Pré-candidato do PSDB à Presidência, o senador mineiro Aécio Neves repetiu nesta segunda-feira os passos do ex-governador José Serra, que esteve em Porto Alegre no mês passado. Ambos disputam a indicação do partido para concorrer contra a presidente Dilma Rousseff (PT) no ano que vem.

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Na reunião-almoço Tá na Mesa, na Federasul, afirmou que os petistas governam com um “software pirata” do programa tucano. Antes de partir para uma reunião política em São Leopoldo, o mineiro visitou a sede do Grupo RBS, onde foi recebido pela direção da empresa. Na sequência, deu entrevista aos veículos do grupo.

ZH – Em outubro, José Serra esteve aqui e falou como candidato. Quando o PSDB vai definir quem, afinal, é o candidato?

Aécio Neves – O que posso garantir é que o PSDB vai estar unido. Isso é uma precondição fundamental para apresentarmos uma proposta alternativa ao Brasil. A partir do momento em que o partido apresentar essa proposta, que será alinhavada em dezembro, vamos ter uma definição sobre candidatura. Isso vai acontecer com absoluta naturalidade. Tenho certeza que Serra vai estar conosco nesta caminhada. Nossa disputa não é interna. É externa. Temos obrigação de trabalhar para iniciar um novo ciclo no Brasil, de governo eficiente e ousado do ponto de vista das políticas sociais.

ZH – O senhor ficou chateado quando Serra insinuou que o senhor teria complexo de Madame de Bovary?

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Aécio – Não, ele não se referiu a mim, obviamente. Ele falou do PSDB. Não tenho essa pretensão de encarnar o partido, que tem oito governadores de Estado, ex-presidente da República. Acho que o PSDB tem problemas, como todos os partidos têm, mas é o porto seguro hoje para o início de um novo momento no Brasil. Essa questão interna é secundária.

ZH – Mas o senhor leu Madame de Bovary?

Aécio – Não li, mas eu conheço a história dos complexos dela. Não acho que o PSDB precisa se afirmar diante do PT, como ela precisava se afirmar. Sei que esta questão interna agrada muito a imprensa, mas ela não tem importância maior no momento do embate. Estaremos apresentando conjuntamente, solidariamente um projeto para o país. Pessoalmente, não acho que o PSDB precisa ter um candidato hoje. Como presidente nacional do PSDB, tenho muita liberdade para fazer o que estou fazendo. A minha caminhada pelo Brasil é na condição de presidente nacional do partido, e tenho uma responsabilidade: dar ao partido a unidade e o discurso necessário para enfrentarmos esse desgoverno que está aí. Esse é o meu papel. No momento certo, todos aqueles que compreenderem que esse é o melhor caminho, estarão juntos. Não só o Serra, mas todas as lideranças do partido. Temos de apresentar uma nova agenda para o Brasil, porque a agenda que está em curso foi proposta por nós lá atrás.

ZH – Qual seria esta proposta?

Aécio – Primeiro, não nos contentamos única e exclusivamente com a administração da pobreza, o que parece ser o objetivo do PT. Queremos dar outros passo. A qualificação na educação é absolutamente vital. Queremos propor a refundação da federação. Estados e municípios são incapazes de enfrentar dificuldades primárias. Queremos um governo central mais generoso. Há 10 anos, o governo federal participava com 56% do total investido em saúde pública e, hoje, participa com 45%. O governo propõe o Mais Médicos, mas, ao mesmo tempo, propõe menos saúde.

ZH – Esse aumento seria sem novo imposto, sem a volta da CPMF?

Aécio – Sim, seria uma repartição melhor daquilo que se arrecada hoje. O governo comemora recordes de arrecadação quase que mensais e não distribui a Estados e municípios, e não amplia investimentos em saúde.

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ZH – Onde a União entraria mais para combater a criminalidade?

Aécio – Há dois fundos nacionais, de segurança e previdenciário, que são sempre contingenciados. Não há planejamento. Há, na verdade, uma ação federal reativa. Se há uma crise em um determinado Estado, aí a União aparece. Os recursos da segurança, assim como os da educação, precisam ser imunes a contingenciamentos.

ZH – O senhor apresentou dois projetos que tratam do Bolsa Família. É uma forma de blindar o PSDB de críticas durante a eleição?

Aécio – O Bolsa Família é a junção do Bolsa Escola, do Bolsa Alimentação e do vale-gás, que, já no final do governo FH, atendia a 8 milhões de famílias. Na verdade, quando o PT copia o PSDB, vai bem. Quando não copia, vai mal. O governo Lula teve a virtude de fazer o adensamento dos programas, de unificá-los. A partir daí, passou a ser uma peça de propaganda eleitoral. Toda eleição assistimos alguém, principalmente nas regiões mais pobres, dizer que o PSDB vai acabar com o Bolsa Família, que o PSDB é contra. O Bolsa Família é correto, está enraizado na paisagem econômica e social. Não achamos que seja a solução para todos problemas, mas queremos transformá-lo em política de Estado.

ZH – Qual é a porta de saída do Bolsa Família?

Aécio – Para o PT, parece que é o ponto de chegada. Para nós, é o ponto de partida. O PT trata da questão da pobreza apenas na dimensão da privação da renda. Você tira as pessoas da miséria, mas isso é pouco generoso com essas famílias. Entendo a pobreza como a privação de renda somada às privações de serviços e oportunidades. Precisamos tentar restabelecer no Brasil o Estado do bem-estar, onde não seja o Estado apenas o provedor do bem-estar. Tem de dar condições para que as pessoas possam buscar algo mais. É educação de qualidade. As pessoas têm receio de sair do programa. Por isso, também apresentei proposta que permite que a pessoa, após conseguir emprego, receba o Bolsa Família durante seis meses.

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ZH – Quais são as áreas de atuação do PT que podem ser comparadas a um software pirata?

Aécio – Concessões. O PT passou a vida inteira demonizando a participação do setor privado em investimentos públicos, mas curvou-se a ela. O PT fez a maior privatização da história no campo de Libra, e, ao meu ver, não fez no melhor modelo. Fez equivocadamente. Priorizou-se o superávit primário, que o governo, pela má condução da economia, não conseguiu realizar, porque gasta muito mais do que deveria. Eles copiam o que propunha o PSDB no ponto de vista das concessões, mas não geram segurança.

ZH – O senhor é a favor do piso para as polícias, com base no salário de Brasília?

Aécio – Ele não pode ser implementado imediatamente. Apresento uma proposta que permite gradualmente uma compensação da União, sobretudo para os Estados que pagam menos. Mas falta gestão e inteligência por parte da União, em parceria com os Estados. As realidades são diferentes. Não há hoje, por parte do governo federal, nem solidariedade orçamentária muito menos planejamento. O governo federal fica omisso e, no momento em que há uma crise grande, chama-se a guarda nacional, apela-se para a boa vontade do governo.

ZH – Se o senhor for eleito, a reforma tributária será prioridade?

Aécio – Sem dúvida, e com muito realismo. Como o Estado gasta muito mais do que deveria, o espaço para redução da carga, obviamente, é limitado. A curto prazo, cortaria pela metade este número de ministérios que estão aí e criaria uma secretaria extraordinária pela desburocratização do sistema tributário. Isso pode ser feito em um ano, para entregar um projeto ao Brasil que facilite como facilitamos com o Simples, lá atrás. Vamos estender isso para toda a economia. E a médio prazo, com o Estado mais equilibrado, temos de caminhar para a diminuição da carga tributária.

ZH – Quais ministérios o senhor cortaria?

Aécio – Ah, isso eu não vou fazer, nessa hora… Mas quando falo em cortar ministério não significa cortar as ações que os ministérios fazem. Há uma estrutura paquidérmica, hoje, que não tem paralelo em país nenhum. Estudo da Universidade de Cornell mostra que os governos mais eficientes são os que tem entre 20 e 22 ministérios, independentemente da extensão territorial e da população. Por coincidência ou não, foi o número de ministérios que tinha Fernando Henrique quando deixou o governo. Acho que resgatar isso é adequado. Não é nem pelo custo apenas, mas é uma sinalização que se dá ao país. Não é aceitável que nós tenhamos 22 mil cargos em comissão. Para os mais qualificados? Não. É para a companheirada. Em Minas Gerais, assumi o governo com 22 secretarias, governei com 15, criei duas extraordinárias para as regiões mais pobres e cortei pela metade os cargos comissionados.

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ZH – Na União, daria para cortar esses cargos também pela metade?

Aécio – Seria leviano se eu dissesse exatamente quanto, mas dá para fazer um corte profundo, próximo disso. Só que não fiz disso uma plataforma de campanha. Fiz porque era necessário. É uma sinalização para a sociedade. Se o Estado acha que pode tudo, com gastos faraônicos, o cidadão vai achar, também, que tudo é normal. Me incomoda muito e deve incomodar os brasileiros a forma que o governo gasta. Um trem bala é uma sandice em um país que tem demandas de mobilidade urbana como tem o Brasil.

ZH – O governo FH não conseguiu resolver gargalos de infraestrutura no RS. Como conquistar o gaúcho nessa questão?

Aécio – Temos de falar a verdade, com clareza. O governo FH teve uma grande prioridade, que foi debelar a inflação, o mais perverso dos impostos e que aflige os que menos têm. Portanto, o maior programa de transferência e distribuição de renda da história contemporânea do Brasil não é o Bolsa Família, é o Plano Real. Houve quatro crises sucessivas. O Estado não tinha a estrutura e os recursos que tem hoje. FH restabeleceu a capacidade do Estado de se organizar. Fez muita coisa no Brasil para aquela conjuntura. É óbvio que não tivemos tempo de fazer tudo aquilo que precisava ser feito, mas as bases para a retomada do crescimento foram criadas. Sem o governo FH, Lula não teria os resultados que teve. Agora, voltamos a ter capacidade de planejar. É preciso estabelecer, com cada Estado, as prioridades e tocá-las até o final.

ZH – Se eleito, o senhor se compromete com a continuidade do projeto do metrô de Porto Alegre?

Aécio – Metrô é absoluta necessidade e prioridade nas principais cidades. O governo se dispõe a gastar – e isto é um acinte – mais de R$ 30 bilhões em um malfadado trem-bala e fica nas promessas. Essas daqui (de Porto Alegre) são muito parecidas com as de Belo Horizonte. Agora, no final do ano, assistimos a todas as promessas, lançamentos e assinaturas, mas a incapacidade gerencial do governo é muito grande. O Brasil é hoje um grande cemitério de obras inacabadas. Ninguém me falou, não. Fui vê-las.

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ZH – As denúncias envolvendo o metrô de SP e governos do PSDB terão reflexo na eleição?

Aécio – O governador Geraldo Alckmin foi exemplar do ponto de vista de reunir a sociedade para fazer uma apuração. Tudo tem de ser apurado. Se tem um agente público responsabilizado, tem de ser punido. Mas não acredito que isso afete nem a posição nacional do PSDB e tampouco a reeleição de Alckmin, que é o favorito.

ZH – O governo Yeda vai ajudar ou atrapalhar a sua candidatura?

Aécio – Tenho muito respeito pela ex-governadora Yeda. Fez, do ponto de vista fiscal, um esforço enorme no Estado e, inclusive, nós em Minas, com quadros qualificados, ajudamos a isso. Teve um embate político muito duro, mas não acho que atrapalhe em absolutamente nada.

ZH – Qual sua avaliação sobre a situação atual do Estado?

Aécio – Eu acompanho os problemas pelos quais passa a economia do Rio Grande, que já foi o terceiro exportador e hoje é o quinto. Rio Grande do Sul e Minas Gerais talvez sejam os estados mais penalizados pela Lei Kandir, onde o governo federal não repõe as isenções do setor exportador. A grande ajuda que o governo federal pode dar a um Estado que empreende é fazer um planejamento adequado e garantir infraestrutura para quem produz. Essa palavra mágica o governo do PT não conhece: planejamento. O governo do PT é a marca do improviso. Então, eu acredito que o PSDB é quem tem as melhores condições, os melhores quadros, mais experiência para permitir o início de um novo ciclo no Brasil.

ZH – Qual será o seu palanque no RS?

Aécio – Eu conto com o povo do Rio Grande do Sul, como nós sempre contamos. O PSDB venceu em segundo turno em todas as últimas eleições no Estado. Acho que é porque a população do Rio Grande é esclarecida, que sabe o que representamos. Queremos fortalecer as bancadas do PSDB na Assembleia, na Câmara e o PSDB do Rio Grande quer dar a vitória novamente ao candidato do PSDB à presidência da República. É preciso que haja conexão entre o que se faz aqui no Estado, o que setor privado faz, com aquilo que o setor público faz e com o que governo federal pode oferecer. Esse divórcio precisa acabar. E esse tempo de que a promessa é uma coisa e o compromisso é outro também é uma página que nós queremos virar. Acho que o PSDB vai permitir a reconciliação do RS com o desenvolvimento nacional. Isso se faz através de um governo federal conectado com as aspirações da população, eficiente e ético. Planejamento, eficiência e ética são marcas que o PSDB vai trazer para a política brasileira, até porque elas estão em falta hoje.

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