Terça-feira (1º), 5h30min. O agricultor Fernando Warmeling, 42 anos, passava em frente à plantação de milho da família na localidade de Picadão, zona rural de Nova Veneza, no Sul catarinense, quando um rastro de caminhão que quebrara parte da lavoura capturou a atenção dele. Intrigado, caminhou pelos poucos metros da estrada lateral do terreno que dá nos fundos da propriedade. A cena que viu em seguida causou muito mais espanto: eram dez carros entocados no milharal. Naquele momento, o agricultor não sabia, mas os veículos tinham sido abandonados ali por uma quadrilha em fuga, que horas antes havia praticado o maior assalto a banco da história de Santa Catarina.
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— Entrei para ver se tinham roubado aqui. Daí cheguei e dei de cara com os carros. Levei um “sustinho”. Já tinha visto na internet sobre o tiroteio, mas nunca imaginei que os carros seriam deles. Dei a volta e chamei a polícia — recorda Fernando, que preferiu não ser fotografado.
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O assalto e toda a ação que o envolveu, na cidade de Criciúma, vizinha a Nova Veneza, ganhou destaque no mundo. A polícia estima que ao menos 40 criminosos tenham participado do crime. O bando provocou incêndios, bloqueou ruas e acessos à cidade, atirou contra o Batalhão da Polícia Militar, fez moradores reféns para usá-los como escudo e disparou por cerca de duas horas ininterruptas pelas vias centrais para intimidar população e forças de segurança. Prédios, lojas e casas foram atingidas pelos tiros. Um policial militar ficou ferido.
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Com o cerco armado, os assaltantes invadiram o prédio do Banco do Brasil no Centro da cidade, arrombaram portas usando explosivos e chegaram até uma espécie de “sala-cofre”. De lá, fugiram levando uma quantia ainda não divulgada. Ao menos Cerca de R$ 800 mil ficaram para trás, em malotes espalhados pelo chão.
No fim da manhã da última quarta-feira (2), dia seguinte ao assalto, o agricultor Fernando Warmeling e o pai dele, o também agricultor Maurício Antônio Warmeling, 74 anos, retiravam a parte do milharal que ficou destruída para usar como alimento para os gados criados pela família.
— Se ficar um sol aqui em cima nós não aproveitamos mais nada. Assim nós levamos e fazemos silagem — explica Maurício.

O homem conta que, no sábado anterior ao crime, dia 28, dias antes do assalto em Criciúma, viu um carro entrar na plantação, por volta das 22h.
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— Pensei que fosse ladrão de milho. Mas depois olhei, e não tinham mexido em nada aqui. Quem é que sabe? Talvez eles estavam treinando já — comenta o agricultor.
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Uma cidade em estado de choque
Na manhã de terça-feira (1º), poucas horas depois do crime, a fachada do banco atacado pelos bandidos, na esquina entre a Avenida Getúlio Vargas e a Rua Lauro Müller, chamava a atenção de moradores. A expressão no rosto de muitas das pessoas era de perplexidade. Elas ainda tentavam assimilar o que havia acontecido horas antes. O cenário pelas ruas centrais da cidade era de destruição: marcas de tiros nas fachadas de prédios e lojas, vitrines quebradas, projéteis e estilhaços pelo chão.
Da janela do prédio onde mora, a poucos metros da agência, Jennifer Bosa, 28 anos, ouviu os primeiros disparos, por volta da meia-noite. Ela conta que, inicialmente, achou que fossem fogos de artifício, mas que depois chegou a ver quatro dos criminosos na rua e percebeu que, na verdade, o barulho era de tiros.


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— Eles atiravam para cima, para baixo, não tinham alvos. Foram duas horas de disparos, praticamente sem parar. Tive uma crise de pânico, chorei, precisei ser socorrida por uma vizinha. Ainda não consegui dormir — relata Jennifer.
“O sentimento foi de pavor”, diz jovem que viu criminosos
Já Franciele Matos voltava de carro da pizzaria onde trabalha para casa quando encontrou os criminosos em uma das ruas centrais de Criciúma. Ela viu que dois homens faziam disparos com armas de fogo para cima e, assustada, deu ré no veículo e fugiu a pé.
— Vi os dois na hora que parei numa sinaleira. Eles estavam num cruzamento, um de cada lado, e quando vi que estavam atirando me assustei, parei o carro e dei ré. Depois, estacionei em outra rua e fui para casa a pé, correndo, desesperada (…) O sentimento foi de pavor, depois que cheguei em casa e entendi o que estava acontecendo — conta Franciele.
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No comércio, lojistas ainda perplexos trabalhavam no dia seguinte ao crime para reparar os danos e calcular os prejuízos causados pela ação dos criminosos. Rodolfo Amboni, que tem uma loja a poucos metros da agência do Banco do Brasil, foi até o local durante a manhã. A fachada do comércio ficou danificada. Apesar da noite de terror, ele diz que o sentimento, de certa forma, era de alívio no dia seguinte ao crime.
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— Moro a algumas quadras daqui. Os disparos pareciam embaixo do meu prédio. Mas acho que a polícia (que não foi confrontou os bandidos durante a ação no Centro da cidade) agiu de forma correta, para evitar um desastre muito maior — afirma Amboni.
— Eu tinha muito medo de eles invadirem o prédio, de fazerem alguma coisa. Depois a gente foi vendo que eles queriam pegar o dinheiro, mas fiquei muito apavorada. Eu tremia. O barulho dos tiros era alto demais. Parecia que era dentro de casa.
“Parecia que era dento de casa”, diz jovem sobre barulho de tiros
Enquanto ouviam os disparos, moradores da área central de Criciúma acompanhavam cenas da ação dos bandidos em vídeos que se espalhavam por grupos de WhatsApp e buscavam locais seguros dentro de casa com medo de que pudessem ser atingidos. Muitos se deitaram no chão, outros se abrigaram em banheiros ou debaixo da mesa.
A estudante Maria Alice Cavaler de Campos, 21 anos, conta que passou mais de duas horas dentro do guarda-roupa do quarto no apartamento onde mora com a família, num prédio que fica na mesma quadra do banco alvo do assalto.
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— Acordei meia-noite em ponto escutando um “tac tac tac tac”. Fiquei pensando o que era, e imaginei que fossem tiros vindos ali do banco, quando minha irmã entrou no quarto apavorada e contou o que estava acontecendo. Levantei da cama com o meu celular, e a minha primeira reação foi me esconder dentro do guarda-roupa porque achei que seria o lugar mais seguro — lembra.

Da sala do apartamento onde a jovem mora é possível ver a parte de trás do banco. A família dela apagou todas as luzes de casa com receio de que uma lâmpada acesa pudesse chamar a atenção dos criminosos.
— Eu tinha muito medo de eles invadirem o prédio, de fazerem alguma coisa. Depois a gente foi vendo que eles queriam pegar o dinheiro, mas fiquei muito apavorada. Eu tremia. O barulho dos tiros era alto demais. Parecia que era dentro de casa.