Uma questão semântica está trancando o repasse de R$ 120 milhões para a reconstrução das cidades catarinenses atingidas pela enchente de novembro. Enquanto o governo do Estado não substituir o termo “obras de prevenção” por “obras de recuperação” na documentação enviada a Brasília, o Ministério da Integração Nacional não pretende liberar os recursos.

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A troca da palavra é uma exigência da assessoria jurídica da Secretaria Nacional de Defesa Civil e está gerando um impasse entre o Estado e a União.

– Chega a dar uma coceira. Gostaria de eu mesma fazer essa substituição, mas não posso. Está na lei. O dinheiro não pode ser para obras de prevenção – justificou a secretária Nacional de Defesa Civil, Ivone Valente.

A necessidade de correção do documento deve levar o ministério a cancelar todos os projetos já empenhados no orçamento federal. O alerta foi emitido na última sexta-feira, por meio de um ofício encaminhado à Secretaria de Estado de Articulação Nacional. Ivone garante que não há riscos de Santa Catarina perder os recursos, mas a demora na transferência do dinheiro pode ser ainda maior.

No começo de junho, expiram os decretos de calamidade pública editados durante a catástrofe. Com vigência limitada a 180 dias, os decretos permitem o repasse de verbas em caráter de urgência e com dispensa de licitação para a contratação das obras. Em Blumenau, município mais afetado pelas enxurradas, estão pendentes R$ 31,6 milhões.

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– Se o governo estadual mudar a característica da solicitação, dá tempo de se cancelar os empenhos e fazer os convênios. Trata-se de um único documento – explicou Ivone.

Repasse terá de ser feito por convênio

Os R$ 120 milhões são destinados a mais de 120 obras de reconstrução da infraestrutura urbana no Estado. A correção do documento também muda a característica do repasse, que terá de ser feito por meio de convênio. Como se tratam de recursos emergenciais, a necessidade de contrapartida foi reduzida de 20% para 1% do montante liberado pelo governo federal.

Dos R$ 360 milhões assegurados à Santa Catarina na Medida Provisória 448, apenas R$ 87,5 milhões já chegaram ao Estado. Foram R$ 40 milhões para recuperação da infraestrutura, R$ 2,5 milhões para abrigos emergenciais e R$ 45 milhões retirada de entulhos e limpeza de vias urbanas.

O restante segue emperrado por trâmites burocráticos e atrasos no envio de documentos. De acordo com Ivone, somente na última sexta-feira chegou a Brasília a papelada completa enviada pelos municípios atingidos. Mais R$ 2,5 milhões estão reservados para a construção de novos abrigos, mas estes recursos só serão transferidos após a entrega da prestação de contas do repasse anterior.

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Na tentativa de agilizar o socorro financeiro, o ministério já havia reduzido de 21 para quatro o número de documentos exigidos.

Nos próximos dias, Ivone pretende conversar com o coordenador da Defesa Civil no Estado, para buscar uma saída para o impasse.

Estado diz desconhecer o caso

O executivo da Secretaria de Estado de Articulação Política, Humberto Kremer Neto, ficou surpreso, na terça-feira, com a orientação da secretária Nacional de Defesa Civil, Ivone Valente, para alterar a nomenclatura do projeto:

– Nunca fomos informados disso. Se é só a nomenclatura do projeto, amanhã (quarta-feira), no primeiro horário do dia, mudaremos.

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Neto comenta, no entanto, que os projetos encaminhados ao governo federal foram elaborados com ajuda de técnicos do próprio Ministério da Integração Nacional.

O secretário municipal de Planejamento Urbano, Walfredo Balistieri, diz que o município está acompanhando as orientações da União, mas a cada semana aparece uma nova questão: reclassificação das obras, convênios ou cancelamento de projetos empenhados. Ele sugere, ainda, que o Estado trate do assunto pessoalmente com o ministério.