O professor é rígido. Às vezes dá até um certo medo. E os alunos respeitam. Aos 24 anos, Matheus Fayad dá aulas de jiu-jitsu para nada menos que 120 crianças e adolescentes da Vila União, comunidade carente do norte da Ilha. O projeto Superando Barreiras tem trazido ótimos resultados para a criançada, mas como o nome já diz, é necessário vencer todo tipo de adversidade. E a primeira delas é que tem tanta gente que às vezes falta espaço no tatame.
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Matheus voltou na última sexta-feira (22) de São Paulo, onde conquistou o terceiro lugar no Mundial de Jiu-Jitsu Esportivo. Mas não é só ele a colecionar medalhas por lá. As atletas do projeto tiveram um saldo de quatro medalhas na capital paulista, sendo duas de ouro — Gabrielly Oliveira e Nathaly Pires —, e duas pratas — Laura de Azevedo e Kelly Padilha.
— O que eu já conquistei? Tricampeã sulbrasileira, bicampeã catarinense, campeã da seletiva de Abu Dhabi e campeã mundial — lista a pequena Nathaly, de 12 anos.
— Tem que se dedicar bastante, mas se não tivesse o jiu-jitsu eu não iria para vários lugares onde eu viajei — se orgulha.
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O pai do Matheus é o coordenador do projeto. Aos 51 anos, recém-aposentado como servidor federal pela UFSC, Eduardo Lopes passou a se dedicar integralmente ao Superando Barreiras. A ideia da iniciativa surgiu em 2012, quando o filho morava nos EUA, onde foi para disputar campeonatos. Na época, chegou a morar com Fabrício Werdum, peso-pesado do UFC. Matheus voltou a Floripa e começou a tocar o projeto.
Começaram em um galpão velho no meio da Vila União, comunidade marcada pela guerra do tráfico. Com o tempo, o projeto foi crescendo e acharam melhor procurar um espaço maior. Hoje estão em um prédio alugado às margens da SC-403, na Vargem Grande, no andar de cima de uma igreja.
— No começo nós sofremos muito preconceito de pais e professores. Por ser uma arte marcial que carrega um estigma, achavam que poderiam deixar as crianças mais violentas, justamente numa região de conflito. Mas o que aconteceu foi justamente o contrário. O jiu-jitsu é um esporte de muita disciplina, e o que se viu foram alunos dedicados que inclusive melhoraram o comportamento em casa e na escola, além de manterem uma vida saudável, que afasta das drogas — conta o criador do projeto.
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Apoio para crescer ainda mais
O Superando Barreiras teve um convênio de seis meses com a prefeitura, mas não foi renovado. O maior financiador do projeto é o Instituto Lagoa Social. Ainda há dois empresários que se mantém no anonimato e ajudam nos custos com aluguel, salário dos instrutores e quimonos. Mas ainda sim, não há como dar respaldo a todos. Então são levados sempre no máximo quatro alunos para as competições.
— Esse espaço ficou pequeno para tanta gente. Eu tenho três horários de turma. Só não tenho mais porque não tenho como receber novos alunos aqui. Então a gente está lutando por um lugar maior. Eu queria poder levar todos aos campeonatos, oferecer lanche pra eles, ônibus, inscrição — deseja Matheus.
Dedicação não falta. As crianças treinam de segunda a sexta-feira, duas horas por dia. Às vezes, tem aula sábado de manhã também. O professor Fayad conta que as meninas são mais dedicadas ainda que os garotos.
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— Meu dia a dia é de manhã escola, tarde projeto e noite jiu-jitsu. Agora estou sendo ajudante do Matheus, eu venho aqui puxar o treino, sou a linha de frente da academia já. Quero ser professora de educação física — sonha a campeã Laura de Azevedo, 16.
Laura e as outras três meninas destaques em São Paulo, Gabrielly, Nathaly e Kelly, tem ainda a chance de dar voos mais altos. Elas viajam para Brasília entre 11 e 13 de agosto para disputar a seletiva para o Abu Dhabi Pro Jiu-Jitsu.