Para o técnico eletricista Mário César de Matos, ainda é difícil falar sobre 29 de outubro de 2003. Dez anos depois, um dos protagonistas do apagão foge dos holofotes, não quer dar entrevistas e procura apagar o que aconteceu naquela tarde de quarta-feira.

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– Eu tento esquecer. Não quero mais me lembrar de uma coisa que aconteceu 10 anos atrás – falou quinta-feira.

Aos 49 anos, leva uma vida pacata no bairro Capoeiras, em Florianópolis, mesmo endereço de 10 anos atrás. A casa de dois pisos e um portão de madeira é simples, com a pintura branca judiada pelo tempo. As idas e vindas do trabalho – na unidade da Celesc da Avenida Ivo Silveira, a menos de dois quilômetros de casa – geralmente são feitas a pé. Na vizinhança, é considerado um homem discreto, que fala pouco além de “bom dia” e “boa tarde”.

Apesar de raramente circular pela rua, especialmente nos últimos dias, a família é conhecida. Cesinha, como é chamado, ainda é rotulado como “o cara do apagão”.

– Até sei porque vocês estão procurando o Cesinha da Celesc – suspeita uma moradora da rua.

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A tentativa da família de viver no anonimato é tamanha que, no primeiro contato, a esposa Regina nega conhecê-lo e alega ser apenas uma inquilina do imóvel. A informação não se confirma no dia seguinte, quando o técnico aparece na sacada do sobrado.

– Não vou dar entrevista. O que eu tinha para falar já falei no Ministério Público – responde Matos, sem a barba que mantinha há 10 anos.

Domingo à noite, Regina atendeu a reportagem cordialmente e disse que tentaria convencer o marido, que não estava em casa, a também pôr fim no silêncio, como fizeram João Terba dos Santos e Sydney Vasquez. Após ficar sem respostas, uma folha com seis perguntas do DC foi entregue à filha do casal. Matos e Regina haviam buscado o filho, que fazia a prova do Enem. Por volta de 19h40min, saiu do carro somente ao estacioná-lo na garagem e entrou em casa sem falar.

– Ele não gosta de falar, de relembrar o assunto, porque já botou um ponto final – sentencia Regina.

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Dez anos depois, o eletricista é traído pela memória, ou faz mesmo questão de não lembrar.

– De onde eu estava não via o que estavam fazendo! Não vi nada, estava longe, não escutei barulho. Só me disseram: “Corre que está pegando fogo”. E eu sai de lá.

Único dos cinco eletricistas liberado de prestar depoimentos ao juiz federal na audiência de 2008, Matos relatou o caso em 2003 ao Ministério Público. Na hora do acidente, estava com João Terba dos Santos no final do túnel que dá acesso à galeria da Ponte Colombo Salles e por isso não viu o fogo começar.

No inquérito, fala que ouviu “um barulho, um ronco, que veio do rompimento”. Matos justificou ao MP que recebera treinamento para agir somente “em acidentes ocorridos em rede aérea” e não “informações em como agir em acidentes em rede subterrânea”. Disse ainda que a Celesc não forneceu todos os aparelhos necessários e citou o detector de gás, que deveria ser usado antes do início dos trabalhos: “Não foi utilizado porque a empresa não o possuía”.

Matos não nega que o episódio mudou – e marcou – a vida dele. Depois do incêndio, “não quis mais saber” do trabalho subterrâneo. Na última década – são quase 30 anos de Celesc -, dedicou-se a consertos da fiação aérea e hoje trabalha no plantão. Quando há uma emergência, sai com o caminhão para fazer alguma manutenção.

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Perguntado sobre o medo, por um instante pensa e responde:

– Quem é que não sentiria medo? – finaliza, antes de fechar a porta.