”Tenho 18 anos de profissão. Sempre tive muito orgulho de ser motorista de táxi. Foi dirigindo meu carro que criei meus três filhos e comprei meu apartamento (pequeno, mas é meu). Neste tempo todo, ajudei a salvar muita gente, transportando para hospitais, algumas vezes nem cobrando a viagem, porque vejo que é caso de urgência. Fico feliz em servir a comunidade e fazer o meu trabalho bem feito. Tenho clientes fiéis, que mesmo com a chegada do Uber não deixaram de fazer corridas comigo, porque se sentem seguros e sabem que vou atendê-los da melhor maneira possível. Assim como está acontecendo com meus colegas, meu lucro também diminuiu com a chegada do aplicativo, mas isso não significa que vou descontar meus problemas na população, como aconteceu com aqueles taxistas que se negaram a levar a criança machucada até o outro hospital. Temos que tentar resolver isso de uma forma civilizada. O usuário tem direito de escolher quem oferece o melhor serviço. Estou com vergonha de ser taxista neste momento, mas é preciso deixar claro: A maioria dos profissionais de táxi são trabalhadores honestos, pais de família preocupados em levar dinheiro para casa e sustentar a família. Não se pode generalizar. O que precisamos urgentemente é resolver esta situação da concorrência, mas através da lei, de forma ordeira.”
Continua depois da publicidade
Este é o desabafo de um taxista, que prefere não se identificar (para não sofrer represálias), e que se solidariza com a família do menino Eric. Na tarde da última terça-feira, a criança caiu, abriu um corte na cabeça e tinha que ser transportada de um hospital para outro, mas três taxistas se negaram a fazer a corrida porque os pais do menino haviam chegado ao hospital de Uber. O caso ganhou muita repercussão. A preocupação dos bons profissionais do táxi é que a atitude irresponsável e desumana daqueles três motoristas manche a reputação de toda a categoria.
”Como em todas as profissões existem os bons e os maus profissionais. E os maus advogados? Jornalistas? Professores? O que precisamos é separar o joio do trigo”, escreveu outro taxista, indignado com a situação. Concordo. Neste episódio, especificamente, muitas pessoas que se manifestaram reclamaram dos serviços de táxi, explicando os motivos pelos quais estão migrando para o Uber, além do custo menor: carros sujos, motoristas se recusando a fazer a viagem porque o trajeto é curto, mau humor, rádio nas alturas… São muitos os problemas relatados. Então, a conclusão é de que a mudança deve começar por aí: oferecer um bom serviço à população, provando que usar táxi é a melhor alternativa. Já que não dá para competir em preço com os motoristas de aplicativo (e aí já é outra discussão, que não cabe ao usuário), então que ganhem em educação e qualidade do serviço, como faz o taxista lá do início deste texto. Ele tem uma freguesia fiel.
Quanto ao caso do menino, um dos motoristas de táxi disse a uma rede de TV que se arrepende de ter se negado a conduzir a família até o outro hospital. Já é um começo. Negar atendimento é crime. O Código de Defesa do Consumidor é claro, no seu art. 39, inciso II: “É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: recusar atendimento às demandas dos consumidores, na exata medida de suas disponibilidades”. Sendo assim, tendo a possibilidade de transportar o passageiro (consumidor), isto é, estando com o táxi livre, o taxista, na condição de fornecedor de serviço, não pode se recusar a prestá-lo, nem pode selecionar seus clientes. Ao disponibilizar o serviço, o taxista assume a obrigação de atender o passageiro, sob pena de incorrer, inclusive, em crime contra as relações de consumo, com penas que variam de dois a cinco anos, ou multa.
Continua depois da publicidade