Ars longa, vita brevis, disse o romano Sêneca, popularizando o que tinha dito, em ordem inversa mas com o mesmo sentido, o grego Hipócrates. Arte longa, vida breve. Livros de sobra, tempo não muito. Penso isso ao empilhar títulos não lidos diante da parede do escritório: 1,29 metro de leitura acumulada.
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Não tenho como provar que a diferença entre livros comprados e lidos vem aumentando, mas vários colunistas garantem que sim. Casos próximos, além do próprio, me estimulam a concordar. Os motivos parecem muitos e combináveis: aumento do poder de compra, blefe de status cultural, reação ansiosa à leitura irregular (a utopia da lista-ideal-para-se-ler-um-dia), facilidade das compras online, apelo editorial (cada edição parece mais definitiva do que a anterior, aprimorando tradução, conteúdo extra, acabamento, design).
Nem todo crítico se compadece da impulsividade de se comprar mais do que o necessário. Um deles lembrou, desdenhoso, que adquirir livros não é o mesmo que adquirir seu conteúdo. Sem dúvida, quem leu a Ilíada em uma edição alheia desmilinguida, e não quem comprou uma edição venerável para manter como troféu intocado, é que aprendeu alguma coisa com Homero. De qualquer modo, tende piedade. Talvez o comprador compulsivo já esteja se martirizando o suficiente. Considero os livros não lidos a minha biblioteca negativa, um débito que me fustiga com doses variadas de remorso ao longo da semana.
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Em um texto de 1990, Umberto Eco toma como óbvio o fato de ter lido tudo que mantém em casa, ironizando a reação dos visitantes: “Quantos livros! Já leu todos?”. Ele concede que qualquer um é tomado “pela angústia do conhecimento” diante de tantas estantes cheias, mas se imagina escarnecendo: “Não, estes são os que preciso ler durante o próximo mês, os outros eu guardo na universidade” (para uma abordagem bem mais gentil sobre a angústia do conhecimento, ver o imperdível Cultura Geral, de Dietrich Schwanitz).
Minha pilha, em todo caso, promete a aparição de ótimos títulos aqui nos próximos meses. Tem The Pale King, o último romance de David Foster Wallace; livros recentes de Jhumpa Iahiri, Zadie Smith, Cornac McCarthy, Karl Ove Knausgård, Valter Hugo Mãe; contos de Nabokov; livros menos ou mais lembrados de D.H. Lawrence, Unamuno, Pynchon, John Cheever, George Eliot; o remoto Genji Monogatari, clássico japonês do século 11; e muitos outros.
Lançamento
Com conteúdo múltiplo e promissor, o jornal Caixa de Pont[o], dedicado ao teatro, ganha o seu primeiro número. Para conhecê-lo, apareça no bar Kibelândia, no Centro de Florianópolis, na próxima terça-feira à noite. O jornal é editado pelos especialistas da área e poetas Marco Vasques e Rubens da Cunha – que aproveita a ocasião para lançar o livro de poemas Curral, vencedor do prêmio de poesia da Editora da UFSC em 2014.
Vale conferir
A principal unidade da Livros & Livros na UFSC reuniu em uma gôndola diversos títulos da Companhia das Letras com 50% de desconto. Sobram obras ótimas, com temas bem variados, na faixa de R$ 20 a R$ 30. Não percam.
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