei muito. Pensei que o futebol havia acabado para mim – resume o ex-colorado.
Qual tua lembrança do momento da lesão?
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Paulo César Tinga – Foi em um lance normal, de treino. Jogávamos sete contra sete. O Dagoberto me passou a bola, eu dominei, na hora do giro, me choquei com o Rafael (goleiro do Cruzeiro). Não sei dizer se ele se chocou comigo e bateu com o braço ou com a perna. Sei que deu um estalo alto, ali eu já sabia que tinha quebrado, perna estava mole. Senti tanta dor que não enxergava direito. Olhava para a frente, via a goleira e enxergava tudo turvo.
Os vídeos que mostram o momento impressionam.
Tinga – Claro. Você imagina ver 20 homens chorando ao teu redor. Eu fiquei desesperado. Chorei muito. Para mim, na hora, pensei que o futebol havia acabado para mim. Mais tarde, os médicos me explicaram que essa é a lesão mais tranquila de todas. Mas, antes disso, eu fiquei tão cabisbaixo, de uma forma que não desejo a ninguém. O ânimo veio dos amigos, companheiros… No mesmo dia, cheguei no hospital, já tinha gente do clube no quarto, jogadores, estavam me esperando.
O apoio das pessoas ao teu redor deve ter reanimar.
Tinga – Sim, sem dúvida. Sempre tive tratamento VIP no Grêmio, no Inter… Até os jogadores do Inter vieram aqui me visitar… e é nessa hora que tu vê que tua carreira vale a pena, pela relação de amizade, pela parceria. Mas posso te afirmar uma coisa: aqui no Cruzeiro eu vivo algo que nunca vivi em lugar algum. Eu tenho muita liberdade, muita afinidade com todos aqui. É diferenciado no Inter, claro. O Luigi me ligou, o Carvalho, o Dunga, o Carravetta, o Falcão. O tratamento que eu tenho aqui é incrível. As pessoas não entendem porque ganhamos. É que somos muito amigos. Não é só futebol.
Mais que no Inter de 2006?
Tinga – Em 2006, tínhamos amizade, claro, mas era mais em questão de liderança, tinha o Fernando, o Iarley, depois o Sobis. Aqui no Cruzeiro, os 30 têm o tratamento igual, titulares, reservas… falam quando querem falar. O treinador (Marcelo Oliveira) trata o jogador de uma forma fora do normal. Cada problema que dá com um jogador a gente se reúne, faz uma oração… Os problemas pessoais viram do grupo, nos ajudamos.
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Quando você deixou de lado a ideia que teria de se aposentar?
Tinga – Na sexta-feira, mesmo, o diretor (Alexandre Mattos) chegou lá, entrou no quarto e disse “Que parar… quero te ver correndo já na outra semana, levanta essa cabeça. Quando você chegou do Inter eu disse que você ia ficar três anos comigo”. Ele me colocou para cima.
E, obviamente, não era teu desejo parar. Ao menos assim…
Tinga – A primeira coisa que você pensa é que não terá mais condição. Primeiro porque tem o preconceito da questão da idade. Quando acontece uma coisa dessas você acredita que vai para o lado mais difícil. Eu nunca lesionei sério, nunca tive nada grave. Você vai juntando uma série de coisas e a primeira coisa que você pensa é que é o fim. E não era o fim que eu sonhei para mim. Eu quero decidir a hora de parar.
E quais teus planos agora?
Tinga – Eu tenho conversado muito com as pessoas e a única coisa que não posso fazer são planos. O único plano que tenho de fazer é me recuperar. Se não tiver prejuízo físico, se eu puder acompanhar o futebol moderno, vou seguir, ainda. Eu tenho garantia do clube que ficarei até o final do meu contrato (maio de 2015). Vai ser difícil de ir embora, se é que eles vão deixar eu ir embora. Meu desafio é ter a saúde que sempre tive.
Os médicos falaram sobre jogar ainda esse ano?
Tinga – Não falamos disso. Tenho de pensar em me recuperar, não colocar meta. Depois não consigo realizar a meta e desanimo. O D’Alessandro me ligou umas semanas atrás para falar sobre um jogo beneficente que ele quer fazer ao final do ano. falamos por mensagem, esses dias, “guarda a número 7 que eu vou jogar, sim”. É nesse sentimento (de voltar a jogar) que me apego.
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