Atrás das grades desde que a morte do pequeno Ítalo Fernandes Mattos passou a ser alvo de investigação, no último dia 10 de março, o padrastro do menino de um ano e sete meses, Marcelo Buss Bernardes, 41 anos, falou nesta segunda à imprensa, pela primeira vez, sobre os últimos momentos de vida da criança.
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Ítalo foi vítima de traumatismo craniano. Segundo Marcelo, o pequeno bateu a cabeça acidentalmente, quando brincava no computador. Mas a Polícia Civil de Joinville acusa o padrasto de homicídio doloso quando há intenção de matar, com base em outros ferimentos apontados na análise dos legistas – a suspeita é de agressão proposital.
Denunciado pelo Ministério Público, o técnico em informática Marcelo Buss Bernardes passou os últimos 24 dias no Presídio Regional de Joinville e pode ser levado a júri popular.
Com a autorização da Justiça, a reportagem de “A Notícia” esteve nesta segunda na unidade prisional para ouvir a versão de Marcelo. A entrevista, concedida em uma sala da administração, foi acompanhada pela advogada do acusado, Amália Reiter Kleinowski.
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Segundo o padrasto, que alega inocência, seu único arrependimento é não ter levado Ítalo ao hospital antes que a criança tivesse complicações mais graves.
AN – O que aconteceu na noite daquela sexta-feira?
Bernardes – Eu tinha dado janta para o pequeno. Deixei ele na sala brincando no computador e assistindo desenho. Fui para a cozinha terminar de arrumar a louça, dar comida para o meu casal de gatos. Foi quando escutei ele chorar. Voltei para a sala e ele estava caído na frente da mesa, onde fica o computador em que ele assistia os desenhos. Juntei ele e vi que tinha um galo na testa. Imediatamente, fiz o que eu e a mãe dele estávamos acostumados a fazer quando ele caía um tombo. Fui na geladeira, peguei um paninho, um gelo, fiz uma compressa de gelo. Levei ele para a minha cama, liguei um desenho para ele assistir. Acabou não fazendo galo…
AN – Isso aconteceu que horas?
Bernardes – Perto da meia-noite. Tinha passado a hora de ele dormir. Imaginei que ele estava com bastante sono, então deixei ele vendo desenho e fiz a compressa. Ele parou de chorar. Ficou só o hematoma. Voltei para a cozinha, para a sala, onde eu estava trabalhando nos computadores. Quando fui no quarto, ele já estava dormindo. Transportei ele para o quarto dele. Estava tudo bem. Deixei ele no quarto, dormindo, e fui fazer as minhas coisas. Depois fui dormir, aguardando a mãe dele voltar ao trabalho.
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AN – Por que você não pensou em levar o Ítalo para o hospital?
Bernardes – Porque ele já havia sofrido outras quedas.
AN – No mesmo dia?
Bernardes – Não. Na sexta-feira à tarde, ele caiu no banho. É a marca que ele tem nas costas, que estão tentando atribuir a mim como se fosse agressão. Ele nunca sofreu nenhum tipo de agressão. Tenho duas filhas. Minhas filhas podem falar por mim. Nunca agredi nenhuma criança, o que estão falando de mim é absurdo. Se forem lá na casa dá pra ver que a porta do boxe está quebrada. Ele tentou levantar da banheira, escorregou e caiu com as costas no boxe, no trilho da porta.
AN – Isso foi pouco antes do que aconteceu no computador?
Bernardes – Isso foi na sexta-feira à tarde. O acidente foi à noite, de sexta para sábado. Quando a mãe dele chegou, nós constatamos que o menino estava com problema para respirar. Bateu o desespero. Pedi que ela colocasse o menino no chão para eu fazer respiração boca-a-boca. Fiz respiração boca-a-boca e massagem cardíaca durante alguns minutos, enquanto ela corria atrás dos documentos dele para irmos ao hospital. Peguei o carro e fomos diretos para o P.A. Lá, ficamos quase uma hora do lado de fora chorando, desesperados. Uma das enfermeiras veio nos dizer que podíamos ficar tranquilos, que a criança estava respirando e, aparentemente, estava tudo bem. Falou que ela seria transferida ao Hospital Infantil porque eles não tinham aparelhagem adequada. Fomos direto para o Hospital Infantil. Chegando lá, estávamos fazendo a ficha dele na admissão quando ele passou pela gente. Acompanhei a entrada dele, realmente estava respirando. Depois disso, questão de dez ou 15 minutos depois, foi notificado o óbito.
AN – E como foi receber essa notícia?
Bernardes – Foi horrível, indescritível. Explicar como foi segurar a criança no colo, toda mole (Marcelo faz uma pausa e se mostra emocionado). Não tenho nem palavras. Sempre tratei ele com muito carinho. Conheço ele desde que nasceu.
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AN – A polícia afirma que houve pressa para enterrar o Ítalo. Isso aconteceu?
Bernardes – Não houve pressa. A gente fez tudo exatamente como foi orientado. Assim que ocorreu o óbito, nos disseram que precisávamos pegar um papel e ir até a capela do cemitério providenciar o enterro. Na capela, o funcionário nos explicou como era (o procedimento), o caixão. Claro que a mãe estava transtornada, queria ser mais objetiva. Nos disseram que, como a morte envolvia uma criança, precisávamos primeiro solicitar o laudo do IML para o corpo ser liberado. (Marcelo conta que ele e a mãe da criança ainda passaram no Hospital Regional e no IML, onde foram orientados a comparecer à Delegacia da Mulher). Lá (na delegacia), a Michely foi ouvida. Ligaram para o pai do Ítalo. Nesse momento, me deixaram isolado na cozinha. Chamaram o pai do Ítalo. Ele foi ouvido, mas não acompanhei. Logo em seguida, os policiais vieram me pegar para que a gente fosse na casa tirar fotos do local, onde eu explicasse como foi que aconteceu.
AN – Os procedimentos foram feitos normalmente?
Bernardes – Foi feito tudo o que deveria ser feito. Levei os policiais lá em casa na hora, tiraram fotos. Ouviram a minha versão, que não foi oficial, mas ouviram. Dali, fomos direto para a delegacia. Chegando na delegacia, a Michely estava prestando o depoimento dela e, logo em seguida, o delegado apareceu na porta e mandou me deixarem preso.
AN – A polícia diz que os ferimentos são incompatíveis com uma queda. Você agredia o Ítalo?
Bernardes – Nunca encostei a mão nele e em nenhuma outra criança.
AN – Como era sua relação com ele?
Bernardes – Muito boa. Cansamos de viajar juntos. Levei ele para uma pousada, junto com minha esposa, ano passado. Ele estava sempre envolvido nas atividades, junto. Uma criança muito tranquila. Eu não teria por que agredir uma criança de um ano e sete meses.
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AN – Você se arrepende de algo?
Bernardes – De não ter levado ele imediatamente para o hospital.
AN – Por que as pessoas devem acreditar na sua inocência?
Bernardes – Deveriam ver meu histórico. Tenho vários sobrinhos, sou pai de duas meninas. Minha filha pode falar por mim. No meu primeiro casamento, tive sete sobrinhos. Viviam brincando comingo. Minhas irmãs cansaram de deixar meus sobrinhos comigo para poder sair. Nunca houve nenhum incidente grave. Me considero uma criança grande, sempre fui crianção. Se verificarem o meu histórico, todos os que me conhecem no tempo em que eu estou em Joinville vão ver que o que estão falando de mim é absurdo. Se eu pudesse voltar atrás, pegar ele e correr para o hospital, eu teria feito. Se houve alguma falha, foi essa. (Marcelo volta a chorar).
AN – Você acredita na Justiça?
Bernardes – De jeito nenhum. A Justiça parte do princípio que todos são inocentes até que se prove o contrário. Se fosse assim, eu não estaria aqui no meio de estuprador, de assassino. Eu estou numa verdadeira escola do crime.
AN – Como tem sido a prisão?
Bernardes – Muito difícil. Sofri muita pressão por parte dos presos, que demoraram a acreditar na minha versão. Até que chegaram cartas de conhecidos, e da minha própria esposa, afirmando que eu não fiz nada. Todos acreditam em mim, sabem da minha inocência. Aqui não corro mais nenhum risco. Mas é um inferno.
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AN – O que você espera que aconteça daqui para frente?
Bernardes – Eu espero que seja provada a minha inocência. Mas é a minha palavra contra a da polícia, não existe testemunha. A polícia está dizendo o que quer. Acredito que vão me deixar apodrecer aqui dentro. Me colocaram numa escola do crime.