Aos 25 anos, Leonel Camasão é o candidato mais jovem na corrida à Prefeitura de Joinville. De São Paulo, mudou-se para Joinville na adolescência e se tornou presidente do PSOL na cidade, partido pelo qual concorre em chapa pura.
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Hoje, faz parte da diretoria do Sindicato dos Jornalistas de SC, tem atuação no Movimento Passe Livre, causas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais), de direitos humanos e no movimento estudantil.
Com propostas de esquerda, como municipalizar o transporte coletivo, uma de suas principais bandeiras, Leonel participa de sua segunda eleição. Em 2010, fez 1,6 mil votos como candidato a deputado federal, sem se eleger.
A Notícia – Qual é o maior gargalo de Joinville hoje, na sua visão?
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Leonel Camasão – Trânsito. A cidade cresceu sem planejamento. Mas não defendemos alargamento de vias, viadutos, elevados, grandes obras.
AN – Tem algo específico para a área de mobilidade?
Leonel – Obra para carros não adianta. Elevados e viadutos só resolvem problemas para os carros. Mobilidade urbana é algo maior.
AN – Então, qual é a saída?
Leonel – O foco do nosso plano é o transporte coletivo. Não tem solução se não passar por um transporte rápido, eficiente e acessível. E esse acessível quer dizer ter acesso universal, ou seja, tarifa zero, uma bandeira do PSOL.
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AN – Isso tem desdobramento na educação, na saúde, na geração de renda. Como tornar a passagem gratuita?
Leonel – Vamos criar a empresa municipal de transporte coletivo, que vai gerir o Fundo Municipal de Transporte, para onde irá o dinheiro das multas de trânsito, o ISS dos estacionamentos privados, do estacionamento rotativo. Vamos municipalizar o estacionamento rotativo e reverter os recursos para o fundo de transportes. Mecanizada, a Zona Azul pode operar com baixo custo. O dinheiro da venda de publicidade em ônibus e pontos de ônibus também vai para esse fundo. Assim como o IPVA, o IPTU progressivo do futuro…
AN – Tem ideia de quanto seria necessário para subsidiar, hoje, o transporte coletivo na cidade?
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Leonel – Não temos a noção exata desse número porque é escondido a sete chaves. Se perguntar para o prefeito, ele não sabe.
AN – Mas isso foi revelado em audiências públicas, na discussão da licitação do transporte…
Leonel – Na audiência pública teve um chute do Vladimir Constante (atual presidente do Ippuj), que considero desonesto intelectualmente, de que era preciso multiplicar o IPTU das pessoas cinco vezes para ter subsídio.
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AN – Quase todo recurso gerado com multas da Conurb, agora Ittran, vai para custeio próprio, não tem como tirar dinheiro de lá…
Leonel – Precisamos abrir para saber se é isso mesmo. Se tem um sistema de multa que arrecada R$ 13 milhões em um ano e isso serve só para custeio próprio ou está no vermelho, então não funciona, precisa ser revisto. Outra coisa é que multa é papel da Polícia Militar. Onde ela está que não participa das blitze? Mas quanto ao orçamento, com nossa inversão de prioridades, faremos uma arrecadação inicial, que é progressiva. Não vamos assumir no dia 1º de janeiro de 2013 e no dia 2 implantar a tarifa zero. É um processo complexo, que demora um pouco. Tem que criar a empresa pública, o fundo.
AN – Se não tiver aprovação da Câmara, vamos ter que pensar em aprovação disso por referendo ou plebiscito com a população… Iria interromper a atual licitação do transporte?
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Leonel – Sim, ela já foi meio que interrompida porque as empresas estão questionando um valor ridículo na Justiça, uma dívida de R$ 270 milhões da Prefeitura. Se você pega uma progressão da inflação de 1995 a 2012, ela foi de 180%, enquanto a tarifa aumentou 350%. Então, se alguém está devendo dinheiro para a Prefeitura são as empresas de ônibus e não o contrário. Vamos interromper a licitação, também, porque ela foi criada sobre um marco regulatório que não está mais em vigor. O Brasil já tem um novo marco regulatório, que dá poder para as prefeituras criarem novos mecanismos de arrecadação. Não estamos falando em criar uma nova taxa, mas a Prefeitura pode criar uma taxa de transporte, a política de mobilidade permite isso.
AN – Seria como uma taxa de luz?
Leonel – De lixo, como a taxa de lixo. Carnezinho todo mês, valor dividido todo mês. Mas isso é criar imposto.
Essa cobrança iria para todos os cidadãos?
Leonel – Exato, é o que a política nacional de mobilidade permite. O transporte coletivo é o único serviço social cujo custo não é dividido socialmente. Por exemplo: o SUS é gratuito, mas o usuário paga por meio de impostos. O transporte é privatizado, o custo é jogado apenas para o usuário, que já é uma pessoa pobre, que nem sempre pode ter carro. Essa é a lógica da progressividade dos impostos que defendemos: quem tem muito, paga muito imposto; quem tem menos, paga menos; quem não tem nada, não paga imposto.
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AN – Vamos considerar que o senhor se elegeu e estamos com a tarifa zero implantada. Como os ônibus vão circular em meio aos problemas de trânsito em Joinville? Não precisa de obra viária?
Leonel – A primeira coisa é corredor de ônibus. Do jeito que é feito hoje, acaba sendo só uma faixa pintada no asfalto. Não temos como fazer grandes corredores desapropriando imóveis, pelos custos, como seria ideal. O ideal é ter ônibus rebaixado, plataformas etc. Mas precisamos avançar. Obras viárias para carros são investimentos altíssimos para um benefício pequeno. Quanto mais espaço para carro, mais carro você tem nas ruas e logo vai ter congestionamento de novo. Sobre asfalto, é preciso recuperar, fazer manutenção.
AN – Mesmo com isso tudo, teria alguma obra viária que acha importante?
Leonel – Além dos corredores, implantar o sistema cicloviário, dar espaço para as bicicletas. Ele está no Plano Diretor de 1973, vai fazer 40 anos no ano que vem e não está implantado. Os binários também são bem-vindos, melhoram o trânsito sem grandes obras. Rótulas mais largas também ajudam, não precisa de elevado, que é caro, nem de semáforo, que amarra o trânsito.
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AN – Saindo de mobilidade, o senhor teria alguma meta para o saneamento, algum percentual?
Leonel – O saneamento é difícil de estabelecer percentual. Reconhecemos que o atual governo investiu mais do que os anteriores, mas está aquém do prometido. Nós investiríamos no processo, começaríamos da periferia para o Centro e não colocando esgoto nos bairros mais ricos.
AN – O Jardim Paraíso tem obras de saneamento desde 2006.
Leonel – Mas não foi concluída até agora. Não adianta.
AN – Acha que tem algum outro setor que aceitaria parcerias público-privadas (PPPs) como a da Expoville?
Leonel – Não. A PPP é muito parecida com o pedágio. Quem investe é o governo e quem fica com o retorno financeiro é uma empresa privada. É posição nossa de que certos serviços essenciais não podem ser privatizados. Ao contrário, têm que ser municipalizados.
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AN – O senhor e o PSOL fazem uma defesa ideológica contra privatizações, PPPs..
Leonel – Sim.
AN – Não teme que isso inche ainda mais a máquina pública, já engessada pelo alto nível de gastos com funcionalismo e com a estrutura?
Leonel – Máquina inflada ocorre por causa dos altos escalões da Prefeitura. Se inflar a máquina para ter mais médico no São José, ótimo. Se for para ter mais professores e terminar com o turno intermediário definitivamente e não com improvisos, ótimo. Tem que combater os cargos comissionados em excesso e os altos salários. Inclusive o salário do prefeito tem que baixar. O salário dos vereadores também, mas aí cabe à Câmara e não ao prefeito fazer.
AN – O PSOL fez alguma análise da estrutura de cargos da Prefeitura que permita dizer quantos cargos comissionados poderiam ser extintos?
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Leonel – Vamos falar de estrutura e não de cargos. Joinville tem 40 estruturas de primeiro escalão, entre secretarias, autarquias etc. Nosso objetivo é reduzir para 24.
AN – Por que 24?
Leonel – Foi o que identificamos como essencial. As secretarias regionais, por exemplo, não têm necessidade de existirem.
AN – Quem faria o trabalho delas?
Leonel – A Seinfra. A Seinfra é nossa maior secretaria, tem mais recursos do que a saúde. Nas regionais, temos cerca de 13 funcionários, um, dois cargos comissionados cada. Para uma secretaria de primeiro escalão, é muito cargo para pouca coisa que é feita. Patrolar rua, jogar cascalho, a Seinfra pode fazer.
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AN – Hoje, a população tira documentos nas regionais, isso não é importante?
Leonel – Esse serviço pode continuar, mas não precisa de uma secretaria com 13 cargos para isso. Nem pagar salário alto para um secretário que está lá só para ser candidato a vereador.
AN – Em relação às outras secretarias da Prefeitura, quais sumiriam?
Leonel – Faremos fusões. Da de Gestão de Pessoas com a de Administração, por exemplo. Fundiríamos a Promotur com o Desenvolvimento Econômico, como já vem sendo pensado.
AN – O empresariado é contra essa fusão. Isso não pesaria na decisão?
Leonel – Não. O turismo, como é hoje, é voltado ao desenvolvimento econômico, atrair feiras de negócios e eventos. Isso traz dinheiro para a cidade. Então, é uma coisa só que pode funcionar junto, com um secretário só, sem necessidade de duas estruturas cheias de cargos.
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AN – Falando de finanças, o senhor comentou o IPTU progressivo no início.
É uma bandeira?
Leonel – O Estatuto das Cidades já prevê isso, a outorga onerosa, IPTU progressivo. Hoje, temos 25 mil imóveis vazios. O IPTU progressivo é bem-vindo porque é um imposto contra a especulação imobiliária, de quem deixa o terreno lá parado para valorizar.
AN – Essa visão de taxar ricos, empresários, não acabaria com a vocação econômica de Joinville, ponto forte da cidade?
Leonel – Não podemos querer atrair empresas abrindo as pernas para elas, dando todas as concessões de impostos possíveis em troca de 500 empregos. Depois, sobre taxar ricos, precisamos equilibrar. Um pobre paga o mesmo imposto para tomar café que um empresário rico, não é justo.
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AN – Mas emprego gera ICMS, salários, movimenta dinheiro…
Leonel – Não concordo que a gente dê terrenos para empresa de fora vir explorar trabalho aqui, sem pagar impostos. Pode emprestar o terreno. Caso ela vá embora, o terreno volta para o município. Não concordo em doar patrimônio público para empresas privadas.
AN – Joinville está crescendo. Concorda com a expansão da área urbana?
Leonel – Não. A cidade tem que ficar como está. O Plano Diretor já diz isso. Sobre o planejamento urbano, vamos cancelar essa discussão atual e o Conselho da Cidade no formato que ele tem e instituir o Congresso da Cidade, uma experiência que ocorreu em Belém, no Pará, de 2000 a 2004. Lá, havia 40 cadeiras para cada bairro, mais três cadeiras para cada segmento: mulheres, afrodescendentes, indígenas, LGBT, evangélicos etc. Todos os segmentos, de todas as classes sociais e religiões, estavam lá. Os empresários também. O poder público tinha três cadeiras, mas quem decidia eram os participantes da sociedade. Vamos criar instrumentos para discussão democrática do orçamento da cidade.
AN – O que mais se pede hoje é melhoria na saúde. O senhor construiria um novo hospital, ampliaria os existentes?
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Leonel – Acho que uma ajuda é ampliar o Bethesda, mas tem que municipalizar. Hoje, há muita pressão da saúde privada. Há alguns anos, a relação era de 70% de leitos públicos para 30% de privados. Hoje, está em 50% para cada. Não é coincidência que estamos construindo em Joinville o maior hospital privado de olhos, quando a maior fila da saúde pública é a da oftalmologia.
AN – O senhor está dizendo que o sucateamento da saúde pública ocorre por interesses de hospitais privados?
Leonel – Não posso afirmar isso do governo municipal, mas do governo estadual acredito que sim. Na semana passada, fecharam metade dos leitos (de UTI) do Regional. Os hospitais estaduais estão ruins em todo o Estado. Ao mesmo tempo, se fala em implantar organizações sociais (OS). A OS dá benefício para determinados grupos econômicos, não garante continuidade e serviço bem prestado na saúde. É privatização da saúde.
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AN – É totalmente contra as OS?
Leonel – Sim. Temos que valorizar os servidores, o serviço público. Precisamos ampliar o Programa Saúde da Família. Se conseguirmos prevenir, não precisamos gastar tanto com tratamento. Saneamento reflete nisso. Até o tarifa zero reflete, porque, usando mais ônibus, a população não vai precisar tanto de carro ou moto e não vai sofrer tantos acidentes.
AN – Sem OS, com capacidade de investimento limitada, qual a receita para melhorar os hospitais públicos?
Leonel – Respeitando e valorizando os servidores da saúde, combatendo a corrupção no setor, que é grande.
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AN – Como avalia o governo do Estado?
Leonel – Ruim. Governo que fecha leitos e deixa doentes sem água quente no inverno é ruim. Quais as propostas do PSOL para a educação? Leonel – Eleição direta para diretores das escolas. SC é o único Estado em que isso não ocorre. Participam pais, alunos, professores e funcionários das escolas nessa eleição.
AN – Defende ampliação de escolas, turno integral?
Leonel – Sim, não é do dia para a noite, é gradativo. É preciso um plano municipal de educação que vai dizer quantas escolas precisamos por ano, quantas terão turno integral, em que regiões etc. Precisamos também de mais creches.
AN – Como avalia o governo Carlito?
Leonel – Ruim por ele ter deixado de significar uma esperança de mudança. O mais emblemático foi o aumento do ônibus. Ele prometeu na campanha de 2008 que iria baixar a tarifa. Aumentou.
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AN – O senhor tem ligação com a área cultural. Seu vice atua nela. Tem proposta para cultura, lazer, esporte?
Leonel – Tem que parar de dar calote no Simdec. Meu vice levantou que dos 50% de recursos que vão para o Fundo de Cultura, 30% deveriam ir para investimento em espaços culturais. Desde 2006, esses 30% são orçados e não executados. Não se sabe para onde vai o dinheiro. Com isso, teria cerca de R$ 1,5 milhão para a cultura, para investir em reformas, não deixando tetos caírem.
AN – O senhor tem participação em causas homossexuais, assuntos de diversidade, como a Parada Gay. Tem propostas para essa área?
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Leonel – Sim, vamos resgatar a Parada Gay e fortalecê-la. Mas a maior proposta é transformar a Secretaria de Assistência Social em uma Secretaria de Direitos Humanos. Hoje, a gente age depois de o direito humano ser violado.