Depoimentos de funcionários da empresa pivô da Operação Mensageiro dão detalhes de como funcionava o esquema de pagamento de propina a agentes públicos e de favorecimento em contratos nos municípios. Os valores eram pagos de forma ilegal em troca da obtenção ou manutenção de contratos de coleta de lixo em cidades de Santa Catarina. Após o início das investigações, o pagamento a alguns políticos chegou a ser suspenso pela empresa.

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Em um dos depoimentos, um investigado ligado à Serrana afirmou que o pagamento de propinas chegou a ser suspenso em junho de 2022, depois que surgiu a desconfiança de que a empresa poderia estar sendo investigada. O pagamento suspenso seria o destinado ao prefeito de Tubarão, Joares Ponticelli (PP).

— Não vou mais passar porque eu estou sendo investigado, e eu não quero mais passar porque o risco é muito grande. Ele me chamou, eu fui na sala do prefeito, falei a mesma coisa e disse: olha, não posso passar porque eu estou sendo investigado. Vou esperar uns meses aí, se eu vir que a coisa não piorar, eu volto a passar — afirmou.

Contato com prefeituras começava antes do fim do contrato

Em um dos depoimentos, um dos gerentes da empresa Serrana Engenharia explica que, em alguns casos, as conversas com as prefeituras começavam antes mesmo de o contrato em andamento terminar.

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— Algumas prefeituras, ao término dos contratos de cinco anos, três meses antes, nós da Serrana, ou às vezes até o próprio agente público nos contatava para falar sobre novo o edital — detalhou um funcionário.

A partir daí, contratados da empresa que trabalhavam especificamente com elaboração e alteração de editais de licitação passavam a atuar. A empresa oferecia essas minutas às prefeituras que precisariam licitar o serviço. Nos termos da contratação, a companhia investigada incluía dispositivos com a intenção de prejudicar concorrentes que pudessem estar interessados em participar da disputa.

— Na prática, era exclusivo na parte de fraudar licitação, que era colocar alguns itens ali que ou dificultavam ou realmente impedia de outras empresas participarem da licitação e concorrerem junto à Serrana — afirmou outro funcionário, em depoimento.

As mudanças em exigências e valores eram feitas de forma discreta, para evitar chamar a atenção das prefeituras ou de órgãos de controle externo.

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— Tentava fazer de maneira mais sutil para tentar que o nosso documento seja utilizado 100% — pontuou.

Em alguns casos, quando eram exigidos mais orçamentos, a empresa chegava a apresentar até mesmo propostas de supostas concorrentes, com valores mais altos. Os valores necessários para pagar propinas a agentes públicos eram diluídos nos preços cobrados dos serviços de coleta, transporte, destinação de lixo e outros.

Contrapontos

A reportagem procurou a defesa da Serrana Engenharia, mas os advogados informaram que a empresa só vai se manifestar nos processos.

A defesa do prefeito Joares Ponticelli afirmou à reportagem da NSC dizendo que “o que foi dito nos depoimentos são suposições”, que “a palavra dos delatores, por si só, não seriam provas, mas meios para a obtenção de (provas)”. Também sustentou que “não vê efeito prático na divulgação dos vídeos”.

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Veja vídeos de depoimentos de SC

A Operação Mensageiro

A Operação Mensageiro teve a primeira fase deflagrada em 6 de dezembro de 2022. Ela investiga um suposto esquema de corrupção em contratos de coleta e transporte de lixo em diversas cidades de Santa Catarina.

A investigação já resultou na prisão preventiva de 16 prefeitos de cidades de SC até abril de 2023. Todos permanecem detidos em unidades prisionais do Estado, à exceção do prefeito de Lages, Antônio Ceron (PSD), que teve o regime alterado para prisão domiciliar.

A operação aponta que a empresa pagaria propina a agentes públicos em troca de facilidades na disputa de licitações e na liberação de pagamentos de contratos já em andamento com os municípios. Em alguns casos, a empresa chegaria a até mesmo elaborar minutas de editais que posteriormente eram usadas pelas prefeituras para licitar os serviços de coleta de lixo.

Segundo o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC), a movimentação de propinas teria chegado a R$ 100 milhões durante todo o período das irregularidades. Já o lucro da empresa teria alcançado a marca de R$ 430 milhões.

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